Demônios da Vingança - Parte II

Essa deve ser a última histoira publicada (se bem que é uma parte de uma histoira) aqui em 2010. Talvez não, espero que não, mas caso seja não posso deixar de desejar a todos um feliz natal e um próspero ano novo(apesar do clichê de Boas Festas, realmente, desejo isso para todos).

Quero dedicar essa historia em especial a minha queridissíma amiga Faby Cristall (feliz?) rsrs

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Fernando tentou recuar, mas era tarde demais, muito tarde. A vista começava a faltar. A cabeça parecia que pesava uma tonelada, podia sentir a dor do seu cérebro pulsando, dentro do seu encéfalo, aquilo era horrível.

Finalmente, seus músculos começaram a relaxar era a morte chegando, a morte física, pois a morte espiritual dele não aconteceria, pelo menos não agora. O corpo já sem vida na corda balançava como um pendulo, de lá para cá. Seu espírito foi sugado pelo redemoinho, ele afundou no chão, mas não era mais o chão da casa dele, era alguma espécie de gosma, eletrostática, sentia muita dor, de repente, tudo ficou escuro e Fernando perdeu os sentidos.

***

Januário, padrasto de Fernando chegou a casa, vinha acompanhado de um velho amigo dos tempos da Marinha, pois Januário era suboficial aposentado. O velho ganhava bem, mas vivia atolado no álcool, pois era um alcoólatra sem vergonha. Ele vinha conversando com o amigo sobre mulheres que tinha se envolvido antes de conhecer a atual mulher.

- A rapaz, essa mulher me domou. Ela me entende. Ela é a mulher que eu sempre procurei.

- A você diz isso, pois está velho. Mas o sargento que eu conheci ha algum tempo era um louco. – disse e caiu na gargalhada.

Seu Januário procurava a chave nos bolsos da calça, enquanto sorria com o amigo. Ele não sabia que a mulher estava morta e que seu enteado estava ali dependurado pelo pescoço, morto também. O homem finalmente achou a calça nos bolsos de trás da calça. Levou a velha chave à fechadura, girou para o sentido horário destrancando a porta. Com um aceno de mão convidou o amigo a entrar, o velho entrou antes do senhor Januário, afinal era a visita.

Toda a casa estava no escuro, só podia distinguir de longe a pequena fluorescência do interruptor da luz da sala. Seu Januário não sabia, mas seria o culpado pela morte do amigo. Caminho até o interruptor e o acendeu com a palma da mão. A sala se encheu de luz, pequenas brechas de sombras se faziam presentes em lugares estratégicos, como debaixo do sofá, por detrás das mesas e abajures, mas uma coisa chamava mais a atenção.

Dependurado bem no centro da sala, Fernando balançava, com o rosto já quase roxo. O velho amigo só teve tempo de dizer:

- Meu deus.

O susto foi tão grande que o fraco coração do miserável não agüentou, ele começou a enfartar na cadeira. A descarga de adrenalina na corrente sanguínea dele foi demais, o estreitamento das veias que irrigavam o coração, com acúmulos de plaquetas de ateroma, fizeram o homem começar a morrer. Januário ficou paralisado, não conseguia mover um músculo, ficou encarando com certo ódio o rapaz enforcado, baixou a vista e viu o copo e a garrafa de cachaça.

- Filho da puta, ainda bebeu minha cachaça. – fez uma pequena pausa para respirar e olhando para os olhos semicerrados do rapaz – seu idiota, não deveria ter feito isso, o que eu vou dizer para sua mãe agora.

***

Na pequena casa um velório acontecia, eram velados mãe e filho. Todos comentavam:

- A mãe foi morta por bandidos, o filho não agüentou a pressão e acabou se matando.

Alguns diziam:

- Coitado do seu Januário. Perdeu a esposa e o filho no mesmo dia e ainda perdeu um amigo. O pobre velho não agüentou a cena do menino enforcado.

Ai alguém dizia:

- Não era filho dele.

