Uma nova chance.

“Não importa onde eu ande ele sempre me segue. Não sei mais o que fazer. Não quero mais essa perseguição sobre mim, quero que me deixe em paz neste momento. Pare com isso. Simplesmente pare, por favor!”

Um dia, chegando em casa, encontro essas palavras em um papel amaçado, jogado no meio da minha sala. Na mesma hora fiquei com muito medo, moro sozinha em um apartamento no terceiro andar. Confesso que no momento que li fiquei toda arrepiada. Senti que alguém me observava, mas não tinha ninguém, nada além deste papel amaçado. Coloquei o bilhete em cima da minha mesa, queria saber a sua origem, não é possível um bilhete amaçado estar na minha casa sem uma explicação concreta. Nessa noite não consegui dormir. Quando fechava os olhos a imagem do bilhete vinha em meus pensamentos. Coisas esquisitas permeavam a minha mente.

Na manhã seguinte, fui trabalhar como faço todos os dias. A única coisa diferente é que eu não consegui pregar os olhos em nenhum momento da madrugada. Mantive a televisão ligada a noite inteira e ali fiquei, cada vez que fechava os olhos me vinha aquela imagem do papel.

Trabalho em um colégio grande da minha cidade, lido com muitas pessoas e crianças todos os dias. São muitas energias diferentes em vários momentos do dia. Assim que cheguei, meu colega me entregou uma carta dizendo que havia chegado no início da manhã. Não tinha dormido direito, estava precisando de uma boa caneca de café e ainda havia uma carta sem remetente, só podia ser brincadeira de alguém. Tomei o meu café, na corrida, pois logo em seguida tinha que dar aula para uma turminha de segundo ano. Cheguei na sala e havia um aluno novo na turma. Fui apresentada para ele pela coordenadora do colégio. Ela me disse que ele era um menino muito simpático, mas novo na nossa cidade, que eu deveria ter muita calma ao lidar com ele, pois poderia se sentir deslocado. Eu, como uma boa professora, fiz o primeiro contato com o garoto perguntando o seu nome e quantos anos ele tinha, mesmo sabendo de todas essas respostas. Prontamente ele me respondeu:

- Você sabe bem o meu nome e minha idade, não queira se fazer de santa, pois isso você nunca será.

Assim que terminou sua fala, fiquei espantada com tal malcriação , sabendo que não seria nada fácil a minha ajuda daquela hora.

Dei a aula normalmente como faço todos os dias. Sempre me mostrando cuidadosa e atenciosa com o menino que acabara de chegar em minha sala. No fim da aula ele me olhou com um olhar que eu fiquei toda arrepiada e disse:

- Já leste a cartinha professora? Se eu fosse você daria uma lida.

- Como assim? Disse eu.

Como saberia da carta que eu havia recebido, sendo que eu não tinha falado com ninguém sobre ela?

- Apenas leia, queridinha! Finaliza o garoto.

Sem perder tempo nenhum, peguei meus materiais e sai correndo do colégio. Como um simples aluno poderia falar comigo daquele modo? E me colocar medo como estava fazendo?

Cheguei em casa eufórica e com medo. Tranquei toda a casa como se eu estivesse fugindo de um bandido ou de um sequestrador. Apenas queria ficar em um lugar sossegado, que poderia me trazer paz. Será mesmo que minha casa ainda era esse lugar? Tomei banho tranquila, pelo menos, era o que eu imaginava. Ficar calma e relaxada era só o que eu queria naquele momento. Quando estava secando os meus cabelos, escutei uma batida em minha porta. Já era tarde, mas quando se mora em um prédio movimentado, mil coisas podem acontecer em qualquer horário. Coloquei a toalha na cabeça e quando abri a porta havia um bilhete. Já fiquei imaginando mil coisas. Assustada, toda arrepiada. Olhei para os lados e não havia ninguém. Peguei o bilhete e nele dizia:

“Já disse para você parar de me seguir e parar de andar onde eu ando. Se continuar fazendo isso, algo muito ruim vai acontecer contigo. Não adianta se esconder.”

