Gatos do cemitério

Talvez as coisas que vou relatar aqui já tenham sido percebidas por alguns de vocês, mas caso não tenham percebido, na próxima vez que passarem por essa situação se lembrarão de minhas palavras.

Pois bem, nunca tive o hábito de frequentar velórios ou enterros, sempre me esquivei o quanto pude desses "eventos".

Mas exietem certas ocasiões em que não se pode fugir disso, e foi o que aconteceu quando meu pai faleceu.

Apesar de não ser o meu programa favorito, tiver de passar a noite lá no velório.

Meu pai faleceu no hospital, após mais de uma semana internado na UTI com todos os aparelhos ligados. Sofreu um infarto. Que somado à seus outros problemas e sua idade avançada se complicou ainda mais.

Após todo o dificil trabalho de acionar funerária e outros procedimentos mais, o corpo foi levado ao velório à 01hora da madrugada.

Nos dirigimos para lá, eu, minha mãe, meu irmão e um senhor que nos acompanhou.

Estava bem frio naquela noite. Muito frio.

As cenas que ficaram gravada em minha mente jamais se apagarão.

Passamos a noite lá, apenas nós.

Bem, digo apenas nós de humanos, pois havia por ali alguns gatos que circulavam, entravam nas salas do velório, se aproximavam das pessoas ali presentes.

Eram animais dóceis, amigáveis. Achei interessante.

Quando o dia foi clareando notei que havia mais gatos a circularem ao redor do velório.

Me disseram que viviam por ali. Eram os gatos do cemitério e uma senhora os alimentava.

Durante o dia, fui andar um pouco pelo cemitério que fica bem em frente ao velório municipal.

E lá, para minha surpresa, logo na entrada do cemitério, andando por sobre os túmulos, vi vários outros gatos, de diversas cores, de tamanhos diferentes.

Olhavam com um olhar estranho, como que de piedade, de uma certa dor e melancolia.

Mas um deles me chamou mais a atenção.

Era escuro, não negro, mas acinzentado, bem grande, creio que seria da raça angorá.

Me olhou com ar de superioridade, como se fosse uma espécie de líder.

Nossos olhares se cruzaram apenas alguns segundos mas foi o suficiente para me arrepiar.

O dia passou como o pior dia de minha vida, pois nunca tinha perdido ninguém assim próximo.

Os dias se passaram e pela força recebida através das pessoas amigas que passaram pelo velório, senti que deveria também comparecer a velórios de parentes e amigos.

E assim o fiz. Um, dois, três e mais vezes compareci.

E fui notando que gatos sempre apareciam por lá, mas não eram os mesmos, sempre eram diferentes. Isso começou a me intrigar.

Mas não comentei isso com ninguém.

Um dia porém, algo que vi me deixou arrepiado totalmente.

No velório do pai de um amigo meu, fui dar umas voltas pelo cemitério para dar uma relaxada, e logo na entrada lá estavam eles. Os gatos do cemitério.

Vários a caminhar por entre túmulos, outros deitados á sombra.

Todos diferentes, nenhum que estivesse por lá na última vez que fui a um velório.

Mas um deles eu reconheci, e ele me olhou fixo nos olhos. Era ele, o gato angorá acinzentado.

O mesmo olhar, o mesmo brilho melancôlico que vi quando estive lá quando do falecimento de meu pai.

Medo. Foi isso que senti ao cruzar meu olhar com o dele.

Era como se ele dissesse: Eu te conheço e em breve você me conhecerá também.

Foi uma questão de segundos e quando desviei meu olhar para outro lado ele desapareceu.

Fiquei com aquela cena na cabeça por alguns dias.

Não fazia sentido, porque apenas um gato era o mesmo. Porque? O que ele tinha de diferente dos demais?

Uma noite demorei a pegar no sono, e quando peguei no sono, tive um sonho muito estranho.

Sonhei com os gatos do cemitério, ou melhor dizendo, com aquele gato especificamente.

No sonho ele me disse que os gatos eram as almas das pessoas que morriam e que fciavam por ali para se despedirem de seus entes queridos e para verem quem os vistava pela última vez. Achei que fazia sentido. Mas e ele, porque sempre estava por ali.

Ele me disse que era o guardião do caminho, e que sua função era encaminhá-los até seus respectivos túmulos e depois que todos já tido ido embora, ele encaminhava suas almas para um lugar de descanço.

E no sonho me lembro de te-lo visto encaminhando meu pai logo após todos terem saído do cemitério. Acordei tranquilo e aceitando o sonho como uma explicação real.

Muito tempo depois desse estranho sonho me encontro hoje numa situação totalemente estranha. Estou bem de frente ao gato, sim, aquele gato do cemitéiro, o angorá.

Ele está me explicando como será meu dia hoje, que tenho de aproveitar para me despedir, para demonstrar meu amor e para ver as pessoas que vieram prestar sua última homenagem.

É estranho como as coisas se encaixam.

A propósito quando você for a algum velório, com certeza verá por lá um ou dois gatos, e se ele se aproximar, faça um carinho, afinal você nunca saberá quem ele realmente é ou foi.

Paulo Sutto
Enviado por Paulo Sutto em 14/08/2010
Reeditado em 16/08/2010
Código do texto: T2437830
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