A morte da pequena Ester
 
Já faziam 7 meses desde que ela fora destroçada embaixo do caminhão de Václav e as lembranças daquele dia refaziam-se, no supermercado, ao fazer suas compras, nas praças em seu momento de lazer, era um homem atormentado e todos faziam questão de lembrá-lo da tragédia como se a culpa coubesse exclusivamente a ele, mas não era e isso só ele sabia.
O sangue que jorrou naquela manhã de domingo e que tingiu de rubro o asfalto negro fora um ato tresloucado de Ester, que num inesperado momento enveredou para a pista de rolamento, saindo de trás de uma árvore e encontrou a horrível morte no meio do rodado da gigantesca carreta de Václav, que acabara de entrar na rua da vila e já iria estacionar, foi comovente, foi desconcertante, foi tragicamente irreversível?
Irremediavelmente foi tudo isso, mas foi fruto da infelicidade de Ester, foi a fatalidade que reduziu o pequeno e delicado corpo a um amontoado de despojos irreconhecíveis.
Tudo que o caminhoneiro pode fazer, ele fez no dia do desastre, mas os olhos de Ester adquiriram o tom enevoado daqueles que iniciam a longa viagem para a eternidade, ela tinha pouco mais de 2 anos, vivera pouco e numa fria analise dos fatos, ela não merecia uma morte daquelas, e talvez seja por isso que Václav desde então cultiva a contragosto profundas olheiras, e parece um autômato no volante do seu bruto.
Ele mesmo gosta de frisar que metade de sua vida ficou lá ao lado da floreira de Dona Mariquinha, onde a pequena Ester repousou dilacerada até que retirassem dali o seu corpo, num comovente sentimento de perda, que todos sentiram.
Pequenas lendas surgiram depois dessa morte, que rezam de que a tempestade que veio depois foram os demônios que mandaram para lavar o local da tragédia e tornar escuro e frio o dia do passamento da pequena Ester.
A dimensão da comoção mede-se até hoje, quando se relembram que nada substitui esta dor, ela foi a alegria daquela casa, a felicidade de tanta gente que a conhecia, pessoas que a viam, brincando até as primeiras horas da noite na calçada em frente a sua casa, e que cedo, na manhãs, chamava a atenção de todos, junto ao seu portão, uma graça de criatura, não precisava sorrir, seus olhos contavam da sua felicidade em viver e ser tão querida por todos.
Apesar da sua natureza ela adorava crisântemos, reconhecia seu perfume ao longe.
Realmente é um vazio imenso e uma perda irreparável a morte da cadelinha poodle Ester de Dona Maneca, enterrada num canteiro de flores, alí no local dos fatos.
 
Malgaxe
 
Malgaxe
Enviado por Malgaxe em 17/06/2010
Reeditado em 28/07/2010
Código do texto: T2325198
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