A verdade era que Januário estava triste, pois havia perdido aquilo que chamava de sua família. A dor maior que sentia era a perda da mulher, ela era um anjo para ele. Dona de casa exemplar arrumava suas roupas, fazia sua comida, agüentava seus abusos, ou seja, Januário não tinha uma esposa, ele tinha uma escrava. O velho também pensou no rapaz morto, que imbecil, idiota morrer na flor da idade. Penso quando tinha seus trinta anos, era terceiro sargento da Marinha há dois, estava no auge. Todo final de semana levava pelo menos uma mulher para a cama. Nesse momento, pensou em Fernando, nas discussões que tinha com o rapaz, o pobre bastardo era um cara inteligente, mas infelizmente, devia ter problemas mentais.

Durante toda a noite, na pequena sala da casa de Januário, haviam passado vários vizinhos, parentes e amigos dele. Pouco depois de o sol nascer, o velório estava perto do fim, o pessoal da funerária já havia chegado, no enorme carro funerário. Seu Januário ficou pensando como aquele negócio de funerária era interessante, trabalhar com pessoas mortas, deviam viver torcendo para que muita gente morresse. A mulher pagava um plano de assistência funerária. Pelo amor de Deus, quem em sã consciência pagaria um negocio daqueles, pois era inútil, só seria usado uma vez na vida. Ele ficou olhando, silencioso, imerso em seus pensamentos revoltosos, enquanto os homens ajeitavam os caixões e desmontavam os castiçais e outras coisas para o velório. Januario levantou-se e foi conversar com os homens:

- Amigo. Vocês poderiam esperar um minuto, enquanto tomo banho? É rapidinho.

Os homens concordaram, afinal, o pobre velho estava desconsolado. Iria viver sozinho agora, sem a esposa e o filho. Eles não sabiam da história toda.

Seu Januário entrou no banheiro com a toalha e uma muda de roupa nas mãos. Aliviou a bexiga na privada, demoradamente. Tirou toda a roupa com dificuldades e entrou no chuveiro, deu uma gemida, quando a água bateu em seu corpo, ficou pensando o motivo de os velhos gemerem tanto, mas acabou o banho e não achou resposta. Vestiu-se com mais dificuldade, quase não acertou as duas pernas da calça, lembrou-se que a esposa sempre o ajudava com isso.

Saiu do banheiro vestido para ir ao enterro.

- O carro funerário está lá fora. – disse um dos rapazes da funerária.

Januário seguiu o rapaz. Demorou um minuto para trancar a porta de casa. Virou-se e ficou procurando o carro, esperava encontrar um enorme Chevrolet Opala Caravan preta, mas no lugar viu um enorme carro baú, todo cheio de adesivos da empresa, não conheceu o carro, viu apenas que era um Volkswagen. Entrou no carro sem muita conversa. Sentou-se ao lado do motorista. O pequeno cortejo fúnebre saiu do bairro humilde e seguiu rumo ao cemitério municipal da cidade. Eram apenas quatro carros, o da funerária ia à frente, uma Kombi cedida pela empresa ia atrás e dois carros de amigos e parentes seguiam atrás.

Chegaram ao cemitério por volta das oito horas da manhã. O padre já estava lá. Havia algumas cadeiras para as pessoas sentarem, a missa de corpo presente foi celebrada e a extrema unção foi dada. Tudo preparado, os caixões iam descer. Uma lágrima escorreu do rosto do velho viúvo.

O enterro havia acabado. Algum parente se responsabilizou de levar de volta em casa o velho.

***

Uma forte chuva caia na noite da cidade, banhando as lágrimas dos habitantes. Aquele leve frio que aparecia e o barulho da chuva caindo no telhado era um convite ao sono. Toda a cidade dormia cedo em noites como aquela. Não havia lua, pois estava chovendo, mas todos sabiam que por cima das nuvens um belo luar se fazia de tímido para não aparecer.

No velho cemitério municipal não era diferente, a terra molhada mais fofa se fazia quase como uma lama, mas rosas brotavam de alguns lugares. Todo aquele ambiente, meio gótico, meio bucólico era digno de uma fotografia.

O tumulo da família Chagas ainda estava com o cimento fresco, pois fora fechado a menos de 4 horas, afinal o velho coveiro só deixava para acabamentos nos túmulos depois de certo horário da tarde, mas o que nem mesmo o coveiro sabia era que dentro do tumulo, pancadas na tampa do caixão podiam ser ouvidas. Era o retorno da mansão dos mortos. O despertar de Fernando.

João Murillo
Enviado por João Murillo em 16/12/2010
Código do texto: T2675324
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