Golias vence Davi

Marcos não estava feliz. Pensando bem, talvez nem soubesse se já havia sido. De repente, num tempo onde ele não precisasse enfrentar a realidade. No momento, os tempos eram outros. E eram difíceis.

Reclamar não resolveria. Se resolvesse, já estaria tudo bem. Antonia sempre tinha algo pra questionar e se não fosse por Pedro Henrique certamente Marcos já teria eliminado um de seus problemas com algumas assinaturas e um leve mal-estar entre as partes, a história de que casamento e felicidade eram sinônimos se mostrava a cada dia mais distante, e bem mais próxima de alguma lenda urbana. A prisão do homem às vezes é seu medo da solidão. E alguns documentos.

Nos últimos tempos, Marcos vinha percebendo o quanto estava emagrecendo. Tinha 27 anos nas costas, 1,86m, 65 kg, estava pesando certamente muito abaixo do ideal para se manter em bom rendimento nas atividades diárias, se precisasse usar seu vigor físico para realizar qualquer tarefa era como se estivessem o torturando, logo cansava e o chiado antigo no peito aparecia e ele solicitava auxílio, pneumonia e bronquite na adolescência deixaram sequelas.

Por isso, seu encarregado direto já o havia chamado à atenção “Porra Marcão, porra bicho, não dá pra descarregar e empilhar isso só não? Desse jeito você me fode, eu preciso de pró-atividade, pró-atividade, esse é o segredo, e um cara novo como você já morto, pelo amor de Deus, francamente”, tudo de Barbosa era questão de pró-atividade e Marcos sabia que isso bem era verdade pra ele quando se tratava de bajulação. Quando os diretores e investidores adentravam no hipermercado Lindo Dia, que funcionava ao lado da distribuidora Dia Belo, onde Marcos era peão, Barbosa só faltava enfartar ou botar um ovo, se tivesse um rabo, com certeza estaria o abanando, mas nem assim fugia das reclamações infundadas dos que na verdade menos entendiam sobre os processos de mutação entre produtos e lucros.

As frases que soavam aos ouvidos de Barbosa como se fossem outro idioma além de servir para humilhá-lo e o pressionar contra o fato de que na idade dele seria muito difícil chefiar outra equipe diante da contínua busca pelo aperfeiçoamento profissional dos “jovens”, diziam que somente a ele caberia o tempo de sua estada na visionária empresa. Barbosa também tinha uma obsoleta graduação. Era só continuar fazendo seu trabalho nos conformes. Redução quase que total de custos. A La Maquiavel. Sem fuder tudo. Em resumo: depois de cada visita, o velho ranzinza parecia ter sido marcado à ferro em brasa pelo próprio Satã, descontava em que pudesse o que seus ouvidos servis receberam em pancadas diretas. Todos pagavam.

Marcos às vezes sentia pena do velho, mas geralmente era vontade de espanca-lo com soco inglês e taco de beisebol o que desejava. Mas pensando bem, do jeito que estava magro seria bem provável que o velho Barbosa trucidasse ele no primeiro round. Barbosa trabalhou durante anos como estivador no cais do porto, a coxa de Marcos era mais fina que o antebraço do capataz. Barbosa tinha muitas outras histórias que era melhor mesmo que Marcos não soubesse.

Antes de trabalhar como conferente, Marcos tinha tentado outros empregos condizentes à sua escolaridade. Porteiro, ajudante de pedreiro, panfletista, frentista, e até como segurança em eventos particulares, o que lhe rendeu horas de sarro por parte de seus companheiros de serviço que diziam que nunca tinham visto um cabo de vassoura vestindo terno preto. Mas seu sogro, Seu Alfredo, conhecia alguém do RH da Dia Belo, e acabou dando uma força quando percebeu que a filha estaria condenada à inanição ou à volta pra casa. E ainda mais tinha um inocente, ajudaria por Pedrinho, seu neto. Marcos começou como ajudante de serviços gerais e 3 meses depois, veio a vaga como conferente, e com ela, Barbosa.

Assim que foi contratado, Marcos foi colocado a par da rotina e da maneira como Barbosa vinha conduzindo a equipe há 5 anos “Cara, esse velho é um filho da puta, bota pra quebrar na galera, já fez muito pai de família chorar aqui irmão, o bicho é ruim”, mas ele pouco se importou já que não era nenhuma novidade que os chefes atuais (que oscilavam vagamente entre a possibilidade de serem líderes) buscassem extrair de seus subordinados até a última gota de sua mais valia, de uma forma ou de qualquer outra, já que havia um compromisso acordado entre as partes que chamam salário.

