A MÃE DE BELLA (Final)

Me acordei horas depois, confusa, deitada em uma cama que não era minha. Abri os olhos com medo. Achei que estaria em algum hospital por causa do acidente. Mas não. Estava no quarto cor-de-rosa da casa de Bella.

– Como você está, querida?

Bella estava sentada aos pés da cama, olhando-me com uma expressão preocupada. Eu soltei um gritinho e cheguei a puxar as cobertas para cima como se quisesse me proteger. Ela sorriu:

– Acho que bebemos demais ontem. Foi culpa minha.

– Hein? – me endireitei na cama, tentando sentar. Minha cabeça doeu e senti um leve enjoo. Fiz uma careta que não passou despercebida de Bella. – O que aconteceu, afinal?

– Você não lembra?

Eu lembrava de algumas coisas, meio embaralhadas, é verdade. Como se fosse um sonho. A fuga. O acidente. A mãe de Bella. Não sabia bem ao certo o que havia acontecido.

– Lembro de nós na sala...

– Sim, isto mesmo – Bella sorriu, segurando com carinho a minha mão. – Abri uma garrafa de vinho para comemorarmos o fato de estarmos juntas. Mas... acho que nos passamos na bebida. Você um pouco mais que eu. Como se sente?

Olhei, confusa, para ela.

– Estou bem. Quer dizer, não sei. Um pouco enjoada.

– Também exagerei na bebida – confessou Bella, – mas deixei que você bebesse um pouco além da conta. Me sinto culpada, sabe?

– Bella, eu...

– Posso trazer um chazinho de boldo para você.

Eu sorri para ela. Será... será que tudo havia sido um sonho meu?

– Tive alguns pesadelos esta noite... Nossa, uma coisa bizarra.

– Efeito do álcool. Por que não me disse que não estava acostumada a beber? Que danada! Você me deu um susto grande quando desabou no meio da sala.

Fiquei horrorizada.

– Não acredito que fiz isto. Meu Deus, Bella! Que trabalhão eu dei para você!

– Esqueça. Amigas são para isto, não é mesmo? Você veio para cá me ajudar a passar este período triste da minha vida. Fico feliz de fazer o mesmo por você.

Olhei para meu braço. Havia um curativo ali. Uma imagem passou muito rápido pela minha mente, tão depressa que não pude segurá-la. Bella percebeu minha confusão.

– Você se machucou quando caiu no chão segurando uma faca afiada. Não se preocupe. Foi um corte feio, sangrou, mas está sob controle.

– Nossa, Bella... Fiz tudo errado.

– Não fale assim – ela deu um tapinha no meu joelho e me lançou um sorriso caloroso. – Fique quietinha aqui. Vou lá embaixo preparar um chá de boldo para nós duas.

Eu aquiesci e voltei a me deitar enquanto Bella ia até a cozinha fazer o chá. Fiquei deitada, abismada com o meu comportamento. Beber até cair não era meu estilo. Nunca havia feito aquilo na minha vida! Pensei em descer para ajudar, mas não me sentia com coragem em olhar para os quadros da mãe de Bella. Eles estavam por toda a parte.

Mas... mesmo assim, alguma coisa me incomodava. Certas lembranças, agora mais fortes, me deixavam desconfortável. A maioria estava nebulosa, porém a parte final daquele pesadelo ainda estava bem nítida. A mãe de Bella, feito uma predadora, rondando o carro acidentado na árvore. Cruzes. Havia sido um troço pavoroso. Real demais.

Meu Deus. Tinha sido muito real mesmo.

Levantei da cama, angustiada. Reparei que havia alguns hematomas nas minhas pernas, possivelmente resultado da queda que levei por ter bebido demais. Ou... seria da colisão na árvore?

Era melhor que eu não pensasse. Tudo aquilo era uma bizarrice. Embora Bella estivesse cheia de cuidados comigo, algo não se encaixava. Decidi que tomaria o chá de boldo e inventaria uma desculpa para partir. Eu não podia ficar nem mais um minuto naquela casa. Caminhei até a janela. Eu precisava respirar. A angústia era tanta que eu me sentia sufocada.

Empurrei as venezianas uma para cada lado. Senti os raios do sol esquentarem o meu rosto e até me senti melhor. Respirei fundo. Talvez eu precisasse mesmo era ficar ao ar livre e não presa dentro de uma casa fria em todos os sentidos.

O balanço rangia, indo de um lado para o outro, ao sabor da brisa. Eu adorava balanços. Desde pequena era meu brinquedo favorito. Seria uma ótima ideia se eu descesse e me divertisse um pouco antes de partir. Olhei para baixo. Não era o vento que movimentava o balanço.

Era a mãe de Bella.

Maria Caterinna
Enviado por Maria Caterinna em 24/04/2018
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