A passagem

A enseada se abria sinistra depois daquela mata, a cidade ficara há 30 minutos, George e sua namorada já sentiam os pneus de sua caminhonete afundar e erguer-se na areia fofa deixaram a pouco o asfalto e deslizavam com os olhos fixos naquela imagem a uns 500 metros, entre a maresia espessa.
Lentamente se aproximavam da imagem pela estradinha, até que estacionaram a uns 30 metros daquela embarcação encalhada a 10 metros da linha d‘água envolta já em alguns arbustos devido à longa exposição.
O abandono era visível, seu mastro alto e deteriorado, ia e vinha com a brisa, embandeirando trapos que antes eram velas brancas e majestosas, a cor negra brilhante tinha o lúgubre dos mausoléus e os sons metálicos de sua estrutura gritavam tenebrosas como gemidos saídos dos infernos.
Entreolharam-se, terminaram o baseado e aos risos concordaram que iam explorar o barco sinistro que tinha uma carranca havaiana e a espinha de um enorme espadarte em diagonal no convés, como se ali tivesse ele feito seu tumulo sobre a escura madeira antiga.
Causava arrepios os primeiros passos depois da escada de acesso, o ranger envolvia, vibravam nas carnes dos jovens, esmorecia os músculos, confundia a mente, a sensação era de abordar outra dimensão, voar para outros mundos sob as asas da própria podridão dos tempos.
Olhares esbugalhados miraram a pequena porta para o interior do barco, e vagarosamente adentraram indo para o desconhecido, entorpecidos pela droga e pelo desejo insano de descobrir o segredo daquele portal do além...
O perfume... O odor de pinho escandinavo enchia o interior do barco, estranhamente iluminado por uma maresia fina, que ao esvoaçar mostrava as portas das cabines com um verniz enegrecido e um silencio preocupante... Vez ou outra um rangido percorria o profundo do mar e chegava aos ouvidos dos dois aventureiros, o suor gelado mostrava a espera angustiante...
Pelo balançar do velho barco sabiam estar sobre as águas, depois dos corredores a luz penetrava por duas ventarolas, cada um a seu tempo esticaram o olhar para fora, para o subir e descer do mar da enseada...Um estrondo enorme fez o barco ir adernando, jogando os dois exploradores ao chão.
Os desesperos, gritos ensandecidos de horror, viram abrir entre eles e a ultima porta um buraco de 5 metros de diâmetro, e fazendo água, a embarcação miseravelmente ia a pique com os dois indesejáveis visitantes...
Devagar os gritos iam ficando mais fracos, a medida que o inferno mostrava sua face, e já com a água pelo pescoço, prestes a receber o teto da cabine sobre suas cabeças, a água se fez rubra, os corpos dos dois foram jogados para lá e para cá, num festim diabólico de pelo menos 6 tubarões martelo, que pareciam se divertir enquanto despedaçavam tenebrosamente o casal, que infelizmente foram visitar o portal do inferno...
A madeira podre do barco em anos de exposição a intempéries, ágora jaziam pedaços de seres humanos a 10 metros de profundidade, num perfeito jazigo aquático rodeado de peixes famintos...
A tarde caía serena, enquanto num canto da enseada, se via a ponta de um mastro na linha d‘água, e nele inexplicavelmente, como num ultimo pedido de socorro, os ossos entrelaçados de uma mão humana...
Quem saberá em que lugar fica o portal que o levará para a eternidade...?
 
Malgaxe
 
 
 
 

Malgaxe
Enviado por Malgaxe em 07/03/2012
Reeditado em 07/03/2012
Código do texto: T3540237
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