A cabra

Doce mulher.

Veja como ela dança. Suave e gelada acima de nossas cabeças.

Assista seus movimentos, em meio aos véus de fogo.

Seus olhos vão marejar com a dança misteriosa.

Observe-a deslizar no ar, como se o vento fosse líquido.

Sinta o espírito lhe abandonar o corpo, abstrato.

Veja as chamas negras que crepitam silenciosas.

Ouça os sinos longínquos badalarem funerários.

Desça as escadas de pedra, íngremes e tortuosas.

Abra os portões de ferro, banhados em sangue fresco.

Toque as paredes úmidas, engolidas pelo breu.

Caminhe pelo túnel gelado, sentindo a presença da morte.

Suba os degraus lodosos, e encontre a saída para a luz.

Respire a névoa esbranquiçada e embarque na ponte para o além.

Continue sem olhar para baixo, sobre o penhasco malicioso.

Há alguém lá em baixo, seu desespero rasga o silêncio.

Não está sozinho, há milhões deles também.

Vozes confusas – não de homens, nem mulheres.

Desumanos, sorumbáticos, o coro é assustador.

Estão por todos os lados, sobre as pedras ao redor.

Corpos difusos, acinzentados, ocultados pela fuligem.

O calor o aquece, chamas aparecem, seu corpo pode queimar.

Corra mais depressa, ignore as súplicas e chegue ao altar.

O altar de mármore, no final da ponte, seu destino está lá.

Sobre ele, está ela, belíssima e graciosa, como sempre a dançar.

Seu corpo de mulher nua, com seios formosos, mas algo novo a intrigar.

Sua cabeça, com chifres grotescos, pêlos negros e olhos âmbar.

Fuja! Corra! Grite!

Vá para longe desse diabólico inverno!

Você vai encontrar a placa seguinte:

Bem vindo, meu caro.

Bem vindo ao Inferno.

"O caminho para o inferno está pavimentado de boas intenções."

(Karl Marx)

Glaucio Viana
Enviado por Glaucio Viana em 21/04/2009
Reeditado em 21/04/2009
Código do texto: T1551864
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