O TATUADOR 3 – FINAL
 
 
            -Franco, que besteira você fez? – Denis conversava com o amigo na delegacia, sozinho, tinha pedido ao delegado a privacidade, já que Franco se recusava falar, talvez falaria com ele.
            -Prendi o diabo no saco, agora tudo acabou. Não haverá mais assassinatos – disse Franco sem olhar para o amigo.
            -Mas isso é trabalho da polícia – Denis estava nervoso, o delegado estava pressionado pelo secretário de segurança, o cara havia tatuado a filha do governador, Franco havia feito justiça com as próprias mãos, sem provas, mas com muita sede de vingança, Franco tinha prendido o tatuador, colocado numa cela e o deixou lá para morrer. Para Denis isso estava bom, mas para o delegado Lemos, queria que Denis desse conta do tatuador ou estaria suspenso por tempo indeterminado.
            -Já me entreguei a polícia, sou um criminoso agora– disse Franco acertando o boné na cabeça sem cabelo devido à quimioterapia. – Logo eu vou morrer de câncer, independente se me espanquem, ou me predam, não vão saber o paradeiro dele.
            -Franco, não foi ele que matou o Celso, temos o DNA de um figurão da Urca na cena do crime, um tal de Abel Prado. Tem que soltar o cara e deixar a lei fazer o seu trabalho. – Denis sussurrou no ouvido de Franco – sei que devo muito favor a você, a gente estava atrás do cara esse tempo todo, também quero esganar esse maldito tatuador, mas não foi ele quem matou o Celso, as coisas estão desmoronando aqui, o delegado vem para cima de mim, estou por um triz na polícia. Franco, me fala onde ele está, garanto se ele for culpado, coloco ele atrás das grades por um bom tempo.
            Franco teve uma crise de tosse, o sangue saiu em sua mão.
            -Denis, meu filho, só se combate o sobrenatural com o sobrenatural, o que está feito, está feito.
 
SEIS MESES ATRÁS
            Franco e o amigo Márcio localizaram o Tatuador em Teresópolis, era convidado do prefeito para uma festa local, estava andando livremente depois que o governador pessoalmente pediu para o secretario de segurança que deixasse o Tatuador em paz, não existia provas contra ele, à polícia agora estava pensando em outro criminoso, Abel Prado, o criminoso da carnificina.
 Seis homens, todos bons amigos de Franco, todos na faixa dos sessenta anos, experientes em suas funções, dois fuzileiros e dois sargentos do exército, Franco e Márcio, também, todos amigos e colegas de Celso, conseguiram cercar e prender o Tatuador,depois de matarem dois de seus seguranças, em Teresópolis, levaram, de helicóptero, para Campos, depois de avião, para o interior do Amazonas onde Franco tinha dois amigos pajés, índios feiticeiros, que já tinham mais de noventa anos cada um, com grande conhecimento de magia e dispostos a ajudar Franco.
A amizade de Franco com os índios ocorreu há mais de trinta anos, quando ele, então sargento, e quatro soldados do exército, trocaram tiros com traficantes de crianças e recuperaram doze crianças indígenas, inclusive o filho do pajé.  A amizade foi selada para sempre, um dos pajés deu um colar de contas de proteção para Franco e disse que no futuro ele teria uma luta contra o mal.
-O mau ronda você, ajudar criança, desafia espíritos das trevas, pegue o colar, no futuro voltaremos a conversar – disse o pajé, há trinta anos.
            -Usou as contas, com ela o mal perde força.
            -Isso não vai prejudicar a tribo – disse Franco.
            -A tribo é grata a Homem Da lua que trousse crianças de volta, meu filho agora é chefe e serei grato até o final da vida a Homem da lua – nome que Franco ganhou dos índios, por ainda novo, já ter cabelos brancos.
          - Nessas matas eu controlo o mundo dos espíritos, esse mal ficará preso aqui - disse o pajé tocando o ombro de Franco.
            -Obrigado amigo – disse Franco ao velho pajé.
            Franco teve uma infância difícil, o pai era um militar de carreia, chegava bêbado e batia em sua mãe, que para Franco era uma santa. Dois dias depois que Franco completou nove anos o pai sumiu, nunca mais voltou, pediu baixa e passou a trabalhar na marinha mercante, nunca mais viu o pai, sua mãe então teve que trabalhar como empregada doméstica. Depois que entrou no colégio Pedro Segundo, a mãe adoeceu, teve uma coisa que os médicos chamavam de surto esquizofrênico, Franco foi criado pela tia Maria, a mãe se atirou do oitavo andar, no mesmo dia que Franco recebia a patente de sargento, não foi uma vida fácil, sua primeira grande alegria foi Celso, como poderia perdoar?
           
