A Casa do Morro Uivante - III

No culto, o pastor, senhor Linghton abordou à questão da vida após a morte, citando o encontro de Jesus com Moisés e Elias no monte Talbor; falou a respeito do despertar de todos para ter uma vida postada na retidão, na honestidade, na bondade, na valorização da família e dos bons costumes. Os irmãos Antonelli foram citados como os convidados da noite, após uma salva de palmas. Adelle e Luccio se sentiram importantes na quele momento - todos se abraçaram. O terceiro convidado era um rico homem do ramo da madeira, colaborador costumaz da igreja, doando altas somas em dinheiro. Ocorreu uma confraternização regado a petiscos e suco de uva - simbolizando este o sangue de Jesus. Luccio trocou olhares com a jovem filha do pastor, Adelle trocava algumas palavras com um senhor viúvo, tinha quase o dobro de sua idade, o sr. Paul Luccy, proprietário de uma madeireira.

Chegaram á residência que despontava imponente na elevação rochosa, de carona na carruagem do rico proprietário do ramo de madeira.

- Tenham uma boa-noite.

Disse sr. Paul Luccy - parecia encantado com a linda donzela nos seus pouco mais de 17 anos de idade. Ele tinha 34, e ja era um homem rico, com mais de 80 lenhadores á seu serviço. Pouco vinha na cidade, cuidava de tirar a madeira e encaminhá-la pelo rio para o grande centro do comércio profícuo de madeira na região. Vivia numa cabana na floresta.

- Obrigada, bom saber que um homem tão rico como o senhor é temente á Deus.

Disse, Adelle, encantada com a sua presença, e disposição em serví-los.

-Vocês moram na Casa do Morro Uivante...

Observou, com espanto.

- Sim, adquirimos a casa, recente.

- Minha nossa, conhecem a fama deste local?

- Sim, caso queira ver, estou dando o meu toque pessoal no local.

Com espanto, de todos, Adelle o conduziu ao cemitério. Era uma noite de lua cheia , de céu estrelado. As flores espalhados pelos túmulos iluminadas. Ficaram ali, com Adelle encantada com o lindo jardim que cobria os túmulos e lápides com farta vegetação. Quase não se podia ver as criptas. E, ali, dem dizer uma palavra, Adelle foi segura pelo braços, com força. O seu corpo foi arrastado para próximo do homem, que se vestia com fina elegância. Ficaram se olhando nos olhos, por alguns segundos, e ali, entre túmulos floridos, aconteceu o primeiro beijo de sua vida sob uma lua cheia imponente.

Luccio, ao longe observava com preocupação, os dois corpos colados na penumbra da vegetação. Não sabia se tomava uma atitude severa, ou se aguardava o desfecho daquele momento. O beijo foi prolongado.

Adelle se soltou dele e sem o cumprimentar saiu correndo na direção da porta de sua casa. Luccio se antecipou, entrando antes. Dentro de casa, Adelle fechou a porta, exibia um simulacro de sorriso na sua face. O coração em acelerada carreira, estava sem fôlego, por conta do beijo. havia sentido, pela primeira vez o toque ousado de homem, corpo a corpo e os lábios mornos esfregando-se contra os seus. Um beijo que a fez estremecer por dentro, algo lhe bolinou, deixando-a num estado de frenesi estonteante.

- Nossa, ele me beijou... minha nossa, e eu gostei, foi lindo ali, entre os túmulos floridos.

- Cuidado para não estar sendo vítima de um conquistador barato. Acha que um homem tão rico vai querer uma pobretona como esposa?

Observou o irmão, virando-se na poltrona.

Adelle se reservou, não lhe deu atenção, por tão deselegante observação. Espera o apoio e a solidariedade do seu irmão.

