Trama diabólica (Parte 2)

"Trama diabólica"

(*) novelinha de Carla Rejane Silva

NO CAPÍTULO ANTERIOR, Sofia acordou no hospital. Num primeiro momento, não sabia onde estava. Ao olhar em redor, deu de cara com um desconhecido. Ele se disse seu marido. Em conversa com ele, soube que esse homem vinha a ser seu consorte, com quem tivera dois filhos. Sua mente rodopiou e ela se viu, frente a frente, com um total estranho. O incerto das coisas lhe acenava por uma senda obscura, uma via que ela, até então, jamais sonhara percorrer.

Capítulo dois.

DOM RAFAEL É DE UMA FAMÍLIA CONHECIDA, além de tradicional há décadas e décadas. E sendo, ainda, o tronco e o berço dos Andaluzia, um dos primevo cabeças de uma estirpe enorme. A bucólica e ao mesmo tempo paradisíaca cidadezinha, tem o nome coincidentemente de Andaluzia. Essa província de aspecto pastoril, fica situada na parte meridional da Espanha. Se limita a oeste, com Portugal e a norte, pela Estremadura, Castilha de La Mancha e Múrcia, e, ao sul, por Gilbratar, onde fica o Estreito do mesmo nome. É banhada pelos oceanos Atlântico e Mar Mediterrâneo, numa costa de quase mil quilômetros. A capital de Andaluzia é Sevilha onde se ergue, a sua sede, a junta de Andaluzia e o Tribunal Superior em Granada, cidade também próxima.

O pai de dom Rafael, dom Emanuel e a mãe, dona Carmelita são falecidos. Possuíam terras cobertas por carvão, chumbo e mármore, além de ricos vinhedos, a se perderem no horizonte. Com a morte dos pais, essas propriedades passaram a pertencer ao filho que continuava a tradição da família em fornecer além da exportação de carvão e chumbo, o melhor vinho para toda a região. Na entrada da fazenda podia se observar as videiras carregadas de uvas prontas para a colheita. Dom Rafael, todavia, não prestava muita atenção nessa raridade à sua frente. Seus pensamentos estavam voltados para os acontecimentos da noite anterior. Não parava de se lembrar da cena em que presenciara a sua mulher Sofia nos braços de outro homem.

No momento em que o carro parou, vindo de Jaén, depois de quase um dia de viagem, Rafael voltou à realidade. Desceu do carro e foi ajudar Sofia, que ainda dormia, alheia ao tempo que pairava deslumbrante. Chamou-a baixinho.

- Sofia, chegamos. Acorde. Sofia...

A moça abriu os olhos lentamente. Por um momento se viu entre os braços aconchegantes de dom Rafael. Ao descer do veículo, deparou com tamanha beleza ao ver a casa principal da fazenda, toda em estilo colonial antiga. Seus olhos se petrificaram. Não pode apreciar muito a paisagem, uma vez que ouviu gritos vindos do interior da residência.

- Mamãe chegou - Mamãe chegou Leon. Venha, mamãe chegou...

Ao olhar para aquela menina linda, de cabelos vermelhos, cópia perfeita de si mesma, sentiu uma ternura imensa. Apesar disso, não conseguia lembrar que aquela linda infante de nome Helena, uma mocinha de porte refinado fosse a sua filha. Em seguida, antes de colocar os pés na escada que levava à varanda, se viu abraçada por um garoto de olhar firme e penetrante, os cabelos negros, a pele morena. O pequeno a abraçou com força e vitalidade. Gritou eufórico:

- Bem vinda mamãe...

Segurando as mãos de seus filhos, Sofia seguiu para dentro da edificação enorme pintada de um azul infinito que fazia bem ao espírito. Tudo ali era impecável, muito limpo, onde nada estava fora do lugar. Os empregados, em número de seis, vieram recepciona-la. Sofia sorriu sem graça. Não se lembrava dos rostos ou dos nomes daquelas pessoas. Um deles, entretanto, fez, num breve momento, a jovem mulher se sentir envolta num carinho especial. Tratava-se da Maria a governanta, uma senhora beirando os quase sessenta anos. Estava na família Andaluzia há mais de quarenta janeiros. Essa mulher de olhar meigo, veio para a fazenda cuidar do herdeiro dos Andaluzia. E agora ajudava a cuidar dos filhos de dom Rafael.