Fechei a porta correndo. Fui ligar para a minha irmã que mora próxima a mim. O celular dela estava desligado. Eu não podia ficar mais nenhum segundo ali. Peguei as coisas mais importantes naquele momento e sai correndo. Quando cheguei na porta do meu prédio dou de cara com o meu aluno novo. Como uma criança estava sozinha naquela hora da noite? Perguntei para ele se estava tudo bem e se morava por perto, ele me disse que estava apenas visitando uma pessoa muito querida que morava no prédio ao lado. Deixei ele sozinho ali, tamanha minha aflição, e fui para a casa da minha irmã.

Chegando lá, ela me liga dizendo que havia viajado com seu marido em uma viajem de negócios e que voltaria apenas na outra semana. Não acreditei que teria que voltar para minha casa, lugar de paz e ao mesmo tempo, medo. Voltei na mesma hora. O menino estava parado no mesmo lugar que eu o havia encontrado há duas horas atrás. Pelo menos, um rosto conhecido, estranho, mas conhecido. Perguntei para ele se queria subir comigo para conhecer minha casa. Eu estava morrendo de medo e não queria subir sozinha. Assim que chegamos no apartamento entramos e mostrei minha casa. Fiquei mais assustada com a presença dele, do que se eu estivesse sozinha. Ele não parava de me encarar e olhar um quadro que eu tinha ganho da minha avó, onde tinha a foto de uma mulher. O quadro era muito antigo e velho, apenas fiquei com ele porque minha avó tinha adoração pelo mesmo. Perguntei se estava tudo bem e ele não me respondia nem que sim e nem que não, apenas me encarava. Nisso, disse a ele que tínhamos que encontrar sua mãe, ela poderia estar preocupada procurando por ele, já que não tinha avisado ninguém que estaria comigo. O garoto me ignorou.

- Você já leu a carta? Disse ele olhando para a mulher do quadro.

Neste momento batidas na porta me deram um susto enorme, que quase urinei nas minhas calças. Abri a porta pensando que era a mãe do menino. Não. Era mais um bilhete:

“Já disse para me deixar em paz. Você não sabe do que eu sou capaz.”

- Chega! Por Favor me deixe em paz! Eu gritava, mas ninguém me escutava.

Não estava aguentando mais tudo isso.

Meu aluno me chamou dizendo que queria contar um segredo. Com a sua voz suave, me disse:

- Já leu a carta? Quem sabe você lê esta maldita carta!

Essa última palavra (carta) ele deu um grito ensurdecedor em meus ouvidos que fiquei com muito medo.

- Pare com isso! Falei chorando.

- Me deixe em paz, por favor!

Mais uma vez ele disse, só que desta vez gritando:

-Abra esta maldita carta! Abra essa maldita carta! Abra, abra, abra, abra, abra...

Fui em direção a minha bolsa, onde eu havia deixado ela de manhã, cedo. Peguei, com uma gana total abri o envelope e li:

“Como pode fazer isso comigo, sou a pessoa que mais te amou em toda a sua vida e olha o que você está fazendo comigo! Garanto que não sabe o que você fez não é? Olhe para o menino AGORA!”

Assim que olhei para ele veio um filme em minha mente. Tudo veio à tona: As brigas com minha família, com meu ex-marido, a perda do filho que eu estava esperando, a morte de meus pais. Meu corpo esticado com uma corda amarrada no teto da minha casa. Como pode, eu ter me enforcado, tirado a minha própria vida? Neste momento, o menino chegou, pegou a minha mão e me disse:

- Isso será a sua vida se não prestar atenção nas pequenas coisas que acontecem no seu dia. Preste atenção nas pessoas que estão próximas a você, só assim terá uma vida diferente desta. Ame mais as pessoas do que os seus objetos. Saiba que estaremos aqui olhando tudo que você faz, e cada coisa que fizer de errado será cobrada. Se não acredita em mim, olha mais uma vez para o seu rosto. -- Assim que olhei para o meu corpo pendurado, aquela cabeça se ergueu e surgiu um sorriso sombrio. Os olhos penetraram nos meus. Neste momento abriu um clarão na minha casa, algo estava prestes a acontecer, senti uma energia me puxando para esta luz e pude ouvir uma voz meiga e suave dizendo:

- Está vindo! Vamos pessoal, está vindo mais uma para este mundo, faça forças, mãe! Estou vendo já a cabeça dela, está quase, mais um pouco.

Revisado por: Jéssica Souza

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Francis Betim
Enviado por Francis Betim em 01/05/2018
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