            Prenderam o Tatuador em uma sela, feita por três feiticeiros indígenas.
            Para Franco o ódio foi o único sentimento que sobrou, depois que todos os seus amigos foram mortos de uma só vez. Liquidaram com sua única chance de felicidade.
            Logo chegaria a hora de Franco e estaria morto, agradeceu aos amigos, Márcio e os outros, todos conheciam Celso, estavam de luto.
            Para a polícia o DNA encontrado na carnificina era de outra pessoa, Abel Prado, os policiais estavam esperando uma ordem judicial para invadir a casa, que era uma fortaleza.
 
PRISÃO DE ABEL
            Denis, Neves, Medeiros e o delegado Alberto Lemos, estavam comandando a operação, apelidada por Medeiros de caça a abelha.
            -A ordem do secretario é não amaciar, ele deve ter trinta seguranças, alguns deles nem falam a nossa língua, são ucranianos e sérvios, estão ai dentro prontos para o que der e vier – disse o delegado Lemos, colocando a arma extra na cintura. Vamos! Cautela em Denis, o secretário quer esse puto vivo.
            Denis corria atrás de Abel, o homem era muito rápido, aquilo parecia interminável, Medeiros foi morto por um dos seguranças, e mais dois policiais militares estavam caídos no caminho, o local estava cercado por seguranças, o que tornava a coisa mais perigosa, Abel subia pelas escadas até o terraço, Denis escutou o barulho de helicóptero e falou pelo rádio comunicador.
            -Doutor é o helicóptero da PM?
            -Negativo, estão em um acidente na Avenida Brasil – disse o delegado Lemos.
            -Bandido riquinho filho da puta – disse Denis correndo o mais que podia. Abel, depois de matar dois de seus amigos, fugiria em um helicóptero? Que merda, se pudesse evitar, ele tombaria ali mesmo vivo ou morto, Denis parou de correr, pensou na frase de Lemos: ”o secretario quer ele vivo” e deu o primeiro tiro. Lemos que desculpasse, secretario que fosse a merda, Abel não sairia vivo, agora não importava mais, Denis acertou o pé, e Abel começou a mancar, mesmo assim chegaria ao helicóptero, Denis ficou de pé, com um vento forte, mesmo para sua pontaria, muito boa, aquele seria um tiro espetacular de quase vinte metros, naquele terraço gigante, um tiro difícil, se errasse o homem que matou Celso e seus amigos fugiria. Denis atirou, a bala acertou as costas do bandido, porém não foi suficiente para pará-lo, a constituição física de Abel era de atleta, do helicóptero, um homem segurando um rifle, acertou na perna de Denis que caiu deitado, sentindo uma dor intensa na perna. Denis disparou o seu último tiro, preciso, acertou a cabeça, bem na região occipital, fazendo com que o corpo do criminoso fosse projetado para frente e depois, cair sem vida com a face virada para o chão e a cabeça estourada pela bala calibre ponto quarenta de Denis. Lemos chegou ao terraço ferido no ombro direito.
            -Tudo bem? –perguntou ao Denis.
            -Vou viver, mas ele já era.
            Denis mancando e Lemos segurando o ombro, eles chegaram perto de Abel, o helicóptero vendo Abel caído fugiu.
            Denis abriu a camisa, a tatuagem estava lá, Abel tinha feito a troca com o tatuador, matar aquelas pessoas foi a sua parte no trato, isso estava claro, Abel havia cumprido a sua parte no acordo.
ENCONTRO COM LÍVIA EM CABO FRIO
            Denis quis se certificar que não era sonho dessa vez e deu dois tapas na face, a mulher linda dos seus sonhos estava bem a sua frente.
            Lívia parou perto da sua mesa no bar e disse.
            -Denis, isso tem que parar – disse com olhos cheios de lágrimas. – Não aquento mais essa perseguição, não vou te proteger mais, para mim, o que o Armando quiser fazer, não vou me intrometer.
            -O que eu fiz, é pecado o pai querer ver os filhos? Eu só quero ver meus filhos - disse Denis. Mas sabia que seu coração estava fora do ritmo, acelerado – o que o ‘almofadinha’ pode fazer?
            -Não vou voltar para você, não amo você como pensa, isso está só na sua cabeça, eu gosto da minha vida do jeito que ela está agora, meu marido é neurocirurgião, vamos morar na Holanda, estou adorando a ideia. Nossa relação não existe mais, Lívia e Denis acabou – ela enxugou as lágrimas. – Sua filha não quer ver você, o caçula não reconhece você como pai – Lívia fez uma pausa, nitidamente medindo as palavras.
            -Você não vai me dizer que eles estão chamando o “almofadinha“ de pai? – disse Denis e deu um soco na mesa de raiva, sempre o seu temperamento, sempre aquela raiva que Lívia não suportava.
            Lívia não respondeu, mas Denis já havia entendido.
            Derrubou os copos e pratos no chão, saiu sem olhar para trás, ouviu uma voz, “Denis preciso de você”, mas não era a voz Lívia, quem falava dentro da cabeça de Denis era o tatuador. O merda do ’almofadinha’ não perde por esperar.
 
