A Maldição da Floresta

- Oh droga! - exclamou ela assim que seu pé topou com a raiz do velho carvalho que, como muitos ali, com certeza tinha mais de um século de vida. As raízes pelo chão da floresta eram altas e facilmente alcançavam mais de meio metro do solo.

- Levanta rápido, mana - seu irmão aflito dizia enquanto tentava ajudá-la a se levantar, pouco se importando com os cortes que levemente começavam a sangrar do joelho da menina.

Não havia muito tempo para correr, pois conseguiam ouvi-los se aproximar. Aquela noite não foi das melhores para os dois, pois subestimaram as velhas histórias que seus pais contavam sobre os perigos encontrados pelas redondezas. Mas a curiosidade juvenil não os impediu de entrarem no meio da tarde mata a dentro. Porém em pouco tempo o que era dia tornou-se noite. As árvores insistiam em não deixar a luz do sol passar, e eles também não perceberam que ao se perder, em vez de voltar à vila, adentraram mais profundamente na floresta.

Agora, já se aproximando do coração do bosque, a névoa pairava no ar, dificultando a visão. E foi num descuido que ela tropeçou naquela raiz.

As folhas sendo pisoteadas por centenas de pés, eram audíveis por vários metros, e percebia-se que não estavam tão perto, mas isso não ajudava nem um pouco o nervosismo daquela dupla.

Quando enfim conseguiram se por em pé, olharam ao longe e, por detrás da névoa, perceberam milhares de olhos vermelhos, que pareciam fitá-los com desejo. Não faziam ideia do que se tratava, mas as lendas locais falavam desde lobisomens, até chupa-cabras ou monstros sem cabeça. Sem saber se era uma alucinação causada pelo medo, ou a realidade, deram as costas e voltaram a correr.

Quanto mais corriam, mais perto o farfalhar das folhas era ouvido, e mais causava a impressão de sentirem uma respiração quente próxima à suas nucas.

Foi quando num dos saltos quase acrobáticos que ele deu sobre uma raiz pendendo para o solo, seu pé travou no chão e foi possível sentir sua canela partindo-se em duas, caindo tonto com o peso do próprio corpo, rasgando a pele da perna, revelando sua tíbia dividida ao meio.

- Mano, não acredito, por favor levanta - disse ela aos prantos.

- Não dá, tu não tá vendo que quebrou? Sai daqui duma vez - Ele diz, tentando disfarçar o medo em sua voz, mas sem conseguir segurar o sofrimento, gritando para tentar diminuir a dor dilacerante.

- Eu vou ficar aqui com você - dizia, tendo a certeza de que o irmão nunca a deixaria ficar ali.

- Tu tá maluca, sai daqui duma vez.

- Eu não vou te deixar - com os olhos marejados, temendo que aquilo fosse um adeus.

- Por favor maninha, vamos ficar juntos! Eu prometo...

- Promete?! - pergunta.

- Eu prometo - disse, acomodando-a em seus braços, apertando com força sua amada irmã, pois tinha quase certeza que não a veria mais - Corre! - Gritou, enquanto a via se distanciar.

Sabia o que tinha que fazer. Tentou ficar em pé, mas a única coisa que conseguiu produzir foi um grito que veio do fundo da alma, e cair novamente. Sentindo tudo ficar escuro em frente aos olhos, imaginou o que estaria por vir. Iria desmaiar?!

- Não agora! - pensou.

Segurando-se no tronco da árvore, conseguiu levantar-se, apoiando na perna que estava boa. Mas quando se virou para encarar o perseguidor, não ouviu nada. Nem uma mísera folha sendo jogada ao longe.

Aos poucos o coração foi desacelerando. A adrenalina do momento não o deixava mais sentir tanta dor, mas isso também foi passando, e a dor aumentando.

- Teria sido imaginação? Mas ela também o viu. Ou será que não?! - pensou.

As dúvidas assolavam sua mente, e crescia a incredulidade por não ouvir mais nada. Sentou para tentar diminuir a dor que agora começava a provocar uma tremedeira, pela perda de sangue.

- Ao menos ela está a salvo... - disse a si mesmo, enquanto perdia a consciência e caia no solo estofado de folhas...

- TUFFF - um olho se abre...

- TOFF - o outro olho...

- CRECK - o barulho do galho se quebrando foi o suficiente para ele levantar-se e novamente cair, suado, pela dor que ainda sentia muito forte.

Não teve muito tempo para pensar. O cenário continuava o mesmo, escuro e enevoado. Mas agora via vários riscos vermelhos passando ao longe. As folhas se agitando, troncos caindo.

Novamente, temeu por sua vida.

Ao mesmo tempo que tenta se levantar, vê uma sombra, seguida de um par de olhos vermelhos se aproximando, e aumentando lentamente. Em uma prece sutil pede que sua irmã tenha conseguido fugir.

A sombra vai crescendo, e além disso, é possível ver o chacoalhar de pelos. Sim, as criaturas tinham pelos.

Pegando um pedaço de galho caído, a guarda estava armada. Iria lutar até o fim!

Então aquela coisa gigante faz sua investida. Dois metros de pelo e carne saltando em sua direção. Mais por reflexo e sorte que por habilidade, erguendo a ponta do galho, consegue atingir o meio do peito do animal, que dá um último grunhido e cai de lado.

- Estou salvo! - pensa.

E quando se virou para sair dali, vê parado bem à sua frente uma figura grotesca, duas vezes maior que o animal que o atacou, com os pelos eriçados. Cai de joelhos. Sua última ação é olhar para cima enquanto aquela bocarra se abria em sua direção. Já sentia o bafo podre, quando olha bem dentro da goela do animal, e sorri. Enfim estava aliviado.

Estava cumprindo sua promessa...

Álisson Zimermann
Enviado por Álisson Zimermann em 14/01/2011
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