Trama diabólica (Parte 1)

Novelinha de Carla Rejane Silva

Capítulo um

(*) trama diabólica

DEVAGAR, BEM LENTAMENTE, Sofia abriu os olhos. Abriu, todavia, sem entender exatamente onde estava. Suas vistas passearam pelo quarto de paredes brancas. Tentou se levantar. Não conseguiu. Sentiu uma dor forte e incômoda em sua cabeça. Isso fez com que, automaticamente, levasse a mão até o local onde a dor insistia apertar o cerco. Percebeu que estava com uma faixa enrolada na cabeça. Soltou um gemido baixinho... ao tempo em que tentou se lembrar porque estava ali. Em vão. Virou o rosto de lado. Algo chamou sua atenção. Sentado em uma cadeira reclinável, um homem de uns quarenta e poucos anos. Desconhecido. Podia, apesar disso, observar algumas linhas de expressão ao redor dos olhos do estrangeiro. O cidadão era moreno, cabelos negros com fios prateados nas têmporas. Como estava dormindo, não distinguia nitidamente a cor dos olhos. Porém, algo naquele homem a incomodou.

De pronto, de imediato, sentiu outra dor. Desta vez, não na cabeça. No coração. Esse incômodo fez com que lágrimas rolassem de seus olhos. Não percebeu que o estranho, de repente, voltara de sua sonolência e agora, estava ali, de pé, ao lado da sua cama olhando-a fixamente. Ao deparar com aqueles olhos frios e negros sentiu medo. Um pavor medonho, inexplicável. Quis falar, gritar, não conseguiu. Apenas de sua garganta saiu um balbucio fraco, quase perene:

- Onde estou? - O que aconteceu?

O homem se curvou um pouco, até ficar baseado à altura de seus olhos.

- Acalme-se, Sofia. Você esta no hospital. Trouxemos você ontem a noite. Você sofreu uma queda, bateu a cabeça em uma pedra ao cair do cavalo.

Sofia estava sem entender nada. Perplexa. Tentou saber mais.

- Acidente? Cavalo? Não me lembro. Só sei que minha cabeça dói.

Gemeu.

- É por causa da pancada – continuou o homem. Espere um segundo. Vou chamar o médico. Aliás, ele me pediu que o alertasse, assim que você acordasse. Espere um instante.

- Antes de ir, me responda. Quem é você?

- Como, quem sou eu? Não se lembra de mim? Sou Rafael, seu marido.

De imediato Sofia teve um misto de agonia, dor e raiva. Não sabia, contudo, explicar a razão de tudo aquilo.

Percebendo que Sofia não o reconhecia, Rafael saiu apressado em busca do médico que a havia atendido.

Três horas depois, após uma bateria de exames, o doutor Augusto Cortez começou a fazer perguntas à Sofia.

- Sofia, minha querida, vamos lá. Preciso que me ajude a conectar alguns fios soltos. Conte vagarosamente, sem se estressar, sem se alterar, qual a sua última lembrança.

Sofia ficou um tempo em silêncio, olhando para o teto. Por fim, voltou de seus pensamentos embaralhados.

- Não sei. Minha mente esta vazia, sem nada.

- Saberia me dizer que dia é hoje?

- Não me lembro...

- Tente. Faça um esforço.

- O que esta acontecendo? Porque tantas perguntas?

Quem é o senhor?

O médico deu um sorriso longo e calmo.

- Meu nome é Augusto Cortez. Sou médico. Estamos em dois mil e doze. Você tem trinta e quatro anos, seu nome é Sofia Melbourne Andaluzia. É casada com Dom Rafael Andaluzia.

- Rafael Andaluzia?

- Isso.

- Vocês tem um casal de filhos gêmeos de apenas dez anos. Seus nomes Leon e Helena .

Sofia tentou se mexer. Não conseguiu. Tentou se levantar. Em vão.

- Impossível doutor, como é mesmo sua graça?

- Augusto Cortez.

- Ok. Doutor Cortez. Posso lhe chamar assim, pois não?

- Claro, fique a vontade.

- Veja bem. Não sou casada não tenho filhos e não conheço nenhum dom Rafael.