ENCONTRO COM O RIVAL
            -Você é um fracassado, um peso na vida de Lívia, ela me contou do encontro de vocês, agora você vai conhecer a minha ira – disse o médico para Denis, os dois haviam se encontrado na frente da casa de Lívia. – Vou provar todas as merda que você fez e colocar você na cadeia, destituir a sua paternidade.
            -Quero falar com meus filhos – disse Denis sem levar em consideração o que o cara falava. Sentia uma vontade de acabar tudo ali, dois tiros na face e pronto, Lívia seria sua novamente. Alguma raiva profunda se apoderava dele, não como uma coisa externa, mas como um sentimento que sempre teve e estava ali, dentro dele, em algum lugar, uma ira, a voz do médico na sua cabeça, insultando e falando dos seus filhos como se fossem dele, o “almofadinha”. A dor de imaginar aquele corpo gordo por cima de Lívia, o suor e o fedor, a raiva, o ódio, às vezes esse é o único sentimento que sobra para um homem infeliz, sem amor e sem perdão.
            -Ela não está – disse sorrido – foi ao shopping Center, gastar o meu dinheiro. Mulheres gostam de gastar dinheiro.
          – Hipócrita preconceituoso, jamais entenderia Lívia, que estava com ele, só por um motivo: toda segurança que proporcionava aos seus filhos, a segurança que ela achava que Denis não poderia dar. O idiota nem conhecia a mulher com que dormia, nunca foi consumista, “ela nunca gostou de compras seu idiota” - pensou Denis.
            -Quero você bem longe dela – apontou para o segurança. – Igor, meu querido, tire esse lixo da minha frente.
            Denis empurrou o médico para frente, quando Igor tentou impedir ele acertou um tiro no pescoço, o homem gigante caiu instantaneamente, sua arma ficou presa na mão direita como um reflexo, Denis pegou e colocou na cintura, depois sentou o médico na cadeira, olhou para o segurança morto.
            -Ele me atacou primeiro – disse suando frio. – Sabe “almofadinha”, você me tirou tudo, mulher, filhos, agora me ameaça retirar o meu emprego, isso é muito perigoso, não devemos retirar essas coisas de um homem, pois ele pode se sentir um cão encurralado, ai o cão pode morder.
            -Dessa você não escapa, não tenho medo de você, é um covarde – falou o médico. Denis não queria ouvir mais aquele homem, acertou um tiro na cabeça, a bala entrou no osso parietal direito, a cabeça do médico pendeu mole para frente encostando o queixo no peito, morto, o ‘almofadinha ‘ era um problema a menos, Denis pegou o telefone e ligou, não havia mais lágrimas a derramar, estava feito.
            -Biriba, eu tenho um serviço para você.
            -Corpo de quem Denis? –disse Biriba no telefone.
            -Como corpo de quem Biriba, serviço é serviço – completou Denis.
Ninguém na região dos Lagos sabia se livrar de um corpo igual ao Biriba. Eram nove horas da noite, Denis saiu com o carro do médico, seus vidros negros fechados. Onde o médico e Lívia moravam em Saquarema era isolado e não havia vizinhos, Biriba queimou a casa, recolheu todas as fitas da segurança, e com dois dos seus homens pegou os cadáveres.
-Já arrumei o seu Álibi, você está com uma de minhas meninas na Barra da tijuca, vai pra lá que o cara vai arrumar uma filmagem com a hora do crime para você, coisa de primeira, mas fica sabendo vai te custar isso aqui, porra Denis, corneado por um gordinho? Tu tá de brincadeira, agora some daqui, depois eu te cobro.
            Na mídia tinham veiculado como assalto, dois milhões em dinheiro e joias haviam sido roubados.
            SONHO
            -Você está no meu sonho? – perguntou Denis ao Tatuador.
            -Vim fazer a mesma oferta, agora preciso mais de você que você de mim, estou morrendo. – Denis acordou sufocado. Muitas coisas ainda estavam em sua cabeça, ele precisava solucionar tudo aquilo, não havia mais tempo a perder.
            O TATUADOR
            O índio chegou para colocar a comida, o homem estava morto, mas no seu corpo não havia mais nenhuma tatuagem.
            O homem misterioso de camisa preta foi visto perto da gaiola onde o tatuador estava preso.
            FRANCO MORRE
            Duas da manhã, preso na delegacia, morreu Franco, sozinho, como temeu morrer e viver a vida inteira, o grande fantasma de Franco sempre foi à solidão.
            DEZ MESES DEPOIS DA MORTE DE FRANCO, NO BAR DA LAGOA.
 
