CONTO MACABRO

Levo uma vida atormentada por lembranças. Às vezes não entendo a razão de certas coisas. Por que quis Deus que nos anos de minha juventude eu passasse por tantas situações difíceis e até mesmo cruéis? Os seres humanos podem ser loucos e, pior, podem ser monstros. Daí é que surgem os casos de arrepiar. Tudo pode acontecer, tudo, até o que jamais foi imaginado. Digo isso porque sei o que pouca gente sabe. Sim, são muitas histórias, mas vou hoje contar apenas uma, dirigida a crentes e céticos, pois muitos dos que lerem estas páginas certamente acharão que tais fatos não passam de pura imaginação.

Foi há muitos anos. Numa imensa área verde de outro estado onde eu morava, que hoje é parque de preservação, eu era um dos encarregados da guarda florestal. Verdade mesmo é que a maior parte do tempo eu ficava nas proximidades do local usado como acampamento por muita gente que vinha de longe, de grandes cidades, para desfrutar alguns dias em melhor contato com a natureza. Havia água encanada e luz elétrica, o que facilitava a vida dos praticantes do camping. Mais adiante, cerca de três quilômetros já dentro do mato cerrado, havia antes outra área onde se armavam as barracas, mas a água era de uma nascente natural, e nada de luz elétrica. Tal local acabou sendo proibido por ser perigoso. E uma de minhas atribuições era dissuadir qualquer pessoa que pensasse em ir para lá.

Naqueles dias, a polícia andava à procura de um assassino muito perigoso. Chamava-se João Boca Braba. Eu havia visto sua foto no jornal, pois o tal bandido já estivera preso. Porém, esperto como era, conseguiu fugir. Ele conhecia como ninguém a imensidão daquela floresta, pois criou-se por ali mesmo, sempre à solta. Daí a dificuldade em encontrá-lo. Jamais fora à escola, de sua família nada se sabia, mas sabia-se que mantinha contato com bandidos e traficantes de drogas daquela região.

Agora seus crimes. Por encomenda, matava homens de quadrilhas rivais. Não apenas matava, mas por requinte de crueldade tinha o costume de decapitar suas vítimas. Em seguida, cortava com o facão a ponta de um galho de alguma pequena árvore próxima, e sendo esse galho vertical, ali fincava a cabeça do decapitado. Estupros também eram sua especialidade. Nas proximidades de morros, onde havia favelas, vários crimes foram a ele atribuídos. Porém, enquanto que o psicopata comum trava relação sexual com a mulher e depois a mata, ele, o João, fazia o contrário. Matava a mulher, depois satisfazia-se sexualmente com o cadáver ainda quente. Fez isso muitas vezes e era provavelmente o que mais lhe dava prazer. Dois ou três desses atos aconteceram naquela área que antes era apropriada ao camping e que acabou sendo proibida.

Era pleno verão, muita gente vinha com suas barracas e mochilas para acampar. Eu procurava conhecer a todos, perguntava de onde vinham e quantos dias pensavam em ficar ali. Dava a todos as orientações necessárias para que não esquecessem as normas a que deveriam obedecer.

Então, num inesquecível sábado de manhã, travei conhecimento com um casal de jovens que vinha de longe. Eram bem simpáticos os dois. Ela, moça loura de cabelos longos, moça lindíssima. Ele, rapaz atlético que fazia musculação e outros esportes. Já acampados, vieram procurar-me dizendo que há anos estiveram ali, naquela parte bem mais dentro do mato. O que eles queriam mesmo era acampar naquele local do qual eles bem se lembravam, e ficar os dois lá sozinhos. Logo tratei de tirar tal ideia de suas cabeças, definitivamente disse que não, não era permitido. Por fim, entenderam e acabaram concordando com a proibição.

O dia transcorria normalmente quando, horas depois, pelo meio da tarde, percebi que não mais via o casal que antes chamava minha atenção. Procurei os jovens por todos os lados, e nada, embora a barraca deles ainda estivesse armada, com todas as coisas. Lembrei-me então de nossa conversa pela manhã. Provavelmente entraram no mato e foram ver como estava aquela área que tanto lhes interessava. Senti-me incomodado com esse pensamento e não tive outro recurso senão ir atrás dos dois. Meu grande erro foi não ter levado um revólver comigo, pois com ele eu poderia ter salvo uma vida.

Apressei o passo como pude. Cerca de dois quilômetros lá adiante, meu primeiro choque. O rapaz estava caído no caminho, morto com um tiro. Nada pude fazer, a não ser ir em frente, ainda mais rápido. Mais alguns minutos e bem lá em frente vi um mulato alto levando pelo braço a moça loura, obrigando-a a ir com ele. Conhecendo bem o local, resolvi contornar o caminho para chegar antes deles à nascente do rio. Corri o mais que pude.

Cheguei e escondi-me na vegetação cerrada. Logo eles chegaram, a moça ofegante, cansada, implorando desesperada. O rapaz, parecendo-me ser o tal João Boca Braba, não perdeu muito tempo. Nervoso com tanto choro, puxou uma faca e enfiou-a no pescoço da jovem. Ela caiu de imediato. Eu estava trêmulo de raiva e desespero, mas o que poderia fazer? O maldito tinha uma arma de fogo consigo e certamente me mataria ao ver-me. Fiquei quieto. Também ele estava quieto, de pé, com a faca na mão, olhando a moça, provavelmente já morta. Abaixou-se então e cortou o pescoço dela, separando a cabeça do corpo. Até então o costume dele era decapitar apenas homens, não mulheres. Mas como não pode fazer isso com o rapaz que matara no caminho, para compensar acabou praticando tal ato com a moça.

E agora o que aconteceu? Ele abriu sua calça, tirou o órgão sexual para fora, pegou com duas mãos a cabeça da moça, e com ela tratou de satisfazer-se, enfiando o pênis na boca da jovem morta. Fez isso por uns dois ou três minutos. Não conseguindo dessa maneira atingir seu orgasmo, pendurou a cabeça num galho próximo, atando-a por duas mechas de cabelos. Cabelos louros, vermelhos de sangue. Em seguida, voltou-se para o corpo, abaixou-se, despiu-o inteiramente. Aí transou com a moça morta sem cabeça e saciou-se sexualmente como era seu costume.

A tarde ia chegando ao fim, o céu escurecia e mudava. Uma tempestade se anunciava. Com tudo consumado, o monstro foi-se embora do local de seu último crime. Último, porque três dias depois foi encontrado e morto pela polícia.

Saí de onde estava para ir embora. Raios rasgavam o céu enegrecido. Ao afastar-me, arrisquei um último olhar para aqueles restos mortais, a cabeça pendurada e o corpo no chão. Foi quando um forte relâmpago iluminou o local e eu vi o corpo se mexendo, parecendo querer levantar-se, ao mesmo tempo que a cabeça abria os olhos, e a boca também se abria num desespero total. Mais apavorado do que já estava, fui correndo embora pela escuridão da mata.

No dia seguinte, os dois jovens mortos foram recolhidos, trasladados e sepultados na cidade de onde vieram. Descansem em paz.

Egon Werner
Enviado por Egon Werner em 12/08/2012
Reeditado em 02/09/2023
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