O Recorde

Em Uruana, pequena cidade do interior de Goiás, dois amigos conversavam quase bêbados. Eles cuidavam de um churrasco para vinte e sete moradores do bairro em que moravam. Estavam ali há mais de três horas e já tinham consumido uns de quinze quilos de carne e várias garrafas de cachaça.
- Por que todo esse empenho em preparar você mesmo o churrasco, Moacir?
- É porque quero me aposentando em grande estilo e também pretendo bater um recorde que vai entrar para a história.
- Conheço-o há mais de trinta anos e nunca o vi trabalhando! Pelo que sei você vive da herança que seu pai deixou.
- Nada disso, eu também trabalho.
- Vou fingir que acreditei. Ah, que recorde é esse?
- Jorjão, não seja tão curioso, amanhã se você acordar vai ficar sabendo.
- Que conversa é essa, compadre? Parece até que vou morrer. Você está me agourando?
- Com certeza você vai morrer, aliás, devo-lhe adiantar: – todo mundo aqui vai morrer entre hoje e amanhã.
- Do que você está falando?
Moacir pegou a garrafa de cachaça, encheu mais dois copos, o dele e o de Jorjão. Também distribuiu a bebida entre os presentes e os convidou para um brinde.
- Bebam. É para comemorar o recorde que pretendo bater.
Beberam quase que de uma só vez, e Jorjão, com a língua mais enrolada que carretel, pediu.
- Pode explicar melhor essa história de recorde? Eu não estou entendendo nada.
- Vou revelar só para você, mas não conte para mais ninguém esse meu segredo.
- Virgem santa homem, por que tanto mistério?
- Lembra que de vez em quando eu dou uma desaparecida da cidade?
- Lembro, mas o que isso tem a ver com esse tal recorde?
- Fique sabendo que eu sou um matador de aluguel.
- Você bebeu de mais e já não diz coisa com coisa.
Moacir, bêbedo que nem um gambá, não conseguiu manter em segredo sua intenção, deixando escapar seu plano.
- To bêbado não. A carne toda que estamos comendo está envenenada. Eu mesmo cuidei pessoalmente desse envenenamento. Aposento-me sim, mas levando comigo na viagem para o além, vinte e sete pessoas. É ou não é um recorde, para quem só matou doze de uma só vez.
- Olha compadre... Se é um recorde, eu não sei, mas gostei muito de saber disso agora... Finalmente vou descansar! – Jorjão estava tão bêbado que não imaginava o que estava acontecendo.
- Não vai ficar nem um pouco aborrecido comigo? - Perguntou Moacir.
- De maneira alguma. Como posso me aborrecer com alguém que está me tirando mais cedo desta maldita vida? Vamos brindar a isso.
Outro copo de cachaça.
Jorjão não perdeu tempo nem a calma, levantou o copo falando:
- Te vejo debaixo da marquise do inferno.
Moacir não teve tempo de brindar, seus amigos do bairro escutaram o que ele acabara de falar para Jorjão e o espancaram até a morte.
Fernando Antonio Pereira
Enviado por Fernando Antonio Pereira em 10/10/2019
Código do texto: T6765923
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