Sempre eram os compromissos. Pedro Henrique era seu compromisso. Antonia também. Ela não estava trabalhando porque precisava ficar com o garoto que com 3 anos ainda mamava, mas isso a tornava cada vez mais irritadiça, já que aos 23 ela ainda queria poder ficar até mais tarde com as amigas em alguma balada, ou quem sabe (isso ela vinha pensando com frequência) se não tivesse feito a merda de se apaixonar por um “lascado” e de engravidar antes de perceber o passo em falso, as coisas pra ela fossem outras. Já tinha perdido 5 anos de sua vida.

Marcos não imaginava que nos planos dela faltava apenas que Pedro Henrique ficasse grandinho a ponto de ficar na creche o dia todo, quando isso acontecesse, Marcos que fosse sobreviver com quem quisesse, pra ela já havia dado o suficiente, chega, o que ela queria era viver. Viver bem. Acostumada a vida inteira com os mimos dos pais que também foram forçados pela realidade ao trabalho braçal, a filha única havia crescido sem a real noção de valores, por nunca ter questionado de onde vinham os presentes e todas as vontades realizadas, Antonia agora via, baseada nos conselhos de “boas amigas”, que ao lado de Marcos o que lhe aguardava eram filhos e mais filhos, e bem provavelmente uma pensão de fome para um corpo flácido e indesejável. Ela podia arrumar coisa melhor. E bem, ninguém vive de amor, e se não houver então...

Porém Marcos aprendeu desde sempre com o pai a exercer o papel de um homem da mesma maneira que o pai aprendeu com o avô que aprendeu com seu bisavô: “se fizer menino, se vire”. Então Marcos se submeteu aos métodos revolucionários de Barbosa em sua condução rígida e desmedida. Deus havia de o ajudar. Horas extras que nunca eram reembolsadas, feriados que jamais eram compensados com dias de descanso, descontos no salário por atrasos mínimos e constantes assédios morais implícitos amparados pela necessidade diária pelo pão das Escrituras. Sequer conversas com intuito de descontração eram permitidas em sua presença ou não durante o expediente, que carregava o ar de uma fábrica bélica atuando durante o ápice de um conflito sanguinário.

O clima era sempre tenso quando o velho aparecia pelo estoque com sua velha prancheta na mão, no início do dia era comum encontrar Barbosa com um copo de café no pátio fumando uma sequência de cinco ou seis cigarros encarrilhados antes do expediente. Depois de iniciada a jornada, certamente dois maços seriam fumados a medida que seu estresse fosse aumentando. E ele sempre aumentava. Muito.

Certa vez, durante o almoço no refeitório desorganizado da Dia Belo, Marcos conversava com Carlos, que trabalhava descarregando os caminhões e geralmente era escalado para os serviços mais pesados, Carlos tinha boa constituição física, sempre fazia questão de ajudar o “Espigão” (assim ele chamava Marcos) porém sua ficha de antecedentes trazia o estigma daqueles que nunca deixarão de ser vistos como últimas opções para os recrutadores, num passado recente Carlos havia entrado de gaiato num assalto porque havia 4 meses que não arrumava nada, a filha de 1 ano estava doente e a mulher não trabalhava e por aí já se deduz como a cabeça de um homem sem família próximo e sem a quem recorrer pode ficar. O plano era bastante simples: era só dirigir o carro enquanto o primo e outros dois faziam o trabalho propriamente dito, um dos integrantes trabalhou na loja de roupas e artigos de surf, as peças seriam facilmente revendidas e o dinheiro surgiria como se brotasse do nada. Estavam todos desempregados.

Mas ninguém contava com um circuito de câmeras secreto instalado sem o conhecimento de nenhum dos funcionários. Durante a ação, ninguém previu 3 viaturas aguardando pacientemente a saída dos bem esquematizados ladrões, e pra dar um tom mais verídico à toda a situação, o primo de Carlos foi executado depois de rendido ao lado de uma das viaturas para que nos documentos, os policias fossem vistos como verdadeiros heróis que haviam se arriscado pelo bem da sociedade. Os bandidos haviam reagido e a polícia revidou à altura, como sempre. Só que nenhum deles estava armado.

Carlos conseguiu fugir mas foi preso pouco depois e por pouco se livrou da pena por formação de quadrilha, um dos integrantes depois de algumas conversas nas sala de interrogatório havia o delatado, porém faltaram provas. A família dele tirou de onde não tinha pra pagar o justo advogado. Ainda assim Carlos recebia menos e trabalhava mais que a maioria, ouvia de Barbosa coisas que por amar a filha engolia com olhos marejados de ódio.