Foram para os seus quartos. A noite seguia, as horas pareciam não passar. Johnny Bells foi avistado com, dois comparsas no caminho da floresta. Passaram pela carruagem, andando de forma despretenciosa, o rico madeireiro estranhou a presença dos mesmo por ali, mas seguiu adiante, desaparecendo na curva, de vasta vegetação. Tinham uma garrafa de bebida que passava de mão em mão.

A lua cheia brilhava.

Luccio dormia a sono velado - Adelle estava ansiosa. Ter feito do cemitério um imenso jardim, maravilhoso - era como se assim colaborasse para afastar os maus fluídos e espantar os fantasmas do local, encaminhá-los para o mundo dos mortos. De forma mecânica, subiu ate ao sótão, dali podia ver os túmulos cobertos pelas flores e uma variada gama de plantas rasteiras, viçosas. Pôde ver o vôo ligeiro de uma coruja que pousava de lápide em lápide, como se procurasse a refeição da noite, roedores que ali habitavam. As árvores de galhos retorcidos, desprovidas de folhagem ja davam sinais de vida com pequenos brotos verdes. Com espanto, Adelle, viu o inesperado: vultos esgueiravam-se por entre os túmulos, sombras vivas que se projetavam numa visão assustadora.

Num impulso único, fechou as cortinas, o coração quase saindo pela boca.

- Mas, meu Deus...o que é aquilo? Eu vi os mortos saindo dos túmulos, minha nossa...

Desceu a escadaria que dava acesso ao sótão, apressada, sem fazer ruído, apoiando-se no corrimão. Pegou da espingarda que ficava pendurada na parede do seu quarto. Chamou pelo irmão - este acordou sobressaltado. Não deu a mínima para o que lhe contara, voltou para a cama. Adelle andava de janela em janela, como se aguardasse - depois de meses na casa-, o início da maldição dos mortos que falam pela voz do vento.

Então, ouviu o sibilar do vento la fora - uma ventania que se chocava com a frente da casa, de forma violenta, a sacuidir as vidraças das janelas. Passos sorrateiros foram sentidos - pela amedrontada menina-, estes se aproximavam da porta de entrada, então o vento falou:

" Adelle abra a porta, eu quero entrar, abra a porta, sou eu Paul Luccy..."

Dizia a lenda da maldição: " quando o vento soprar a voz dos mortos, não abra a porta, mesmo que a voz lhe pareça familiar..."

Adelle tremia de medo - estava ali, agora frente a frente com a maldição da Casa do Morro Uivante - era real.

As suas carnes tremiam, de boca aberta, suando frio, apesar do calor daquela noite. Não conseguia proferir uma única palavra - era a voz perfeita do sr, Paul Luccy a chamá-la, de forma incessante:

" Adelle,Luccio abram a porta....sou eu Paul Luccy...rápido, abram a porta..."

O vento sussurrava - Adelle jamais tinha presenciado a sua ação, de forma tão dinâmica, chocando-se contra a casa. Seguiam-se os passos, de janela em janela, então, sentiu as pancadas frenéticas nas vidraças.

Adelle estava estática, sentindo o maior dos medos - nunca havia sentido tanto medo na sua vida, como naquele momento. Dirigiu-se para o quarto do irmão - este repousava tranquilo, alheio ao ocorrido. mais uma vez foi acordado, então Adelle, de forma mecânica soltou a voz que estava travada na sua gargante, falava de forma acelerada, com nervosismo.

- A maldição está acontecendo, ouço a voz dos mortos a me chamar...la na sala, batendo na porta, batendo nas janelas...

- O quê?

- A maldição Luccio, os mortos, eu...eu..vi da janela do sótão, os mortos me chamando, quer dizer, vi os mortos saindo das covas...depois vieram para aporta da casa e...me chamam, chamem pelo seu nome..e usa a voz do sr, paul...Luccy...os mortos, as vozes, o vento...o vento sopra na porta da casa...

Luccio pediu que se acalmasse e que falasse com calma. Deu-lhe um copo d'água - que foi sorvido num único gole. Adelle lhe relatou o ocorrido. Tremia feito vara verde, a espingarda largada no chão da sala. A casa em penumbra, iluminada pela luz de um candelabro com muitas velas.

