AVERSO: CAPÍTULO 1 - VAZIO

CAPÍTULO I - VAZIO

Vazio, a única certeza que temos na vida é que em algum momento iremos nos preencher do mais completo e absoluto vazio, seja ao abandonar alguém, com algum sentimento, quando nos encontramos em alguma situação em que não vemos saída, entre outro, mas principalmente, no momento da nossa morte. Mas quando atingir o vazio, neste momento os sentimentos se tornarão algo completamente obsoletos, nada pode chegar até o seu verdadeiro eu, que a muito tempo já vive dentro de uma bolha fria, escura e depressiva.

Dito isto, preciso dizer que não existe esperança para mim, não existe nada que eu queira me apegar, eu já estou nesta bolha a muito tempo, eu já não me vejo com outra alternativa a não ser deixar que tudo isto tome conta de mim e me leve, para o fundo do abismo.

O mundo se tornou sem graça, a vida se tornou desprezível aos meus olhos, tudo que vejo é algo além do ódio e da inveja, algo que esté mais adiante de tudo isto, algo realmente…podre.

Meus pensamentos são cortados pelo barulho estridente de um trovão, fazendo-me retornar do ponto onde havia parado antes de começar a caminhar para dentro dos meus pensamentos obscuros.

Por três dias seguidos chove forte nesta cidade, assentando a minha realidade de viver recluso, pois ninguém sairia em uma chuva forte destas e mesmo que quisesse não deveria, seria perigoso, ninguém iria correr o risco de encarar uma provável chuva ácida ou que esteja contaminada por qualquer coisa radioativa. Eu, já não me importo com isto, eu não lembro nem a última vez que deixei este pequeno apartamento, não lembro de ver o sol, de estar em meio a uma multidão ou mesmo de conversar com alguém.

Analiso as gotas de chuvas escorregando-se pelo vidro da janela, algumas delas se cruzam como se estivessem dançando, ou traçando um destino de quando se encontrarem se tornarem uma gota ainda maior e chegar até a parte mais abaixo do vidro da janela. Este tipo de pensamento seria dito por um religioso de uma maneira a entender que tudo é feito por um criador, tudo fora planejado e nas pequenas coisas que olhamos vemos os sentidos da vida, eu no caso, só vejo gotas de água escorrendo pela janela de uma forma mais poética.

Meu olhar é desviado por uma notícia passando na televisão, alguém comentando sobre a vida de pessoas ricas, famosas e aparentemente felizes, algum tipo de reality show estúpido, que força sua direção e narrativa com o objetivo único de prender as pessoas a tela, como ratos pegos na ratoeira.

Não tenho uma vida assim e não anseio por uma assim, na verdade, minha vida poderia ser descrita de maneira bem simples, não existe muita coisa para se pensar sobre isto, não tenho mistérios, segredos, grandes reviravoltas e nem grandes conquistas. Eu só sou um cara simples, que trabalha em casa como escritor, nunca tendo tido uma obra publicada e por isto nunca tive êxito. Moro sozinho em um apartamento em São Paulo desde o ano de 2027, ano que meu pai morreu e me deixou com uma boa herança, que seria suficiente para organizar a vida até conseguir ter um fonte de renda sólida, minha mãe já faleceu quando eu era jovem, devido a exposição a radiação, um fim trágico. Não existe ninguém mais da minha família, ao menos eu acho, mas, ninguém nunca veio realmente a minha procura então independente se há ou não alguém a mais da minha família por ai, isto é irrelevante.

Meu dinheiro acabou semana passada, tudo que tenho além desta semana é apenas mais uma, depois serei despejado, jogado na rua para morrer e enterrado como indigente ou irão aproveitar meu corpo para algum fim médico legal ou ilegal, provavelmente ilegal.

Meu apartamento possui três cômodos o banheiro, a cozinha e o meu quarto onde passo praticamente a maior parte do meu dia, um quarto obviamente com quatro paredes, a primeira com a porta e bem ao lado o interruptor, na parede ao lado fica a janela e abaixo da janela a minha cama, do lado da cama encostado na parede oposta a da porta, esta meu computador e televisão e na parede ao lado o guarda roupas. Uma quarto bem simples, sem muitas coisas, apenas com vários livros embaixo da cama, em cima da escrivaninha onde fica o computador e alguns espalhados pelo chão.

Minha vida se assemelha a este quarto, um vazio com conhecimento espalhado pelos cantos mas que ninguém realmente irá ter interesse em investigar para saber o que realmente preenche este vazio.

Saah__
Enviado por Saah__ em 06/07/2018
Código do texto: T6382695
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