“Medo de Nada”

          Seu Candinho era um valente. Já tinha lutado contra Onça, Cateto, Lobisomem, enfim tudo que era vivente, já havia apanhado de cabo de seu relho. Na venda após tomar uma da terra, ficava pior. Em um dia qualquer surgiu uma novidade. Lá no sítio da Anta, da viúva D. Gertrudes, apareceu uma mula sem cabeça. Todos de comum acordo resolveram nomeá-lo “defensor da pátria” e o pobre homem se viu obrigado a virar caçador de mula sem cabeça. Cá entre nós seu Candinho, era é um tremendo mentiroso. Aquele que só é valente depois que a briga termina. Mas a situação agora era, correr e perder toda a fama de valente adquirida e a de covarde. Era melhor morrer na empreitada. Sua barriga desandou, se tornou o famoso “caga nas pernas”. -Vou lá, mas estou meio adoentado, assim que der uma melhoradinha. Como não havia saída marcou para ir ao malfadado sítio em uma sexta feira. Esperou algo ou acontecimento que atrapalhasse a caçada à mula sem cabeça, mas nada aconteceu. Pior, tinha gente querendo assistir a peleja. - Só não quero ninguém por perto para não bater com meu relho em gente inocente. Tentou várias vezes tomar um atalho, e sair dali, mas sempre tinha alguém acenando para ele. No sítio da viúva, fez uma patrulha, parecia cachorro em terra estranha só que não mijava, cagava de moita em moita. De repente ouviu um barulho estranho. Seu medo foi tão grande que se alçou a um alto galho de mangueira. A mula, ou diabo sei lá o que existia mesmo ele viu e só não morreu porque não conseguiu. Sua tremedeira era tanta que se desprendeu dos galhos da arvore e caiu. Acho que Deus protege os cavardes. O safado do velho caiu exatamente em cima do lombo do bicho. A mula assustada batia os cascos nas pedras e saiam faíscas. Seu grito desesperado foi confundido por valentia e a mente fantasiosa dos espectadores fabricou a sena. Conta a história que o herói foi buscar o bicho. Lá chegando encontrou a mula sem cabeça, imediatamente, pulou em seu dorso e galopou pelas estradinhas de cascalho até fazê-la mergulhar no rio literalmente domada. Mas a satânica criatura roubou a voz do herói que nunca mais pode falar. Nós sabemos que de tanto gritar desesperado estourou suas cordas vocais.
Crime e Castigo.
O maior crime do mentiroso é fantasiar seus feitos.
E o castigo quando tem todo mundo de testemunha não poder contar e aumentar um pouquinho, pois não tem voz.
Ah! A mula sem cabeça nunca mais apareceu.
Também se aparecesse, ainda que sem voz, iria encontrar seu Quinzinho e seu chicote para domá-la.

Histórias que o povo conta.

Oripê Machado.
Oripê Machado
Enviado por Oripê Machado em 11/01/2012
Reeditado em 24/01/2012
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