Meu medo da lua

Desculpe não ter dado notícias nestes últimos cinco anos meu amigo, mas não estou em boas condições para escrever e aqui te contarei algo que não revelei a mais ninguém.

É Lua cheia esta noite. E eu aqui, recolhido na cama sob os lençóis e atento a qualquer barulho. Apenas a luz pálida daquela lua lá no céu ilumina o piso de meu quarto através da janela entreaberta. O som do silêncio não me acalma, pois qualquer barulho vindo de fora me enche de desespero. As sombras que passam na janela cada vez mais me fazem confundir a realidade.

Odeio noites como esta. É como viver um pesadelo! Não consigo dormir até que o Sol tome seu lugar. Imagino mil coisas na noite. Criaturas, lendas, terrores, todos vivos e reais, vagando por aí, andando no meu telhado e em minha sala. Criaturas que me observam de longe e me seguem toda a noite, só a luz do dia os fazem desistir da perseguição.

E continua sendo assim, desde que li aquele livro velho na biblioteca de meu pai cinco anos atrás. Um livro feio, com capa de couro e reforçado com metal nas dobraduras. Um livro que ele encontrou em um sítio arqueológico no coração da selva amazônica.

Era o Necronomicon! Uma das cópias do livro proibido de Abdul Alhazred, o árabe louco.

Por que fui ler aquilo? Não sei dizer, meus olhos apenas seguiram minhas mãos, que abriam a terrível obra como que por vontade própria.

O volume falava da lua e do que ela trás consigo. Jamais acreditei naquelas palavras sobre deuses antigos que vivem na lua e se alimentam de nossos pesadelos, eu não podia estar mais enganado. Meus maiores medos e temores saíram daquelas páginas escritas em vermelho sangue. Nunca imaginei que as lendas que o livro continha era na verdade um encanto mágico para trazer ao nosso mundo tais criaturas. Eu li todo o encanto em voz alta, palavras que eu desconheço, e o simples fato de falar fazia minha língua queimar e minha voz ficar fraca, porém eu li tudo.

Fui tolo! Devia ter parado minha leitura, mas não consegui!

Libertei algo naquela noite de lua cheia. Uma coisa de asas, presas e muitos olhos. A coisa surgiu das sombras de meu quarto, deixou um forte cheiro fétido e no chão uma marca circular com símbolos e frases na língua do livro. A criatura me atacou, eu reagi, mas me arranhou o braço e fugiu em direção à lua. Desde então eu a vejo nos dias de lua cheia, ela aparece sempre que a lua está amarela no céu e se mostra enorme. Posso ver a criatura voando ao redor da lua, como um inseto em uma lâmpada.

Tenho pesadelos com aquilo todas as noites.

Sempre me vejo fugindo da lua. Sempre estou sendo perseguido pela sua luz e ao ser iluminado a criatura sai das sombras e me agarra. Com um rápido movimento de sua cauda afiada tenho a cabeça decepada, mas não sinto dor em minha morte. Acordo tremendo, palpitando e suando frio. Com uma estranha marca vermelha no pescoço e a cicatriz em meu braço ardendo.

Quando eu acordo posso vê-la da minha janela. Parece que zomba de mim, como se me avisasse de um destino terrível, como se esperasse sua hora todas as noites para aparecer.

Por isso tenho medo dela quando está cheia. A luz invade meu quarto mais forte, chega muito próximo de minha cama, bem próximo de mim.

E os pesadelos são ainda mais terríveis em noites como a de hoje. A criatura me espera pacientemente nas sombras, até que eu seja iluminado pela lua e morto pelo rápido golpe de seu ferrão em forma de foice.

Tenho que acabar com isso. Vou pôr um fim a esse pesadelo!

Não há outro modo de me livrar dessa maldição. Tenho que sumir de vez. Vou me entregar e me livrar dessa tormenta! Já queimei o livro, mas isso não trouxe alívio algum. Só me resta um final covarde.

Devo partir, meu amigo, e não me arrependo. Passei muitos anos sendo perseguido por ela. Creio que não tenho muito tempo. Serei pego um dia ou morrerei fugindo da noite.

Chamas se acendem no ocidente com o Sol que se põe e a foice de prata vem todas as noites por mim. É a lua e o que ela traz consigo. Eu me despeço de você amigo. Vou para onde a lua não me encontre nunca mais.

A luz da lua está bem próxima de mim agora, é quase meia noite, vou deixar a carta onde possam achar facilmente.

Adeus.

E jamais olhe para a lua novamente.

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Minha pequena homenagem à Howard Phillips Lovecraft.

“Que os ventos de R’ylieh espalhem teus sonhos e nem mesmo as paredes de Arkham mantenham o medo longe dos que te conheceram como pai do horror cósmico, e o Cthulhu devorará tua estrela quando despertar de seu sono”.

Juan Pedro
Enviado por Juan Pedro em 24/07/2012
Reeditado em 03/08/2012
Código do texto: T3795318
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