Terra de ninguém | O retorno dos que se foram (PARTE 2)

Capítulo 2;

O caos

Em um corredor a meia luz Hector caminhava lentamente a espreita de uma forma que tomava o contorno de uma mulher nua. Lentamente se aproximava tentando ver quem era. Quando chegou perto o bastante para tocá-la estendeu o braço com receio e chamou-lhe a atenção para que pudesse ver seu rosto. Tamanha foi a surpresa ao ver a jovem baleada ainda com as bandagens que ele mesmo colocara. Atordoado, deu alguns passos para trás, quando sentiu tocar em algo, se virou e viu uma senhora de semblante calmo e sutil. Hector pediu-lhe desculpas, mas tudo que conseguiu ouvir foi um gruído estridente que o deixou tonto por alguns segundos. Percebera que fisionomia da senhora mudara completamente. Tentou se afastar, mas a velha agarrou-lhe o braço e o mordeu arrancando-lhe um enorme pedaço de carne que fez com que o sangue jorrasse. Sem entender o que estava acontecendo virou-se para a jovem baleada e a ouviu balbuciar uma frase enquanto a mesma cuspia jorros de sangue:

_ O mundo vai acabar Hector, nós iremos acabar com esta terra de ninguém...

Hector de sobressalto abriu os olhos e ouviu um som estranho e grave. Olhou para a cômoda e viu seu celular com a tela acesa dando voltas pela madeira. Olhou a chamada e viu que era da funerária. Ao atender reconheceu a voz de Fernanda, a secretária.

_ Hector, precisamos de você aqui, recebemos três cadáveres para preparação.

Sem entender olhou para o relógio e viu que era uma da tarde - Fernanda sabe que meu horário começa às dezoito horas - respondeu com a voz ainda embargada pelo sono.

_ Entendo, mas o senhor Lúcio está com falta de agentes e precisamos de você aqui.

Tamanho era seu ódio por aquele velho gordo e sem educação, o dono da funerária. Como ele se atrevia acordá-lo após um plantão de quatorze horas?

_ Diga a ele que estarei aí em duas horas - Disse muito a contra gosto.

_ Não há a possibilidade você chegar mais cedo? A coisa aqui está apertada – Disse Fernanda ainda tentando êxito no pedido.

_ Preciso comer e tomar um banho estarei aí em duas horas – Respondeu Hector de forma seca e mal-humorada.

_ Tudo bem, digo ao Sr. Lúcio – Balbuciou Fernanda ainda desgostosa com a resposta.

Hector se levantou e foi direto para o chuveiro, após o banho sentou-se na frente da TV pensando em ligá-la, mas achou melhor preparar algo para comer. Enquanto preparava um café seu pensamento viajava através do vapor da água e seu pensamento se fixava naquele pesadelo estranho. Ficava repetindo mentalmente a frase da jovem:

_ O mundo vai acabar Hector, nós iremos acabar com esta terra de ninguém... – Hector não pôde deixar de rir disto ao se lembrar do que vira na TV naquela manhã e da sensação de caos que ele tivera ao ver a notícia no jornal.

Já dentro do ônibus Hector ouviu um burburinho de duas senhoras sentadas nas poltronas da frente. Discutiam elas sobre algumas mortes inexplicáveis no dia anterior e sobre pessoas mordendo pessoas como animais. Uma chegou a comentar de um garoto de sete anos comendo a carne do braço do irmão morto. Isso era assustador e irreal demais, por isso Hector pensou que as velhas estavam falando de alguma suposta novela com esta temática sensacionalista. O que era estranho, uma vez que sonhara com algo parecido naquela manhã.

Ao chegar à funerária percebeu uma movimentação maior do que a de costume, pois vários carros da polícia civil estavam estacionados na frente da casa e vários homens entravam e saiam com as famosas “gavetas”, macas que transportavam cadáveres. Ao adentrar na recepção avistou Fernanda e foi direto perguntar o que estava acontecendo.

_ O que está havendo?

_ Tivemos 16 chamados para preparação nas últimas três horas – respondeu Fernanda atordoada com os papéis em sua mesa.

_ 16? Este é um número extraordinário para preparações em um dia. Digo com a certeza de um profissional que trabalha a 17 anos neste ramo.

_ Foi isto mesmo que você ouviu. Nas últimas duas horas nossos agentes prepararam mais de cinco corpos para os funerais.

_ É algo sobre um vírus mortal que se espalhou pela cidade – Disse a jovem em tom de sussurro.

Hector se encaminhou para as salas de preparação e surpreendeu com a quantidade de corpos na sala e ainda com o estado deles. Vários com feridas expostas e outros ainda com várias partes decepadas. Aquilo estava um caos.

***

Álvaro Volkhadan
Enviado por Álvaro Volkhadan em 09/02/2009
Reeditado em 23/02/2009
Código do texto: T1429427
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