Seguiram para a sala, andavam com cuidado, sem fazer ruídos. O vento soprava, então, vozes diferentes soavam:

" Viemos buscà-los...abram a porta...vamos levá-los para o inferno..."

Luccio lhe sussurrou, nos ouvidos: - so pode ser uma brincadeira.

Adelle nada falou, parecia acreditar mais na ação da maldição, temia pela sua vida. Luccio pegou a espingarda no chão da sala, e deu-a para a irmã, ela era boa de pontaria, segurava a outra espingarda. Com coragem disse:

- Eu vou abrir a porta, esteja preparada.

- Não, não abra a porta. Diz a lenda que se abrir a porta o mal nos leva para o inferno, caso não atendemos o seu chamado podem ir embora, surgindo após longa data, quem sabe.

- Bobagem, pode ser uma brincadeira, ou ladrões que tentam tirar proveito dessas histórias para nos amedrontar.

Luccio apagou as velas, deixando a sala ás escuras. Estavam agachados na sala. Então, a irmã se recordou que o sótão não oferecia segurança, qualquer um que se arriscasse poderia entrar pela casa escalando o caule frondoso da grande árvore que ali se localizava. Luccio não colocara grades nas janelas. O coração da menina sentiu um aperto, estavam expostos ao perigo.

La fora, as vozes dialogavam entre si:

" está morto?"

"Não, so o golpeei por trás, querendo posso furá-lo com a minha adaga."

" Amarre-o, eu trouxe pedaços de corda, não podemos cometer um crime desta natureza contra ele, é muito conhecido..."

As vozes eram sussurradas, ininteligíveis para os irmãos. Bateram mais vezes na porta, de forma insistente, pancadas fortes, podia se ouvir pequenos chutes dados na base da mesma, as vozes diziam:

" Abram a porta, sou eu Johnny Bells...preciso de ajuda...estou ferido...

fui assaltado....abram a porta..."

- Vou abrir a porta.

falou Luccio, com segurança.

- Não, por favor, Luccio, não abra, deixe chamar, segundo a maldição, quando não se abre a porta eles vão embora, caso abra a porta, seremos levados para o inferno.

Luccio sentiu uma forte pancada a golpeá-lo por trás, foi ao chão sem sentidos. Adelle soltou um pavoro grito de terror ao avistar na escuridão uma figura aterradora golpeando o irmão. Não teve tempo para atirar, uma mão forte segurou o cano da espingarda, e a menina foi jogada ao chão. Ficou ali, estática, tremendo de medo e soltando pavorosos gritos de terror, até sentir uma mão forte, poderosa sufocando-a, tirando a sua respiração. Suas pernas sacudiam-se, chocando-se contra o piso de madeira da casa, em busca do socorro providencial, contudo desfaleceu.

" Acenda as velas e abra a porta."

Falou uma das vozes, de fora da casa. A porta foi aberta. Entraram mais dois.

- Estão mortos?

- Não, acho que não, ela gritava feito uma louca- talvez, tenha quebrado o seu pescoço, apertei pra valer e desfaleceu. O outro recebeu um golpe na cabeça, caiu durinho, talvez, esteja morto, também.

Após longos minutos, a casa estava iluminada á luz de velas. Os candelabros foram sendo acesos, em todas as dependências da casa. Aos olhos dos invasores, ali estava um primor de casa, bem decorada. Podiam sentir o toque feminino de uma garota que tinha bom gosto.

- Vamos fazer um bom negócio.

- Sim, está uma maravilha.

- Eles não sabiam da maldição?

- Sim, sabiam, teimosos, não é nada bom duvidar da maldição da Casa do Morro Uivante.

( Continua)

Leônidas Grego
Enviado por Leônidas Grego em 06/10/2012
Reeditado em 06/10/2012
Código do texto: T3919184
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