UMA GAROTA PERVERSA (Capítulo 2)

Rafaela só lembrou de Pâmela quando acordou às três horas da manhã. Depois que a trancara no laboratório, voltara para a aula de Educação Física como se nada tivesse acontecido. Depois pegou a mochila e resolveu matar aula para ir ao shopping. Havia esquecido por completo que trancara Pâmela dentro de um lugar escuro e frio. Sentada na cama, Rafaela ficou desesperada. Era para ser só um castigo. Não era sua intenção deixar Pâmela lá dentro para sempre.

Assustada, Rafaela levantou e foi até a cozinha. O corpo todo tremia. Será que Pâmela ainda não fora resgatada? Talvez se ela tivesse feito barulho bastante alguém a teria resgatado de lá. Mesmo assim a situação era terrível. O pior de tudo é que só teriam aula novamente na terça-feira por conta de um feriado. Pâmela não aguentaria ficar aquele tempo todo lá. Ela morreria ou de fome ou sede ou frio ou tudo junto.

Rafaela pegou o celular para ver se havia alguma notícia e, para seu total terror, o sumiço de Pâmela já estava nas mídias sociais. As mãos trêmulas de Rafaela conferiram cada notícia. Segundo as postagens, Pâmela sumira misteriosamente durante a aula de Educação Física. A mochila ficara em sala de aula e as câmeras de TV da escola estavam estragadas, não sendo possível registrar nada. Rafaela deitou na cama tentando pensar no que fazer. Não haveria aulas no sábado, portanto seria impossível entrar na escola. O coração batia enlouquecido. Quando os pais soubessem o que ela havia feito, ficariam furiosos. E haveria alguma penalidade, era certo. Muito provável que Rafaela fosse mandada para alguma instituição de menores. Meu Deus!!! Seu futuro seria afetado por aquela idiotice que fizera.

O sol raiou e encontrou Rafaela deitada na cama, pálida e com dor de cabeça. Um enjoo persistente deixava tudo muito pior. Foi então que ela teve uma ideia. Não era difícil. Só bastava disfarçar a voz, coisa que ela era craque.

Ela vestiu uma calça preta e um moletom também escuro com capuz. Precisou andar três quadras até encontrar um telefone público que funcionasse. Com os dedos trêmulos ligou para a polícia. Sua voz estava bem trêmula quando alguém do outro lado atendeu a ligação:

– A garota que está sumida, a tal da Pâmela.

– Pois não?

Rafaela percebeu que o policial já sabia a quem ela estava se referindo.

– Ela está presa dentro do laboratório de química desativado da escola em que estuda.

Mais do que imediatamente Rafaela desligou o telefone. As pernas estavam tão bambas que teve que sentar no cordão da calçada antes que pudesse voltar para casa. Mesmo assim, estava aliviada. A cretina da Pâmela seria encontrada rapidamente agora e ainda que sofresse alguma penalidade, o pai tinha dinheiro o bastante para livrar a sua única e problemática da confusão em que se metera.

Rafaela entrou sorrateiramente em casa e para sua sorte, os pais ainda estavam dormindo. Cansada, a noite insone a atingiu em cheio. Três minutos depois ela já havia desabado na cama, dormindo a sono solto, esquecida por algumas horas pelo menos, do que estava por vir.

*

O celular a despertou próximo ao meio dia. Rafaela despertou assustada, meio sem saber onde estava. Já havia dezenas de mensagens das amigas no WhatsApp e ela segurou o telefone já sabendo que Pâmela já havia contado tudo. Escutou a voz dos pais na sala. Eles deveriam estar apenas esperando que ela acordasse para confirmarem que sua filhinha tinha sido capaz daquela crueldade.

– Alô? – atendeu ela um pouco sonolenta.

– Rafa! Finalmente! Você está dormindo? – o tom de voz de Cecília era aflito.

– Sim. Quer dizer, não estou mais. Tudo bem? – Rafaela precisava disfarçar. Sentia o medo se instalando no peito.

– Você sabe o que aconteceu?

Ai, meu Deus.

– O quê?

– A Pâmela sumiu.

Sim. Sumiu. Mas já deveriam ter encontrado. Inclusive talvez a polícia já deveria estar do lado de fora do prédio pronta para levá-la para a delegacia.

– Sumiu. Eu sei. Onde ela estava?

Silêncio do outro lado. Cecília respirou fundo e continuou:

– Não se sabe.

Rafaela sentou tão rápido na cama que chegou a ficar tonta. Agarrou o celular com mais força e perguntou:

– Como não? Até agora nada?

“E aquela ligação que eu fiz?”

– Está tudo muito estranho. Alguém ligou para a polícia dizendo que ela estava dentro do laboratório de química desativado. Mas os agentes foram até lá e não encontraram ninguém!

– O quê? – o berro de Rafaela foi ouvido do lado de fora do quarto.

– Então vasculharam a escola inteira. Ninguém a encontrou. Estranhíssimo, amiga. Havia sangue no chão do laboratório e que provavelmente deve ser dela. Mas ninguém viu um fio de cabelo. A garota sumiu.

– Meu Deus do céu – Rafaela se jogou na cama e deixou o celular cair para o lado. Muito bem. Não tinha culpa de mais nada então. Se a cretina havia conseguido sair sozinha do laboratório e sumido por sua própria conta, Rafaela não tinha mais nada a ver com aquilo.

Ou tinha?

Maria Caterinna
Enviado por Maria Caterinna em 03/06/2018
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