EM NOME DO PAI

Parado na sala de sua casa, boquiaberto e com olhos arregalados, Agenor tentava concatenar os pensamentos para tentar entender os últimos acontecimentos.

Era sexta-feira, final de tarde, após uma exaustiva e estressante semana de trabalho como segurança no complexo penitenciário Padre Cícero, Agenor Delgado, 45 anos, 1,85m de altura, pele branca, calvo com parcos cabelos negros desceu do ônibus e andava pelas ruas do bairro em direção à sua casa a fim do merecido descanso de fim de semana.

Cauteloso e diria até com certa mania de perseguição, resultado decorrente dos 20 anos de profissão como segurança penitenciário, Agenor andava pelas ruas a olhar para os lados como se pressentisse estar sendo observado, porém, ao chegar próximo a sua casa deparou-se com a porta de entrada entre aberta e a luz da sala acesa.

Estranhando o fato, Agenor tentava se lembrar de todas as suas ações pela manhã antes de sair de casa. Sim, ele fechara a porta. Havia virado a chave duas vezes na fechadura, assim como havia checado as luzes e o gás desligados, a porta dos fundos e as janelas trancadas.

Olhou no relógio e viu que pelo horário Jailton, seu primogênito de oito anos, ainda não havia voltado da escola, mesmo porque caso houvesse saído mais cedo teria ido para a casa da avó materna, que morava na rua de cima, já que ele não possuía a chave da casa.

Certo tremor foi tomando conta de Agenor. Sim havia alguém na casa. A essa constatação sentiu a boca seca, o coração bater descompassado, a respiração ofegante e até o ar a lhe faltar. Respirou fundo algumas vezes até se acalmar. Destemido, afinal já acostumado a lidar com criminosos de toda a espécie, tirou do coldre seu revólver calibre 38, que estava sempre carregado com seis balas, empurrou a porta devagar e entrou em casa pé ante pé com a arma em punho.

Na sala, com olhos desconfiados, Agenor ouve uma voz conhecida na cozinha, que o faz desmontar sua precisão corpórea. Apesar de um suspiro de alívio e relaxar dos ombros ele sente crescer certa irritação ao constatar que a voz que sai da cozinha e vem andando pelo corredor até adentrar a sala é de Adalgiza, sua ex-esposa, mãe de quatro dos seus cinco filhos. Jailton era filho de Santa, a primeira esposa que viera a falecer logo após o parto.

Ao contrário de Santa, Adalgiza era uma mulher voluntariosa e extravagante na maneira de vestir, pois estava sempre de unhas compridas e vermelhas, maquiada e salto alto, mesmo quando estava a lavar roupa ou a faxinar a casa.

Em quatro anos de casamento com Agenor fora capaz de conceber quatro filhos e assim provar ao marido e aos outros que era muito melhor que Santa. A disputa descabida com a defunta havia sido o principal motivo que resultou no fim do casamento com Agenor há cerca de um ano.

Com o semblante cansado e já sabendo o que o espera, Agenor coloca o revólver em cima da mesa e inicia uma aclamada discussão com Adalgiza devido aquela invasão em seu lar. Sem lhe dar ouvidos, a mulher dedo em riste na cara do ex-marido cobra-lhe pela terceira vez no ano outro aumento de pensão para os quatro filhos e ainda ameaça denunciá-lo a polícia lembrando ser este um dos poucos crimes que pode levar um cidadão preso imediatamente.

No calor da discussão e talvez por consequência do stress, cansaço e nervosismo, Agenor defere uma bofetada em Adalgiza, que pega de surpresa, afinal o ex-marido nunca havia levantado a mão para ela, se desequilibra do salto, cai no chão e bate a cabeça em um móvel. Transtornada, com os olhos injetados de ódio, Adalgiza se levanta e cambaleante parte para cima de seu agressor. É nesse momento que se ouve um estampido seco.

Parado na sala de sua casa, boquiaberto e com olhos arregalados, Agenor contempla um quadro de horror. Em meio a uma poça de sangue o corpo de Adalgiza jazia inerte enquanto Jailton, que surgira na casa sem que ninguém percebesse, está ao lado da mesa segurando nas mãos o revólver de seu pai.

Marcelo Monthesi
Enviado por Marcelo Monthesi em 04/04/2019
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