            Denis está sentado e fumava um cigarro, sua cerveja estava do lado, um olhar mais triste, mais sério, amadurecido, diante das derrotas da vida e da perda do amigo, não estava verdadeiramente triste, apesar de que nada do que queria aconteceu, Lívia não voltou para ele, sumiu com os filhos, sem precisar da ajuda de ninguém, depois da morte do marido foi para a Holanda.
            Quando foi à casa de Franco, ele estava muito doente, quase nem falava mais, tinha uma enfermeira vinte e quatro horas, encontrou um mapa e alguns papéis, sabia que era a localização do Tatuador. Queria encontrar o Tatuador, queria conversar.
 Sua vida na policia estava quase acabada, Lemos seguia os passos firme do crime contra o médico, conhecia Alberto Lemos, um delegado de primeira linha, havia afastado Denis das investigações, era um bom policial, havia prendido Biriba, logo Denis seria preso, o que, para um policial, era uma sentença de morte.Não pensou muito, foi  atrás do Tatuador, preso junto aos índios, conversou com ele, estava muito debilitado,sua face ganhou uma tonalidade amarela, parecia não ter sangue no corpo, quase morto,as tatuagens pareciam vivas, Denis via movimento nas figuras, parecia que as figuras queriam fugir do corpo do Tatuador.
Ele queria que Denis fizesse uma coisa, uma troca.
Depois da conversa com o tatuador, Denis voltou para o rio, quando chegou ao rio, as acusações contra ele não existiam mais, poderia voltar para a policia.
            -Posso me sentar – Perguntou um jovem que aparentava ter vinte anos, com belos traços orientais.
            -Sempre terá um lugar perto de mim para uma mulher bonita.
            -Fiquei fascinada – disse ela sorrido, era realmente bonita.
            -Com o que?
            -Com suas belas tatuagens.
 
JJ DE SOUZA
Enviado por JJ DE SOUZA em 07/11/2012
Reeditado em 31/03/2013
Código do texto: T3973740
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