Xeque-mate

George Luiz – Xeque Mate

Realmente, o prefeito de Florianópolis conseguira realizar uma grande façanha. A cidade estava repleta de turistas estrangeiros. De quase todos os países europeus, dos Estados Unidos, eles afluíam em grande número. Não eram turistas comuns. Claro que as praias eram uma atração convidativa. Mas a razão maior desse extraordinário mo-vimento turístico era outra. Realizava-se na cidade, um torneio inter-nacional de xadrez. E os patrocinadores tinham investido com força total no evento.

- Você viu os prêmios em dinheiro desse torneio de xadrez, Raul?

- Vi e achei incrível. Nunca imaginei que se pudesse ganhar tanto movendo peças de madeira sobre um tabuleiro quadriculado.

- Sessenta mil dólares para o campeão, vinte e cinco mil para o segundo colocado, quinze mil para o terceiro, parece premiação de um torneio de tênis, ou de golfe.

- Fora a estadia e refeições grátis num dos melhores hotéis da cidade.

- Mas, qual será o retorno disso tudo para o patrocinador?

- Bom, o principal, que dá o nome ao torneio e cobre noventa porcento das despesas totais e prêmios, é um famoso fabricante de produtos eletrônicos e de informática, uma grande multinacional com sede na Alemanha.

- Vai ter que vender muito para justificar esse investimento.

- E vai vender, com certeza.Ouvi dizer que vão lançar uma inovação na apresentação das partidas do torneio.

- É verdade , mas não é propriamente uma novidade.

- Não?

- Bem, o que eles vão fazer já aconteceu em vários torneios na Europa e na América do Norte.

- É mesmo?

- Mas há uma diferença tecnológica importante.

- E qual é?

- Em alguns grandes torneios as peças são representadas por pessoas caracterizadas que se movimentam sobre um tabuleiro enorme onde são filmadas e aparecem para o público, o das arquibancadas e os telespectadores.

- E aqui nesse torneio?

- Aqui as peças serão robôs, verdadeiros andróides,que se movem comandados por controle remoto.Quem já viu diz que é sensacional.

- Puxa, não quero perder isso...você vai assistir, não é?

- Vou sim, e vou levar minha filhinha, a Lílian que tem só oito anos mas está jogando xadrez como gente grande.

- Eu a vi disputando um torneio infantil no clube. Você tem mesmo uma pequena craque em sua casa.

- Bom, então vamos assistir juntos, não é?

- Combinado.

O público compareceu em grande número desde a primeira roda-da do torneio. Os brasileiros estavam obtendo vários bons resultados, alguns ótimos até. Com o desenrolar das partidas, começou a ficar claro que o vencedor seria, ou o número um da Armênia, ou o número um alemão. E de fato eles já não podiam se alcançados quando come-çou a última rodada. Para contribuir para a emoção maior do evento, Karadajian, o armênio e Schmidutz, o alemão se enfrentavam. Os dois tinham o mesmo número de pontos ganhos. Schmidutz jogaria com as brancas.

Os primeiros lances da partida foram os previstos. Mas , a partir do décimo sexto lance, começou a evidenciar-se uma superioridade posicional de Schmidutz. No décimo nono lance sobreveio o inesperado. Karadajian, cometeu o que parecia um erro fatal e perdeu uma torre. O público estremeceu nas arquibancadas. A fria expressão do rosto de Schmidutz alterou-se. Seus olhos brilharam e ele se preparou para liquidar o adversário. Dois lances depois o público , incrédulo, percebeu a verdade. Karadajian realizara um brilhante sacrifício de sua torre. Sua jogada seguinte foi o xeque mate. Schmidutz, o rosto trêmulo de comoção fez tombar o rei branco sobre o tabuleiro.

Do grande tabuleiro que era filmado, o robô que representava o rei branco começou a mover-se em direção à mesa onde a partida tinha sido jogada. O técnico encarregado do controle remoto acionou seus botões inutilmente. O andróide, com uma estranha expressão nos olhos, continuou sua caminhada. Chegou ao lado da mesa onde os dois enxadristas se cumprimentavam junto ao árbitro geral. Afastou com um gesto brusco o campeão alemão. E. como num pesadelo, o público, horrorizado, viu as mãos do robô alcançarem e se fecharem em torno do pescoço do enxadrista armênio. Em menos de trinta segun-dos, Karadajian estava morto, estrangulado. O andróide soltou sua vítima e caminhou de volta para o tabuleiro.

A honra do xadrez alemão estava vingada.

George Luiz
Enviado por George Luiz em 16/04/2008
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