A MISTERIOSA VILA 38 - FUGA E MORTE

No caminho até as falésias, havia sinais de violência e tortura, o cheiro de sangue se mistura ao odor de cravo criando uma atmosfera tétrica. Os lobos da noite atacam na tentativa de obter alimento, mas não são páreo para Asgard e seus dois guerreiros. Ao chegarem a borda da falésia, percebem que algo animalesco havia acontecido ali. Imediatamente Asgard ordenou que um dos guerreiros fosse até lá embaixo verificar. Os rastros sangrentos impressos na areia molhada, confirmaram o temor dele, o guerreiro lhe traz os restos de uma mão humana, com os nervos pendurados a pele e grudados aos ossos como tiras de macarrão ainda segurando firmemente o sabre. Asgard sentiu um arrepio e uma dor no estômago, tinha a certeza que conhecia aquele sabre. As bestas infantis já haviam agido, em intervalos curtos gargalhadas e uivos bestiais emanavam do oceano e das montanhas encobertas pelos pinheiros congelados. A profecia está se consolidando, o maligno capitão aguarda seu prêmio maior, seus herdeiros.

Sob o manto da escuridão, Asgard atravessa a adormecida vila, suas portas e janelas fechadas ocultam seus habitantes, exceto pelos reflexos da luz pálida dos candeeiros que escapam por entre as frestas da madeira, não há sinal de alma viva. Ao longe as gargalhadas infantis e animalescas continuam a ecoar pelo vale. A criatura alada sobrevoa as falésias na busca de suas presas, seu voo é silencioso e sombrio. De repente ela toma o rumo do oceano em direção a Kalle, eles a seguem. Quando a noite mostra sinais de abandono, eles se aproximam das escarpas das montanhas. Asgard não ancorou nas docas, seguiu direto até os paredões, subiu pelas encostas e chegou ao desfiladeiro, depois da exaustiva escalada entrou nos domínios da fortaleza.

Ao passar pelo cemitério ouviu novamente a gargalhada infantil sob a gigantesca árvore negra plantada bem no centro da necrópole. Suas raízes espalham-se por entre as tumbas, se alimentam dos cadáveres e os transformam em folhas e galhos.

Um gemido agonizou emitido do seu tronco, o fedor da morte pendia das folhas os galhos retorcidos. Olhos famintos de uma forma estranha engatinhando entre os mausoléus observam Asgard. Ele empunha o sabre e se aproxima sorrateiramente, mas em sua passada pisa em algo, pensou que fosse uma raiz, mas é um corpo ainda a dar seus últimos suspiros. Asgard agacha-se sobre ele, suas vísceras estão expostas, sua mão direita fora arrancada, seu rosto tem uma das faces dilacerada mostrando o interior da boca. O cheiro ocre do sangue espalha-se em forma de chuva, os pingos viscosos salpicam sobre eles, há pedaços pendurados nos galhos da maldita árvore dos mortos. Num esforço sobre-humano, ele abre os olhos e fita Asgard.

- Amigo, me perdoe, duvidei das suas palavras - Balbucia.

- Tem o meu perdão, tentei, mas nada posso fazer - completa Asgard.

Quase sem fôlego reúne todas as forças e diz pausadamente.

- Prometa que encontrara Isabelle, ela foi levada para as montanhas de Kikivo. - E tenha muito cuidado, a outra criança está aqui - Complementa.

- Encontrarei Isabelle se é o que deseja - Promete Asgard. - E a outra criança? - Pergunta.

- Está com ela - Fala já quase sem voz.

Em seguida cerra os olhos, suspira profundamente e para inerte.

Aros está morto.

Como soldado e guerreiro, Asgard já tinha visto coisas medonhas, presenciado crueldades e depravações da guerra, mas os caprichos daquelas bestas passavam da doença e do acaso.