Justiça

Eles abriram a mala do carro e pelas pernas puxaram o homem que caiu com as costas e a cabeça no chão com brutalidade. O homem estava desfigurado, ensanguentado, braço esquerdo, tornozelo direito e três costelas quebradas, danos irreversíveis pra alguém que já havia passado dos 50.

- O que a gente faz, tenente? - um dos homens de coturno bem engraxado falou. As fraturas das costelas vieram de seus pés treinados.

- Acorda ele, mete água na cara desse nojento, ele vai dizer, ô se vai... - o tenente era tão novo que poderia se passar por um escoteiro, não lhe fossem o sobrenome e a patente altamente interligados.

Um outro homem de colete preto, boina e roupa cinza, jogou água no rosto inchado do homem agonizante. O homem acordou com um suspiro profundo, a água entrou em suas narinas e ele murmurou algumas palavras chorosas. “Eu... eu num seiu não... seiu não... pu favô...”, um dos homens cinzentos (eram cinco ao todo) pisou com os dois pés em uma das mãos do homem, os ossos estalaram, o homem de pele escura gritou... alto... mas o grito logo se abafou quando um outro se acocorou e lhe aplicou uma cotovelada na boca... “Porra Steve! Assim ele morre antes de entregar os zôto fila da puta”, o golpe acabou desmaiando o homem de novo e por sujar de sangue o antebraço do homem que estava apenas realizando seu trabalho, totalmente tranquilo e seguro por sentir-se amparado pela Lei e pela Ordem. São ossos do ofício. O ser no chão era um verme, no entender dele e de seus amigos cinzentos. O homem que ele agrediu, torturou de diversas formas, pacientemente, era dois anos mais velho que seu pai. Mas ele não estava de nenhuma forma preocupado com isso.

- Acorda ele Steve.

Água na cara. Dois deles sacodem o homem pelos braços, o que está quebrado provoca aversão no recruta. O homem acorda. Ele está chorando.

- Então o senhor num viu mesmo não? Tem certeza né? - o tenente também se agachou próximo ao homem e fitou os olhos intumescidos e roxos do moribundo com uma lanterna de luz fina, mas mesmo com o descampado iluminado apenas pelo luar e pelas lanternas usadas vez ou outra, ele já havia percebido que o homem usava uma aliança na mão esquerda, a mão pisada e esmagada.

- Por que o senhor não fala logo? Vou dar só mais uma chance.

- Deus... abençoe vocês... - o homem fala entre pausas. Ele era totalmente inocente...

- Ao senhor também. Que sua vida seja repleta de bênçãos! Vou liberá-lo agora, tá certo? Afinal, precisamos do sono dos justos...

E quatro tiros ecoaram na madrugada fria...

Edgar Lins
Enviado por Edgar Lins em 24/09/2019
Reeditado em 11/04/2020
Código do texto: T6752651
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