Durante o almoço, aproveitando um dos poucos momentos de paz, duas horas de trégua até voltarem à imolação, Carlos contava algumas piadas enquanto o garfo de plástico revolvia a comida fria que vinha das mãos do chefe André, era comum mascar algumas pedras no feijão ou tirar algum cabelo do macarrão, e sob os risos dos companheiros que querendo ou não formavam diariamente uma família ainda que desunida, ele brincou “ Brother, a comida do presídio é melhor que essa do André, tô pensando seriamente em me hospedar lá por alguns anos pra vê se eu engordo um pouco”, e os companheiros riram, achavam a comida péssima também, e o desconto salarial por ela era absurdo, não se podia abdicar de tal alimentação. Só que no exato momento em que Carlos, que já trabalhava há 4 anos fazendo a mesma coisa sem a mínima chance de qualquer mudança, falou mais uma de suas frases sarcásticas e tão bem aceitas pelo grupo, Barbosa passava por perto e ouviu tudo.

Ao perceberem que ele vinha na direção da mesa onde o grupo almoçava, as expressões caíram como se pressentissem o que aconteceria. “Como foi que você disse?”, Barbosa falou olhando para Carlos, “A gente tá só brincando aqui Seu Barbosa, foi só um brincadeira por causa da comida”, Carlos já passava dos trinta mas enquanto respondia era como se fosse um garoto de dez dando satisfações a um professor chato, “Olhe, escute bem... é Carlos né? Seu nome? Escute bem Carlos: ninguém tá aqui pra brincar entendeu? Não é de agora que eu percebo que você é muito brincalhão, gosta de fazer os outros rir né? Então, arrume suas coisas e vá investir na sua careira de comediante, bora, vamos, tá esperando o quê?”, Barbosa ficou parado olhando para Carlos, ele tinha um cigarro não aceso entre os dedos, o silêncio no refeitório era geral. Só o trânsito lá fora era ouvido. “O senhor tá me demitindo? É isso?”, Carlos olhou ao redor para todos e o que viu foi rostos cansados que por receio continuavam a comer da comida feita de qualquer jeito. “Você não é burro não é? Acha que eu tô falando grego? Vou repetir de outra forma então: você está demitido. Saia imediatamente e não me volte aqui depois de ter passado pelo RH. Boa sorte na sua nova carreira, não espere receber muito de seu tempo de serviço depois do que eu alegar como motivo pra sua demissão”, Barbosa falou baixo perto dele, e se retirou, onde de longe foi possível vê-lo acender o cigarro e mexer ao celular como se nada tivesse acontecido.

Dias depois souberam que de alguma forma, Carlos recebera a justa causa, e sem o conhecimento para recorrer, de seus 4 anos de humilhações, o que lhe sobrou além das dores pelo corpo não supriu a necessidade de alguns meses. E como o destino é irônico em sua natureza, Carlos foi preso outra vez, dessa vez por agredir o juiz trabalhista em uma das audiências. Pobre Carlos. Pobre família do Carlos. Barbosa seguia em seu auge.

Os meses se passaram e ninguém se esquecia do acontecido com Carlos, a opinião à respeito de Barbosa por parte de todos era unânime: Velho filho da puta. Ele tinha autonomia para fazer o que bem entendesse, e sabia usa-la muito bem. Marcos enfrentava em casa os problemas típicos de casais inexperientes, contas que nuca fechavam, desejos que não eram atendidos, expectativas que se chocavam contra o muro da realidade.

Antonia certa vez o disse que Pedro Henrique queria ir ao parque de diversões que havia chegado próximo à casa deles e Marcos disse que se eles fossem provavelmente não jantariam nas próximas semanas e isso a irritou de tal forma que ela arrumou as coisas e levou o filho para a casa dos pais, fazendo com que Marcos, sempre tão controlado, perdesse a cabeça e a chamasse de preguiçosa e patricinha, disse que ela não servia nem pra lavar as cuecas dele, e Antonia guardou aquelas palavras para usa-las no momento certo.

Depois de algumas conversas com os sogros, Marcos e Antonia se acertaram, e Seu Alfredo sugeriu que o genro buscasse encontrar algo melhor pra ele e pra família, o que para Marcos era algo que ele desconhecia, viver à margem sempre foi o seu normal. “Se inscreva em algum curso filho, você sempre levou jeito com computadores, pode aprender a consertar e quem sabe sair daquele inferno”, Seu Alfredo era como um pai pra ele. Por respeito ao velho, resolveu dar uma chance ao casamento que se desgastava a cada hora como um cubo de gelo sob o sol da manhã.

Em meados de Dezembro, de alguma forma Marcos começava a alimentar algum tipo de possível esperança secreta, o fim do ano sempre trazia um tipo de nostalgia em que ele se lembrava da época de infância, quando seus planos eram tão palpáveis quanto o maço de contas a serem pagas. Ele começava a ver saídas para sua situação. Já estava prestes a completar um ano sob o comando de Barbosa e era como se estivesse preso há uma década na masmorra mais funda e fria do castelo. Ele não parava de emagrecer e só vivia gripado, Antonia havia conseguido alguns bicos como recepcionista em eventos e havia o deixado em paz enquanto seu dinheiro lhe trouxe alguns vestidos e perfumes. Pedro Henrique vinha ficando mais tempo na casa dos avós. Talvez esses fossem os sinais de algo inevitável, sua família já não lhe parecia sua família, a saudade dos pais que moravam em outro Estado estava sempre presente, mas ele jamais voltaria, não, seria triste para o pai vê-lo voltando parecendo um saco vazio. Separação.

