Excentrico...

Admirando a linda imagem, perfeição feita em tinta óleo, suspirava, estava em paz, com o mesmo desejo de sempre: se esconder na paz dos olhos da moça da pintura.

Solteiro, tímido e sóbrio, tinha amigos em um numero tão pequeno que nem enchia uma mão, era um solitário. Deitado no sofá assistia filmes em preto e branco, era apenas uma caricatura obscura de uma personagem anacrônica, era ultrapassado por natureza, como se fosse apenas um bonequinho situado na historia errada.

Como um bufão solitário se esgueirava com tristeza nos olhos, sem amor, sem vida, apenas cheio de sonhos. Era incrível como escritor, conhecia o humano a fundo, apesar de temer o contato.

Comprara o quadro em uma feira, a moça que vendia usava roupas estranhas, tinha algo de árabe em suas feições e modos, recatada ao extremo mal levantara os olhos no momento da compra, talvez por saber do poder daqueles olhos, que se encontraram com os dele por acaso, enquanto observava-o entrando dentro da tela foi surpreendida com os olhos que se levantaram ainda hipnotizados tocando os dela, trazendo consigo um tremor e uma sensação de calor intensa. Não sabia ainda se sua paixão era pela figura do quadro ou pela vendedora, tinha sempre a estranha sensação de serem as duas partes de uma mesma coisa, partes daquela fantasia doentia que sempre o embalava com promessas de paz.

Voltando do trabalho, era sexta-feira, não estava cansado, estranho ter sempre seus ânimos restaurados naquele dia, talvez por saber que sua pior tortura teria uma pequena pausa, que era a convivência com os colegas de trabalho.

Enquanto abria a porta ouviu passos de dentro, acendendo a luz buscou com os olhos alguém, sendo a casa bem pequena podia ver quase tudo dali, foi caminhando em direção ao quarto, olhando pelos cantos, não tinha medo, afinal, que ladrão não teria notado de cara que suas posses eram mínimas? Olhando de canto de olhos para o quadro teve a sensação de este estar vazio, virando bruscamente com o coração disparado viu que tinha sido apenas uma impressão, aliviado ficou ainda observando aquela linda face.

Deitou para dormir, o abajur ainda ligado deixava todas as sombras macabras, respirou fundo, tentando relaxar, quando adormeceu ainda podia ouvir o som dos carros ao fundo, a cidade começava a se embebedar pelas esquinas.

Ela veio devagar, trazendo a escuridão onírica a suas costas, desejou inconscientemente que ela fosse embora, mas quando foi levado ao êxtase sob o corpo daquela figura tão desejada perdeu a alma, a sanidade e principalmente a liberdade, se tornou escravo dela.

-Quero sangue!- a voz doce sussurrou.

Chegando 1 hora depois, jogando a moça inconsciente no chão começou a esquartejá-la, ela ainda estava viva, assim a cada corte o sangue jorrava. Colheu em uma vasilha. Quando os olhos da moça se abriram, ela tinha certamente pouco tempo de vida, não gritou, apenas acendeu em seus olhos o mais profundo pavor, como em um animal, não importava, na verdade nunca importou, só queria agradar a única que merecia sua adoração.

O sangue, que tinha um vermelho escuro, foi deixado diante do quadro, podia jurar que ela lhe sorria agradecida. Deitou novamente, quando acordou pela manhã não se assustou com o corpo, perdera totalmente o senso, recolhendo o recipiente totalmente vazio foi em direção a seu trabalho.

Voltando para casa, viu de longe luzes, ouvindo sirenes, depois de dois dias o corpo já não tinha um cheiro muito agradável, provavelmente incomodara os vizinhos, que tentaram resolver chamando a policia.. Escondido atrás de uma cerca esperou que a guarda diminuísse, trazia em seu bolso uma pequena quantidade sangue, precisava ofertar à sua deusa. Quando entrou pela porta dos fundos com passos de gato foi até o quadro, agora podia afirmar com certeza a moça não estava lá. Olhando ao redor com pavor buscava o objeto de sua veneração, vendo-a se aproximando com lentidão em direção ao guarda que vigiava a porta presenciou algo incrível, ele foi dilacerado com um golpe, as unhas afiadas que adornavam aquelas mãos delicadas eram de um negro funesto. Rindo com uma gargalhada profunda fechou os olhos, sua deusa era cruel, e isso era um deleite!

Sentindo mãos envolvendo seu corpo abriu os olhos, eram outros guardas que estavam do lado de fora, vendo suas próprias mãos ensangüentadas não entendeu, com os olhos esbugalhados viu debaixo de suas unhas pele, as mãos ainda fechadas seguravam as orelhas do guarda, não importava o crime, o pecado, o erro que fosse tal ato, estava cheio de orgulho por matar em nome de sua adorada! Se desvencilhando dos guardas, com uma força sobrenatural correu, indo em direção ao quadro oferecendo o sangue das mãos entrou para dentro do quadro, buscando então seu tão esperado céu. Correndo na tentativa de agarrar o assassino ficaram estáticos, no chão, desacordada encontraram apenas uma moça, linda, de unhas negras, e apesar de desfalecida trazia um sorriso nos lábios. Não notaram a expressão de horror do homem na pintura....

T Sophie
Enviado por T Sophie em 18/02/2007
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