Memórias de um carteiro
 
Na imensidão daquele vale azul, sob as brumas, sentado em um banco feito artesanalmente de pedra, estava o velho carteiro em seu merecido descanso depois de anos e anos trabalhados.
Fora jovem um dia, tivera a destreza de um gato, muitas e muitas vezes conseguia na ultima hora fugir da carga de chumbo com sal disparada pelo Seo Juca, o dono do imenso pomar, três quadras acima da sua casa, fora um bom ladrão de frutas, era lépido, subia e descia cercas rápido como uma lebre...
Mas o tempo passara, e hoje... Bem, hoje estava ali descansando e lembrando os bons tempos.
Ali onde estava era um bom lugar e muitos vinham conversar com ele, contar suas histórias e ouvir as dele, eram histórias impressionantes, algumas iguais outras totalmente diferentes, algumas tragédias, alguns idílios, e foi exatamente ali naquele banco de pedra que reconheceu um velho amigo seu...
A bruma trazia a tarde, mas ele não sentia saudade, talvez em algum tempo em sua juventude tenha sentido amor, ternura por alguém ou algo, agora não, o único sentimento que tinha em si era a paz, a paz de quem cumpriu sua missão...
E quase sempre nos últimos momentos antes de se recolher, aparecia o amigo que ele fez, e inevitavelmente ouvia como novidades as velhas histórias do amigo, e este pacientemente ouvia as dele, ao final daqueles momentos de enlevo em suas recordações abraçavam-se, mas não sem antes ouvir repetidamente a cada dia a mesma e ultima historia do dia...
Aliás, ele sempre fazia questão de que o amigo repetisse aquele momento fatídico...
Era uma sexta feira eram as ultimas correspondências a serem entregues...
Ele dobrando a rua, com sua bolsa de correspondências, e por sobre um muro baixo, 3 cães raivosos lançando-se ao mesmo tempo... Os gritos desesperados do dono dos cães que esqueceu o canil aberto... Os trancos terríveis das mandíbulas dos cães a subtrair-lhe as carnes, quebrando os seus ossos, arrancando-lhe, nariz, olhos, fazendo jorrar de seu abdômen o sangue quente que lhe ensopou o corpo aos farrapos, a vertigem companheira da morte em sua chegada, a escuridão, a quase ausência de vida... E por ultimo som ouvido, os passos de seu amigo, um policial, se aproximando, sacando seu revolver do coldre, matando, um, dois, os três cães, descarregando sua arma... O dono dos cães aproximando-se com uma espingarda de chumbo, encostando a arma na cabeça do seu amigo policial e disparando...
Os dias no paraíso são assim... Memórias sem ódio e nem rancor... Será ???
 
Malgaxe
Malgaxe
Enviado por Malgaxe em 24/02/2011
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