Marcos precisava mudar. Precisava ter algum tipo de esperança, sim, era fim de ano, época de festa. Dário, um dos funcionários que trabalhava também como conferente, convidou Marcos para a festa anual da empresa, que acontecia todos os anos em uma chácara alugada, lá tinha piscina, cerveja, muita carne, e o principal: todos ignorariam Barbosa.

Era um dos poucos momentos em que a autoridade suprema do grande chefe não tinha validade alguma, Barbosa ia à todas as confraternizações e fazia questão de se sentar sozinho numa mesa distante, garrafa de uísque e maços de cigarro à disposição, apenas observando. Os outros fingiam que ele nem existia, era como um tipo de vitória pessoal. “Vamo velho, o que importa é a gente, vamo comer e beber de graça na conta desses otários exploradores, leva tua mulher que eu vou levar a minha, pense direitinho que eu preciso fazer a lista com quem vai”, e Marcos pensou um pouco, até aceitar.

No dia da confraternização, Marcos chegou com Antonia logo cedo, por volta das 10 da manhã, pois sua ideia era sair cedo também, temia não conter seus ânimos se de repente a bebida lhe subisse à cabeça, a repulsa que nutria por Barbosa ao mesmo tempo em que o pedia para evitar certas situações, o encorajava a buscar a mudança que almejava.

Foi recebido por Dário e pelos outros de maneira calorosa, as esposas também convidaram Antonia para a mesa das esposas e ela sorridente logo se entrosou. Marcos por alguns instantes esqueceu a pilha de preocupações que só crescia e se entregou às conversas variadas, Barbosa ainda não havia chegado e todos começavam a acreditar que pela primeira vez, o velho desgraçado não compareceria. Seria ótimo. Bastou apenas sonhar com tal possibilidade para logo depois verem o carro prateado com vidros fumê entrando pela porteira da chácara, trazendo em seu interior o carrasco dos novos tempos. A alegria que a maioria certamente sentia deu uma oscilada, mas a bebida ajudaria a manter o foco. Barbosa saudou a todos por obrigação e logo em seguida se retirou para a velha mesa distante de todos, celular numa mão e um cigarro na outra, era como se para ele nada estivesse acontecendo ali.

A festa havia começado às 9 da manhã e já se estendia por sete horas, era como se Barbosa não existisse, todos bebiam e se abraçavam, dançavam, caiam, se jogavam na piscina e até mesmo como que para mostrarem a superioridade deles naquele momento, convidaram o velho fascista pra participar com eles, recebendo um “Não, obrigado”, dado com olhos fixos no celular. “Eu quero mais é que esse velho se foda, esse arrombado!”, disse Gonçalo, o empilhador, “ Que tal a gente jogar esse otário na água?”, sugeriu Afonso, o estoquista, “Deixe esse viado na dele, vamo comemorar na da gente, um dia as coisas voltam, sempre voltam meus irmãos, deixe ele achar que tá tudo bem”, interveio Dário, um dos mais sensatos e organizador da festa. E assim eles seguiram. A festa não tinha hora pra acabar, duraria enquanto houvesse estoque. Um dia em trezentos e sessenta e cinco para extravasar como bem entendessem.

Por volta das 19 hs, alguns já estavam deitados pela grama da chácara, alguns chorando enquanto contavam seus problemas para outros cheios de problemas também, outros dançando com se o mundo fosse acabar assim que parassem, a festa para Marcos já se encaminhava para o fim, ele ainda precisaria passar na casa dos sogros pra pegar Pedro Henrique. “Ôpa, com licença...alguém viu minha mulé? Tenho que ir pessoal”, Marcos já começava a enrolar um pouco a língua, não tinha o hábito de beber, havia extrapolado seus curtos limites de tolerância alcoólica, “Vi não Marcão, será que ela num foi pro banheiro não?”, alguém falou e Marcos se dirigiu rumo aos sanitários imundos da chácara, cambaleando um pouco, ao mesmo tempo em que sentia no corpo um bem estar que há tempos não sentia, querendo ou não, ter ido à confraternização havia o ajudado a pensar no que faria dali em diante, pra ele, o dia entre amigos lá no fundo havia sido um tipo de despedida, ele arriscaria mudar e sentia que era o momento certo, não conseguia se imaginar no ano seguinte vivendo outro dia como aquele, mesmo que tivesse verdadeiro apreço por muitos que ali estavam.