Maria se aproximou e, abraçou Sofia a acompanhou até a sala de refeições. Só aguardavam a sua chegada, para que fosse servido o jantar. A mesa comprida se perdia entre um amontoado de cadeiras feitas em madeiras rústicas entalhadas. Numa rápida contagem Sofia viu pratos e talheres postos para sete pessoas. Sofia indagou baixinho à Maria:

-Estamos esperando alguém? - Sussurrou.

-A senhora não se lembra? Está com hóspedes faz hoje uma semana. Dona Camélia, a prima de dom Rafael, seu irmão Pedro e o pai, o senhor dom Álvaro Andaluzia.

Sofia sentiu um arrepio percorrer seu corpo, dos pés a cabeça, como um um animal acuado. Recuou um passo e, nesse gesto, desequilibrou caindo direto nos braços de dom Rafael que prontamente a amparou, sentando-a, em seu lugar de costume. Sofia fora acomodada praticamente contra a vontade. Seu desejo, em verdade, sair correndo em direção à casa de sua mãe. Queria estar com sua irmã e olvidar um pouco do pesadelo que a atormentava. Mas como? Quem era sua mãe? Onde ficava sua casa?

Uma voz rouca e melodiosa se fez ouvir na sala. Para Sofia parecia o chacoalhar de uma víbora peçonhenta prestes a atacar. Quando levantou os olhos, notou o olhar de desafio daquela mulher linda e encantadoramente megera e exuberante. A aparição repentina da beldade parecia, ou melhor, lembrava, um pouco, a estátua de uma deusa com seus cabelos e olhos negros e insondáveis. Usava um batom vermelho nos lábios carnudos. Olhava para dom Rafael como se dissesse, para si mesma: - “ele é meu!”.

O tio de dom Rafael, dom Álvaro Andaluzia, na consanguinidade da prole, vinha a ser irmão do pai de dom Rafael. Constituía-se, num senhor de porte elegante e esbelto. Sofia, sem saber por que, antipatizou de cara, de pronto, com dom Álvaro e sua filha. Pedro, o irmão de Camélia, estava atrasado. Ao adentrar o recinto, vestia-se com roupas e botas de montaria e trazia, na mão, um chicote. O rapaz se fazia alto, um pouco mais baixo que, dom Rafael. De resto, tudo igual. Mesmo porte atlético, a pele morena, os cabelos negros.

Do hall cumprimentou a todos e pediu desculpas pelo atraso involuntário. Aproximou-se de Sofia, tomou uma de suas mãos entre as suas e a levou até os lábios depositando um ósculo demorado.

-Oi Sofia... vejo que esta melhor depois do acidente de cavalo, apesar de estar um pouco pálida. Sofia vislumbrou uma satisfação em seu semblante. Seja bem vinda de volta...

Sofia sentiu asco por aquele homem de quem não se lembrava, contudo, de alguma forma um nojo tremendo lhe brotou das entranhas.

Captou o rubro de dom Rafael sobre sua face, ao tempo em que agaturrou um ódio mortal naquele olhar negro, e sem entender porque, sentiu pena de si mesma. Não entendia porque, no íntimo, nutria aquela dor magoadamente infame por dom Rafael, e no mesmo salto, por aquela família e porque – porque, como, dom Rafael seria seu marido se nem o conhecia? Enrodilhada nessa náusea e extrema dor de cabeça, pediu licença e se retirou da mesa sobre o sondar atento de todos. Amparada por Maria, caminhou para seu quarto. Notou, entrementes, que tudo rodava. Levou a mão sobre a cabeça. Perdeu os sentidos e nesse apagar ela, não distinguiu que os braços fortes de seu marido voltavam uma vez mais a lhe amparar. Posta na cama dormiu por horas. Não sabe quanto tempo esteve morfeando. Ao acordar, ainda meio sonolenta, aos goles poucos de uma sem noção das coisas começou a recordar. Sua memória, num baque desenfreado, ia e voltava, voltava e ia, a bel prazer do acaso.

Continua no próximo capítulo...

Carlasonhadora
Enviado por Carlasonhadora em 30/05/2018
Reeditado em 15/05/2020
Código do texto: T6350394
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