Sofria acabou de dizer essas palavras, caiu em prantos.

Doutor Cortez fez sinal para que o marido Rafael se aproximasse. Rafael se aproximou e tentou acalmá-la segurando suas mãos.

Sofia, apesar desse gesto terno, o empurrou com ódio. Não sabia porquê mas, de imediato, não queria aquele homem que dizia ser seu marido por perto.

- Saia daqui.

Doutor Augusto chamou dom Rafael pedindo-lhe que o acompanhasse até uma sala contígua.

Sentados um de frente para o outro, separados apenas por uma mesinha de centro, o médico foi direto ao ponto, sem rodeios.

- Dom Rafael, me escute. Sinto muito o que vou dizer. Mas tenho que fazê-lo. Em face dos traumas sofridos por sua esposa, ela esta com amnésia. Ela pode ser temporária, como não. Só o tempo e alguns exames poderão nos confirmar um novo quadro. Até lá...

-Ela não se lembra dos filhos, não se recorda que somos casados, ou que vivemos na fazenda Andaluzia. Não se recorda de nada. Como pode algo acontecer assim?

O médico tentou explicar a situação de forma bem simples e descomplicada.

- No caso específico de sua esposa Sofia, ela sofreu uma pancada forte na cabeça ao cair do cavalo. Em alguns casos, a própria mente do paciente se recusa a lembrar...

-O que podemos fazer doutor Augusto?

-Vou dar-lhe alta. Leve-a para casa, deixe a descansar. Evite que tenha aborrecimentos e não a force a se lembrar de nada. Esperemos que, com o tempo, ela vá se recuperando.

- Assim espero. Obrigado doutor.

- Receitei um analgésico para dor de cabeça e um calmante para o caso dela ficar agitada e se lembrar de algo. Volto a repetir. Nada de forçar a sua esposa. Esse procedimento poderá ser prejudicial.

Quando Dom Rafael retornou ao quarto, Sofia estava pronta. Mesmo com olhar vazio, a jovem continuava linda, com seus cabelos soltos, vermelhos como fogo. Sua pele alva casava com o brilho bem acentuado dos olhos azuis. Num rompante inesperado, Sofia se retraiu. Sua aparente calma deu lugar a uma rispidez quando Dom Rafael tentou abraçá-la.

Dom Rafael se lembrou entrementes, de como aquela mulher destruiu seu coração. Dilacerou sua vida. Rasgou em pedaços sua alma. Visualizou, num piscar se olhos, a imagem de sua amada. Semanas atrás, recostada em seus braços. Lembrou que prometera a si mesmo não mais fraquejar diante dessa mulher, sua mulher, que lhe enganou por anos e anos a fio.

Pegou as coisas de Sofia, saiu na frente, e, com a voz autoritária mandou a ordem:

-Vamos.

Sofia apesar de fragilizada seguiu aquele homem de cabeça erguida, sem saber porque o fazia. No fundo de suas entranhas, sentia que assim como odiava o marido do qual não se lembrava, ele também a desprezava. “Menos mal” – pensou com seus botões. “Assim será melhor” – concluiu. E partiu atrás do moço, deixando, à retaguarda, o quarto onde estivera deitada sabia-se lá por quanto tempo.

Lá fora, no estacionamento do hospital, uma BMW preta com motorista, os aguardava.

-Bom dia, patroa. Espero que a senhora esteja bem.

-Sim - respondeu – Obrigada.

Não se lembrava quem era ou qual o nome daquele novo personagem. – “Motorista? – Meu Deus, o que está acontecendo comigo?”.

Nesse interregno de tempo, Dom Rafael a acomodou no banco traseiro, passou-lhe o cinto e se acomodou no carona. Deu as ordens ao motorista, para que desse partida. Até a residência, uma viagem silenciosa, cada um remoendo seus pensamentos mais emergentes.

Sem perceber, talvez levada pelo cansaço, Sofia inesperadamente pendeu a cabeça para o encosto do veículo e adormeceu.

Segue no próximo capítulo...

Carlasonhadora
Enviado por Carlasonhadora em 27/05/2018
Reeditado em 15/05/2020
Código do texto: T6348094
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