O banheiro ficava a quase cem metros do salão de festas, só em pensar na distância e no estado caótico em que ele se encontrava, a vontade de usá-lo já passava, só que ele precisava encontrar Antonia, havia percebido o quanto ela havia bebido, se divertiu bastante com as outras esposas e amigas do trabalho dele, falou demais até... talvez, ele pensou, ela ainda fosse só uma menina que se negasse a enxergar a realidade mas que cedo ou tarde acordaria e se uniria a ele pelo bem de Pedro Henrique, e então seriam outros tempos, e quem sabe até houvesse uma felicidade intocada aguardando por eles quando tudo se resolvesse... sim... era maravilhoso ter esperança, nem que fosse por causa de muito álcool na circulação sanguínea.

Marcos atravessou o campo com muitas árvores até chegar ao banheiro, usou o masculino e chamou por Antonia da porta do feminino, não obtendo nenhuma resposta. Seu celular não tinha crédito e Antonia não estava com o dela, teria que gastar alguns minutos a mais procurando a esposa e depois alguns outros mais convencendo-a a irem embora. Antonia quando bebia ficava muito autoritária, mas ele não queria pensar nisso, já lhe bastava ter se esquecido de Barbosa por quase todo o tempo em que ali estivera. Barbosa. Que filho da puta! Que porra mesmo ele estava fazendo ali? Certamente observando para depois atingir, era o que fazia de melhor, não passava de um covarde que usava de sua posição. Se Marcos pudesse...se pudesse...mataria o velho desgraçado e acabaria com aquela pose. Devagar. Ia fazer ele sofrer... arrancar unha por unha... depois tocar fogo com gasolina... Faltou o velho Carlos nessa porra de festa.

Marcos enquanto andava se afastando do salão à procura de Antonia, imaginava o prazer que sentiria se pudesse realizar o que sua imaginação criava com tanta nitidez. Os pensamentos dele o levavam por caminhos claros e obscuros, sensações confusas o tomavam acompanhadas pelo enjoo que o excesso de cerveja e as doses de conhaque traziam em forma de refluxo ácido. A cabeça dele rodava e ele trôpego pisou numa generosa porção de fezes caninas. “Porra!”, Marcos riu e pensou que sempre acreditou que pisar em merda era sinal de dinheiro à vista. Mas só vivia liso. Sempre liso. Era por isso que sua vida vivia pelo avesso. Como poderia ao menos também se sentir feliz pra poder fazer Antonia feliz como se prometeram quando se apaixonaram desafiando a todos para ficarem juntos? Se as coisas tivessem que acontecer com o mínimo de lucidez, bastava que ele se acalmasse um pouco e arriscasse ter um pouco de fé...e fizesse sua parte, buscasse sair da “não conformação” em que se encontrava.

Enquanto devaneava, Marcos se viu caminhando pelo campo de futebol society com grama sintética, a caminho de onde não sabia, estava meio escuro, mas ainda se podia ver os últimos resquícios do ocaso, realmente o conhaque tinha batido com força em seu fígado surrado por tantos remédios pra gripe e ele não lembrava a última vez em que tinha ficado tão chapado. Achava que só nas festas do Ensino Médio.

Estava sem perceber caminhando na direção oposta ao salão, a música se distanciava, ele andava rumo a uma construção inacabada do que provavelmente seria um chalé quando pronto, só que naquele momento não passava de algumas paredes erguidas sem nenhum acabamento, sem teto, tijolos avermelhados se misturavam às árvores que na chácara eram abundantes. Ele pensou em contornar a construção e voltar para o salão, provavelmente Antonia estaria lá, quem sabe à procura dele também. Havia sido um dia e tanto para se refletir nos propósitos pessoais, assim pensava Marcos, mas, já estava na hora de descansar, voltar pra casa, e outra vez se deparar com a realidades dos fatos.

Enquanto fazia a volta no esqueleto de chalé, seus ouvidos captaram um som baixo que imediatamente serviu como um ativador de sua atenção: um gemido; um sussurro que lhe pareceu de alguma maneira familiar... “Ui ui...ai..”, e o som de leves pancadas secas. Seu primeiro impulso, e certamente o que fez toda a diferença, foi se agachar e observar pra saber se estava viajando ou ouviu algo que o havia lembrado coisas só dele. Acocorado junto à uma das paredes, Marcos se desligou do som alto do forró que vinha do salão e atentou a possíveis sons que vinham de algum lugar próximo a ele, por trás de uma das paredes, o escuro já se acentuava, e como a curiosidade muitas vezes nos empurra cara à cara com coisas sequer antes cogitadas, ele pensou que provavelmente alguém havia se excedido e decidira resolver sua situação por ali mesmo.

Os gemidos baixos continuaram, alguns eram de homem. Sim. Estavam transando. Mas quem seria? Era nisso que sempre dava bebida e festa. Marcos sentia o álcool pulsando nas veias da têmpora, mas agora precisava saber quem era o casal de atitude, quem sabe até angariar algum assunto para circular no Jornal Peão dos próximos dias, quando o campo de concentração Dia Belo voltasse sua rotina excruciante. Que viagem desses dois!

