A Casa de um Morto

Passava dias, a contemplar aquela casa de terreno espaçoso, que ocupava luar privilegiado na avenida principal do bairro. Relações de vizinhos. Apenas o disse me disse, que faz a imaginação criar irônicas receitas sobre os hábitos alheios. O ônibus circulando, e eu pela janela, exposto em uma vitrine móvel com os olhos perdidos. Dia com ameaça de chuva e ponto vazio, quando uma figura de cor pálida se aproxima, somente com os cabelos de tom forte, contrastando com a imagem cinza do ambiente. O cruzar de olhares. Que diz mais do que as palavras tolas, que indicam a falta do que dizer. Talvez aquilo fosse um sorriso, quem sabe um espasmo labial. Poucas semanas e muitos encontros, logo estaria freqüentando aquela casa tão comentada.

E pensar que estudávamos na mesma escola. Mesmo com o argumento de que iríamos estudar, o pai, com aquele ar hitlerista, — típico de militares autoritários e provavelmente frustrados — observava-me com desdém, fazendo um sinal para que sempre mantivéssemos a porta do quarto escancarada. Vez ou outra alguém passava fingindo ser ao acaso. Com todo o aparato de vigilância que um lar paternalista oferece, pude tocar os pelos por baixo da calcinha daquela doce criatura, que adorava se excitar, oferecendo-se sem qualquer resistência. Fui para casa cheirando as mãos, com aquele aroma de boceta que me fez masturbar por uma noite.

Por falar em noite, em uma daquelas que a chuva desabava. Entrei na casa vizinha, com o auxílio de minha companheira de estudos. Me guiava com aqueles olhos azuis, feito pequenas lanternas. Chegamos na parte inferior da casa, havia deixado seu quarto fechado, os pais dormiam, o que era possível constatar pelo ronco que ecoava por toda a moradia. Sempre estranhara aquele cheiro de podre, vindo da casa, mas ali, naquele local inferior, parecia muito mais forte. Como ela parecia ignorar o fedor, fiz o mesmo, apenas penetrando aquela boceta apertada, apesar de saber, que havia sido bastante utilizada. A sensação do aperto em meu órgão, fazia com que eu acreditasse que era o primeiro, o que para o meu ego de macho, era um gozo extra. Creio que ela sabia a respeito disso, pois fazia questão de, a cada minuto, mencionar se eu sentia o quanto ela era apertada.

Gozamos tanto, por longo tempo, sob a vigilância do pai severo, que tinha o hábito de espancar a mulher, conforme a filha relatara. A mãe parecia sofrida, com uma expressão dura no rosto, aparentando bem mais idade do que dizia ter. tudo passava ligeiro por minha mente, quando veio a notícia da gravidez. Desesperados, apelamos para remédios abortivos. Ela desejava mais o aborto do que eu. Estivemos juntos no processo de expulsão, contando com alguma reserva de dinheiro para adquirir o remédio necessário. No mesmo solo onde fertilizamos, agora arrancávamos o fruto, abrindo em seguida o solo de terra, para enterrarmos o que havia expulsado. Não chamaria de feto, nem sei qual nome daria. Ao cavar, me deparei com outro corpo enterrado, mas agora de adulto, com um esqueleto inteiro. Agora compreendia o odor desagradável.

Os gritos da minha amante abortiva acordaram os pais. O homem chega até o local, encontra a filha de pernas abertas, comigo de joelhos em frente aquela cova mal feita. Me joga longe com socos e pontapés, enquanto a esposa cai ao lado da filha, acariciando seus cabelos. O pai comenta que ali, encontrava-se a verdadeira mãe da jovem, que após ter lhe traído e tentado dar fim a prova, que era o bebê em seu ventre, morrera abortando. Ele, enterra a esposa, com a ajuda da atual mulher, que na época era sua amante e empregada doméstica. Deixaram a culpa cair sobre o amante, que foi preso por ter sido o último a encontrar a desaparecida, que nunca mais foi vista, apesar dos apelos dos familiares e mobilização popular junto aos órgãos de imprensa. Sua filha fora levada pela mãe, transportada sedada a um hospital psiquiátrico, onde só sairia, quando se recuperasse do delírio em ter conhecido um amante na escola e ter abortado um filho dele.

Quanto a mim, fui enterrado vivo, junto ao cadáver da mulher abortiva e do quase feto abortado. Estamos os três aqui. A família se mudou, a casa foi colocada a venda. Não gritei até o momento. Primeiro por achar que é inútil, segundo por tentar poupar oxigênio. Mal consegui arrancar algumas pequenas lascas dessa madeira posta sobre nós. Sei que cimentaram por cima. Cavar é tolice, mas eu tento, os braços doem, as pernas estão dormentes. Acredito que tenha chegado a hora de gritar.

Bruno Azevedo
Enviado por Bruno Azevedo em 11/11/2012
Código do texto: T3980264
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