O Demônio Familiar VI

Ele estava feliz, bastante feliz. Ganhara presentes, muitos presentes. Voltar para casa era sempre bom e ele chegara lá, aconchegando-se em seu quarto e ouvindo de novo as histórias da babá, com toda felicidade. Estava tranqüilo agora e sorria quando via as sombras se mexendo no quarto, com aquela risada engraçada vindo da escuridão. Às vezes ouvia sussurros para que ficasse tranqüilo. Dormiria bem para sempre. Sempre seria feliz e tranqüilo.

Estava achando tudo divertido quando as risadas começaram a se distanciar. Não seguiam escada abaixo, mas somente seguindo até o final do corredor. Ficou preocupado. Desenrolou-se do cobertor com que a babá o cobrira com tanto cuidado. Tve um medo repentino de sair. Era por causa desse medo que saíra de casa e agora temia de novo. Ouvia as risadas no fim do corredor. Tremeu como nunca e sentiu um líquido quente correr entre suas pernas. Ficou com ainda mais medo e vergonha. Uma lágrima escorreu por seu rosto e lembranças repentinas de sofrimentos passados passaram por sal cabeça. A risada no corredor aumentou como se estivesse atenta às memórias sofridas.

Ele abriu a porta e correu pelo corredor gritando. Havia perdido o controle de novo. Aprendera a duas penas o que significava essa última frase. Aos dez anos, é difícil entender o que é manter o controle. Então ele correu chorando e esperando uma punição, mas também esperando um demônio.

Ouviu gritos sofridos vindo do quarto dos pais. Quando a porta se abriu, ele caiu de joelhos e cobriu a cabeça, só faltando chorar lágrimas de sangue. Urinou de medo mais uma vez. Só abriu os olhos quando a curiosidade infantil e a morbidez da alma humana o instigaram a ver o que acontecia.

Então o pai saiu correndo do quarto. Gritava envolvido pro arames farpados. Cada um deles era puxado, arrastando-se pela pele. Os espinhos metálicos haviam penetrado fundo na pele. Á medida que o homem corria, arrastavam-se rasgando os músculos, arrancando sangue. Um deles passou pela boca e se enganchou na língua. Arrancou metade dela enquanto dilacerava a bochecha, deixando dentes avermelhados de sangue à mostra.

O homem emitiu um grito gutural enquanto caía. Tombou ao lado do garoto e o arame foi puxando para dentro do quarto. Arrastou por sua barriga, fatiou o pênis e cortou as pernas até chegar aos pés. Travou em uma das unhas e um puxão a destruiu. O dedo menor foi arrancado e o homem gritando. Choramingou e estendeu a mão para o filho. Um arame ainda ficara preso no pé esquerdo.s eu espinho travou entre os ossos dos dedos e rasgou a pele até se prender a vários dedos e arranca-los durante um puxão.

O homem caiu cansado e então uma mulher saiu gritando o quarto. Ela caminhava gritando pisando em pregos. Pensou em fugir ajoelhada, mas quando começou a se prostar, os pregos apareceram magicamente em suas juntas e ela caiu sobre eles, sentindo que se enfiavam de um modo que nunca mais conseguiriam andar. Gritou e jogou as mãos para frente. Olhou para baixo para ver os pregos atravessando as mesmas. Rolou pelo chão gritando de dor.

A mulher rolou pela escada, com pregos aparecendo em cada parte do corpo destinada a bater no chão. No fim, vazava tanto sangue que mais parecia um saco furado. O homem resistiu por mais um tempo, pedindo ajuda ao filho. O menino grito desesperado e então correu, enquanto pai era vítima. Sua salvação era deixar aquele homem que chamava de pai morrer. Ele sabia disso e correu como nunca na vida, deixando que a agonia paterna que distrairia aquele demônio se tornasse sua salvação.