Tomara que não conhecesse quem estava fazendo de uma construção inacabada um quarto de motel ao ar livre, seria menos constrangedor para todos se não se vissem, Marcos só queria saber quem era por saber mesmo, pra contar pra Antonia quando chegassem e quem sabe... reanimar um pouco a situação deles que já estava ficando um pouco rotineira. Uma vez na semana era a média entre eles depois do nascimento de Pedro Henrique, mas em dias de festa, era sempre como nos primeiros tempos. Ele ainda amava essa garota mimada, ela era o tipo dele. Antonia... Que gênio tinha essa mulher... mas, assim que devem ser os relacionamentos que duram décadas. Nada é sempre perfeito, a conquista é o dia após outro. Ele também tinha seus defeitos. Ambos tinham suas qualidades. Talvez isso fosse ser um casal...

Alguém aumentou o som que vinha do salão e ele ecoou pela área da chácara, e se chocando com as árvores a música se repartia em milhares de fragmentos que se repetiam e formavam ecos que reverberavam fazendo com que o efeito que preenchia Marcos com tantas divagações o tornasse ainda mais curioso. De certa forma ele estava excitado.

Se agachou e se valeu do volume alto para se aproximar por trás de onde imaginava estar vindo o som de estocadas, o som era dos corpos se encontrando no ritmo de algum quadril, agora que a música estava mais alta, pareciam que se haviam deixado levar pelo ato e a música que deles vinha também havia aumentado, agora o homem gemia e e a mulher parecia gemer com a boca amordaçada, Marcos se situou e foi lentamente arrodeando a parede de tijolos vermelhos, iria apenas ver do que se tratava e voltaria rapidamente para o salão, Antonia já deveria estar estressada com ele, ela sempre se estressava se ele sumisse, ela era um pouco ciumenta, sempre tinha que ser como ela queria.

Marcos chegou à extremidade da parede que daria para o lugar escuro, amparado por algumas árvores com vegetação suficiente para formar um bom esconderijo para amantes aventureiros, onde o casal fazia aquilo que é responsável pelos bilhões de nós espalhados por esse lugar que precisa que façamos o que o casal fazia porque além de desejarmos muito fazê-lo fazemos porque somos ferramentas daquilo que não conhecemos e é o que somos... Marcos realmente esperava encontrar Antonia quando chegassem em casa pronta pra ele como quando começaram. Beber sempre o deixava no estilo reprodutor. Ele ia pedir para ela pôr o espartilho vermelho que ele curtia, a gravidez e a maternidade não haviam afetado o corpo de Antonia, ela ainda continuava com o corpo firme de uma princesa bem cuidada. Contou de um até três mentalmente e se preparou pra dar a olhada excitante e hesitante...Três... dois... um...

“TXHANRAM!!”

Marcos congelou.

Como um soldado que avista um inimigo portando uma metralhadora sendo que está desarmado para o atacar, Marcos recolheu a cabeça como um raio pra não ser visto. O corpo parecia ter recebido uma descarga de milhares de volts, as mãos buscavam apoio na parede que o encobria, o coração parecia que iria explodir ao mesmo tempo em que a força nas pernas magras lhe havia sumido quase por completo, ele se sentou e respirou como se estivesse acabado de correr o pique dos trezentos metros. “Não pode ser...não meu Deus... não... é mentira... não...”, Marcos sentia na garganta como se a apertassem, não fazia sentido o que havia visto... não... tinha que olhar outra vez...sim... tinha... por Deus...

Quando Marcos se posicionou fazendo o possível para conter algo que dentro dele parecia querer explodir, algo como o choro de uma criança que acaba de ser surrada, contou outra vez até três e quando seu rosto se enquadrou outra vez na direção da cena avistada segundos antes, ele resolveu manter-se firme... e não houve a mínima dúvida. O céu se partiu...

Com as duas mãos na parede, Antonia havia erguido a saia rosa até um pouco acima da cintura, o corpo inclinado para frente fazia com que ela se empinasse, por trás dela, com uma das duas mãos segurando sua cintura bem esculpida, Barbosa, que havia deixado a calça jeans cair até os tornozelos acompanhando sua roupa íntima, com a outra mão calava a boca dela enquanto seu quadril se movimentava rapidamente, freneticamente, fazendo com que o som de estocadas que Marcos ouvira estilhaçasse como um martelo à um espelho tudo que um dia ele havia projetado para seu futuro.

