Um jovem sacrifício

- Tenho pena do senhor. – disse a bela jovem Larissa, olhando para o velho sentado próximo a ela.

- Pena? Por que minha querida? – respondeu o septuagenário Raimundo Olegário com um ar bondoso.

- Pena de o senhor morar nesta casa, sozinho, sem ter ninguém – disse a jovem olhando ao redor – Sente muitas saudades da sua esposa?

- Sim, com certeza, minha mulher era muito boa para mim. Sinto falta da minha senhora – disse com um ar brincalhão, lembrando que a esposa havia morrido a pouco mais de um ano, aparentemente de um acidente doméstico em que quebrou o pescoço. Desde então a sua sobrinha neta havia assumido a responsabilidade de cuidar do idoso, algo que fazia de coração, de forma desinteressada, como há muito não se via.

Larissa era uma bela jovem de 20 anos, dedicava alguns dias na semana para ir a casa do tio-avô de quem gostava muito. Como não tinha conhecido os avós maternos, o havia adotado como avô, sua mãe sentia muito orgulho da filha. Quando ia até a grande casa de Raimundo Olegário, sempre levava uma refeição, ou assumia algum afazer doméstico, o que deixava o idoso aparentemente feliz. Não recebia muitas visitas.

- Mas não quero que você se preocupe com isso, sua presença já me deixa muito feliz – respondeu Seu Raimundo sempre mantendo um ar calmo e de simpatia.

Larissa terminava de lavar a pouca louça que havia sobre a pia da cozinha, era 18h00. Ao terminar se virou para o seu Raimundo e anunciou a sua partida.

- Amanhã venho novamente para ver o que mais posso fazer. Também trarei uma comidinha – disse toda feliz.

- Você sempre muito bondosa, mas não se preocupe tanto com este velho.

- Me dói vê-lo sempre tão sozinho. Tchau, vô Raimundo! – disse enquanto saia.

- Até logo minha filha.

Quando Larissa foi ouvida cruzar a porta da frente e em seguida o portão, uma criatura de aspecto medonho emergiu do escuro do quarto cuja porta dava para a cozinha.

- É você? – disse Olegário adotando um tom de voz frio e duro.

- Muito prestativa essa criança – respondeu a criatura que tinha observado a conversa. Tinha pele escamosa, negra e viscosa. Os dentes caninos eram protuberantes e saiam por entre os lábios grossos e escuros. As orelhas pontudas davam um aspecto grotesco à cabeça desprovida de couro cabeludo. Os olhos eram brancos como a neve, sem pupilas – Será um ótimo sacrifício – concluiu satisfeito.

- Sim, será! – respondeu o idoso com uma expressão séria.

- Você foi monstruoso em oferecer a sua esposa como sacrifício, lembro dos olhos de terror que ela esboçou, e como pediu misericórdia – deu um sorriso áspero e medonho – Será que esta jovem fará o mesmo?

- Saberemos apenas quando acontecer.

- O que as pessoas não fazem por longevidade? Sacrificando membros de sua própria família para viver mais, que coisa feia Raimundo Olegário. Com o primeiro sacrifício a sua saúde melhorou, com mais esse, seu aspecto ficará mais jovem, mas é preciso mais, sempre mais, e logo.

- Faremos amanhã, quando ela vier me ver novamente – respondeu Raimundo com uma voz malévola – depois disso terei de ir embora para longe se não começarão a suspeitar.

No dia seguinte, às 18h30min, Larissa deixava a casa da mãe, anunciando que ia visitar o tio-avô.

FIM.