Marcos estava imóvel, derrotado, o corpo todo tremia, parado ele viu que o casal sequer percebera que estava sendo observado, no escuro, Antonia virou-se de frente para Barbosa que a pressionou na parede segurando uma de suas pernas quase até a altura dos ombros dela, e Marcos ainda havia constatado que Barbosa durante a ação mantinha um cigarro aceso na boca. Que cena! Marcos havia vivido vinte e sete anos de sua vida mas nunca esteve pronto para presenciar uma cena como aquela. “Por quê? Por que Antonia? Que mal que te fiz? Eu mereço isso?” Pobre Marcos... Não lhe bastasse tudo que viveu no último ano sob a jurisdição do maldito crápula mercenário tinha que acontecer isso?

Mas o acontecido também havia trazido consequências inevitáveis e irrevogáveis para a vida dos três envolvidos nessa história absurda. Marcos voltou para trás da parede decidido a renascer, agora que era e seria para ele mesmo e para quem soubesse do ocorrido só mais um corno, que ele fosse ao à moda antiga. O efeito da bebida que minutos antes o afetava agora parecia ter sumido por completo, Marcos se sentia totalmente lúcido, consciente até os mínimos detalhes sobre a situação miserável que de uma hora para outra o havia tragado, com a ajuda inegável do acaso, agindo sobre suas atitudes mais desinteressadas, ele estava completamente decidido a fazer passar o que estava sentindo naquele lugar onde até minutos antes, havia um coração. Isso não iria ficar assim. Um vazio o tomava e apenas a vingança lhe traria qualquer conforto, somente ela, nada além dela...

Marcos olhou para o chão à procura de algo para lhe servir de ferramenta, viu próximo a ele uma garrafa de cerveja de 1 litro, o som que vinha do salão agora tocava de maneira estrondosa música eletrônica, as árvores tremiam e não podia haver melhor trilha sonora para o que aconteceria dentro de instantes, ele não hesitaria, sabia que fisicamente ele levaria total desvantagem, mas o que o movia era capaz de reduzir ao nada qualquer obstáculo que se pusesse entre ele e o cessar daquela dor desconhecida. Pobre Pedro Henrique... o que contarão para ele quando um dia ele perguntar? Droga! Por que Antonia? Por que...

Marcos aproveitou o som e bateu com a garrafa na base de uma das árvores próximas, segurando-a pelo pescoço quebrou-a bem no meio e o pedaço em sua mão continha cacos pontiagudos de vidro avermelhado, com a outra mão ele tomou uma grande pedra coberta por concreto seco, e disse a si mesmo que nada o demoveria de sua decisão. Ele era um homem. Ele agiria como um homem. Um homem tem o direito de errar.

Com tudo arquitetado, Marcos sabia que não havia nenhum plano, o plano era acabar com que estava sentindo, pensar só depois, só depois... bem depois. Naquele momento, os últimos anos, em especial o último, lhe passava pela cabeça como um filme, pensava em todos os bons companheiros que havia abraçado e desejado boa sorte após injustas demissões, naqueles que permaneceram e foram incentivados a mudar, e que logo depois estavam outra vez na rua das amarguras, enquanto filhos da putas da estirpe de Barbosa se deliciavam em sangrar cordeiros para que os lobos lhe rendessem alguns restos do que não lhe fosse útil, gente como Barbosa são como hienas da vida real, sabem que sua mordida foi feita pra quebrar ossos... se fingem de bobas entre risadas despretensiosas para no final se verem diante de um corpo morto, de todas as maneiras possíveis de morte nessa estrutura em que o Homem necessita findar seus dias.

Um homem morto tem menos poder de reação. Mate seu orgulho e ele lhe servirá muito mais. Mate-o, e ele terá a real utilidade. “Mate-o... sim... mate-o...” essas foram as últimas palavras que a mente de Marcos lhe sussurrou. E então...

Ele olhou mais uma vez... será que já haviam se dado conta da ausência dos três? Há quanto tempo tudo isso acontecia? Marcos não iria olhar a hora, não faria diferença alguma. Quando avistou a cena pela terceira vez... o quadro era ainda mais chocante: de joelhos, Antonia estava à uma altura um pouco abaixo da cintura de Barbosa, a cabeça dela fazia movimentos de vai e vem efetuados pela mão de Barbosa que lhe agarrava o cabelo por trás num rabo de cavalo, Antonia chegou a tossir uma vez como se engasgada, e cuspiu, antes da pedra lhe acertar a lateral da cabeça...

Ela caiu e Barbosa assustado virou-se para o olhar ao redor desnorteado, porém virou para o lado oposto, não viu a garrafa quebrada que lhe acertou em cheio no pescoço. Marcos havia se aproximado como numa cena de filme. Marcos o golpeou e puxou a garrafa rapidamente, golpeando-o nas costas várias vezes, Barbosa tentou correr mas tropeçou na própria calça que estava abaixada até os tornozelos, ele caiu com uma das mãos no pescoço, tentando gritar mas o sangue fazia com que o som dos gritos soasse como borbulhas embaixo d’água.

“Sua puta! Sua vadia! Vagabunda! Por que você fez isso comigo porra!”, Marcos gritava para Antonia que parecia ainda atordoada com a pancada que recebera com a pedra. Ela começou a chorar, a calcinha verde que usava podia ser vista alguns centímetros de onde ela caíra, e tê-la visto, fez com que Marcos sentisse que as coisas ainda não tinham terminado, que merda de fim de dia ele estava tendo, mas já que já estava tudo perdido, então que ele perdesse tudo de maneira justa e clara. “Eu trabalhei desde sempre pra você não precisar de nada e olhe o pagamento que você me dá sua vagabunda! O que é que eu vou dizer ao seu pai heim? Diz porra!”, Marcos deu um tapa fortíssimo na cara de Antonia, o som no salão não deixava que ninguém que não estivesse próximo à cena ouvisse qualquer coisa.

Barbosa se contorcia no chão, os braços fortes se moviam desesperados, Marcos sabia que o havia ferido mortalmente, eles não haviam percebido a sua aproximação pois estavam muito focados no que faziam.. desgraçados... “Você é um corno safado!”, Antonia gritou de repente, Marcos, que observava a agonia silenciosa de Barbosa, que se engolfava em sangue, a garrafada havia atingido sua jugular, a olhou. “ Não é a primeira vez que eu trepo com outro não seu otário! Seu liso! Agora é assassino também! Eu nem sei se Pedro Henrique é teu filho seu fudido...”, e começou a chorar.

Marcos sentiu dentro dele como se um órgão tivesse estourado e de dentro dele um veneno desconhecido o começasse a consumir, e a única maneira de sobreviver à ele seria expulsá-lo de alguma maneira... o ódio o encorajou e a perdição em que havia adentrado sem que tivesse pedido decidiram que ele deveria continuar o que começou.

Marcos segurou Antonia pelos cabelos, ela apertou a mão dele com as duas mãos, suas unhas compridas cravaram-se no braço de Marcos, só que não foi o suficiente pra fazer com que ele baixasse a mão que se erguia e fazia um corte profundo na bochecha esquerda dela. “AHHII!!”, Antonia gritou e nesse momento alguém desligou o som do salão, e foi possível ouvir o som de burburinho, como se alguém tivesse percebido que algo terrível estava acontecendo. E haviam sim. Duas crianças que brincavam por perto viram um homem caído de longe com a mão no pescoço e chamaram seu pai que de longe reconheceu três pessoas no escuro, duas no chão e uma pé. “ Eu não vou lhe matar não sua puta! Mas fique sabendo que o Pedro Henrique é meu filho sua vadia! Meu filho! Meu filho!”, e outra vez a garrafa cortou o rosto de Antonia, dessa vez do outro lado. O lindo rosto dela agora estava marcado por dois cortes profundos que futuramente seriam cicatrizes notáveis. Os dias de beleza natural e despojada dela chegavam ao fim.

Antes que um grupo se aproximasse e desse um fim ao terrível acontecido, Marcos se aproximou de Barbosa que o olhava com olhos imóveis. O peito arfava, a calça ainda abaixo dos joelhos deixava seu membro agora flácido exposto, uma poça de sangue se formara na grama coberta com folhas secas. “Eae Seu Barbosa, de boa? Eu tenho uma coisa aqui pra você, não sei se você vai querer, mas mesmo assim eu vou te dar, seu arrombado do caralho!”, e nesse instante, Marcos, o Espigão, ergueu uma pedra rachão que se amontoava com outras para formarem uma espécie de caquera, usou a força que lhe restara depois que o último ano tomou suas forças e muito do orgulho que o mantinha como um homem de bem. Mas agora ele era mesmo um assassino. Quem diria. Marcos, corno e assassino. Pedro Henrique sem pai. Mas quem era seu pai? Quem?

Quando a polícia chegou Marcos não resistiu à prisão, Antonia recebeu ajuda dos participantes da festa antes de a ambulância chegar, mas os cortes eram muito profundos para que pudessem fazer algo, mais de vinte pontos foram dados em seu rosto naquela noite. O IML também veio à chácara Duas Virgens para recolher o corpo de Severino Roberto da Silva Barbosa, 55 anos, morto por golpes de arma branca e posteriormente atingido na cabeça com um paralelepípedo que lhe partiu o crânio.

Às autoridades, Marcos reservou o silêncio, aos amigos e familiares, também. O depoimento de Antonia serviu para que a pena de 30 anos fosse lavrada em primeira instância, o réu havia matado sem qualquer motivo, apenas por ciúmes e ressentimentos infundados, agindo por influência do uso de álcool e não dando nenhuma chance de defesa à vítima, que era tido por todos, como uma boa pessoa...

Edgar Lins
Enviado por Edgar Lins em 13/03/2021
Reeditado em 13/03/2021
Código do texto: T7206121
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