Novembro
Novembro, uma e quinze, horário local. Chove forte, as ruas estão praticamente alagadas.
Não consigo enxergar nenhum movimento, pois além da chuva, um denso nevoeiro recai na cidade. E o estranho é que não ouço pessoas nem outro tipo de som. Estranho... Realmente, estranho. Mas é o tipo de clima que me inspira a escrever. Afinal de contas, todos os meus sucessos foram concebidos de uma forma deveras peculiar.
Meus olhos se cansam e paro um pouco, tomo um gole do meu Bourbon, e novamente olho a janela. O nevoeiro inesperavelmente dissipou-se, porem a chuva continua. Logo a monotomia toma conta de mim, tenho que sair, pego meu casaco e saio. Dirijo até um posto de conveniencia, desço e procuro algo para comer. Nossa como é tarde, nem tinha reparado a hora. Volto então para casa, mas algo estranho, o caminho esta diferente.
Os lugares não parecem o mesmo, o acesso a minha rua já não é a mesma. O que esta havendo? Encosto o carro e desço, tento me orientar, observo ao meu redor e não consigo reconhecer o local no qual
estou. Vejo se aprocimar ao longe uma mulher, então eu a abordo e lhe pergunto onde era ali. Sua resposta me deixa intrigado.
-você esta na rua dos mortos, na quadra eterna!
Ora! Que diabos de resposta ridícula e sem pé nem cabeça seria essa.
Olho mais uma vez ao meu redor para então voltar ao carro e seguir adiante, sigo por alguns minutos e inesperadamente encontro o local de casa, entro em minha rua e paro a minha porta.
-que merda foi isso meu deus! O que houve?
Estou de volta a minha sala, sento em frente do computador, tento racionalizar o ocorrido, mas não vejo nenhuma possibilidade lógica de explicação.
Então tento esquecer o fato e volto a escrever. Minha estória se passa em uma cidadezinha chamada Street aeterna. Um vilarejo fictício na Áustria. É um conto de horror e suspense sobrenatural. Nada muito especial, mas no mínimo interessante.
Escrevo por duas horas e paro para dormir um pouco. Acordo, olho no relógio, são oito horas da manhã. Vou então ao banheiro, e no espelho encontro as palavras: “quadra eterna” escrita no mesmo. Espanto-me e quase caio para trás.
- mas que porra é essa?
Que coisa mais surreal e estranha, nunca havia passado por tal coisa.
Quando me sento para tomar café, as imagens das palavras estão frescas em minha mente. Mesmo assim eu consigo me manter racional e volto ao trabalho, logo o telefone toca, é Rafael meu editor, perguntando como anda o andamento do livro.
Opto por não relatar o ocorrido, para não passar por ridículo.
- não consigo mais escrever por hoje! Penso.
Então resolvo sair para espairecer a cabeça um pouco. Olho para a rua para não ter surpresas.
Logo saio e resolvo ir a um café, por coincidência lá encontro uma amiga, também escritora. Para ela, uma amiga de faculdade, resolvi contar o acontecido.
Depois de uma conversa razoavelmente longa, me atento a um ocorrido.
Lembrei-me da mulher que vira na noite anterior e no que me falara, não vi até aquele momento e posteriormente, nenhuma lógica nas palavras dela, Até agora.
Seu rosto me era familiar, mas não tinha feito nenhuma conexão até o presente momento. Foi então que corri do café e fui até em casa, desci até o porão e vasculhei nas tralhas que guardavam memórias e todas essas coisas. Foi então que encontrei uma antiga foto minha, devia ter uns dezenove anos, estava cursando letras.
E pude perceber no canto esquerdo da foto de minha turma, uma garota, com cabelos loiros e olhos verdes. Muito parecida com a mulher que vira na noite passada.
Espantei-me claro, mas ainda não conseguia entender a ligação. Volto então a trabalhar, e recapitulando os textos verifico algo esquisito. Noto que o nome dado pela mulher à rua significa em latim “Street aeterna”. Mas qual seria a ligação dessa mulher e meus pensamentos? Fiquei intrigado e resolvi averiguar o paradeiro dá garota da foto, vou à faculdade onde estudei e pergunto a um antigo colega que trabalhara ali se poderia ajudar em minha busca.
Apos uma breve conversa, consigo acesso às fichas de matricula e acabo por descobrir seu nome. Chama-se Helena, na época tinha 20 anos e era natural de outra cidade.
Teria que ser mais específico em minha busca então resolvo ir à cidade natal de Helena.
Horas de uma cansativa viagem de carro, finalmente chego à cidade. Paro então em uma pousada, abro a porta do quarto e vejo convidativamente a cama. Depois de longo cochilo, parto em minha pesquisa pelo paradeiro da garota. Levo comigo a fotografia e começo pela escola local, creio ser um bom lugar para começar. Faço algumas perguntas aos funcionários, porem noto que todos me olham com um olhar de espanto e surpresa.
-mas que diabos esta havendo aqui? Pergunto.
No segundo dia, acordo mais cedo e tento mais uma vez. Retorno à escola só que desta vez vou à sala do diretor, mostro a foto e pergunto se já tinha visto tal garota, falo que sou um amigo de longa data, que a muito não a via. De pronto ele a reconhece e com um ar de saudosismo retrata:
- sim, sim é a Helena. Estudou aqui há muito tempo, creio que na mesma época que eu.
-Depois se mudou para outra cidade quanto já tinha uns dezenove anos.
-Mas sinceramente não sei onde estará agora, mas ainda tem parente aqui, um tio que a criou, pois seus pais faleceram quando ela tinha cinco anos em um acidente automobilístico.
Prontamente agradeço a boa vontade do diretor e parto em busca do tio de Helena.
Dado a mim o seu endereço pelo diretor, chego a uma casa agradável porem pequena, em uma rua tranquila e pitoresca.
Bato a porta e ao longe escuto passos se aproximando, a porta se abre e um senhor de estatura baixa e aspecto gentil se apresenta.
- o senhor é o tio de Helena? Pergunto.
- sim! E quem é o senhor?
- um amigo de faculdade que gostaria de revê-la.
- olha senhor, mas como é o seu nome mesmo?
- me chamo Pedro e cursei faculdade com sua sobrinha.
- olha senhor Pedro, minha sobrinha faleceu ano passado, estava muito doente e não resistiu.
- estava muito empolgada em escrever um livro e todas essas coisas, quando adoeceu der repente e de forma muito rápido a doença a definhou. Foi muito triste ver uma garota tão bonita e cheia de vida partir dessa forma.
Sem palavras fiquei. Apenas acenei com a cabeça e deixei o local.
Volto então para casa, mas no caminho uma sensação estranha me toma, minha mente é bombardeada por lembranças estranhas, flashes ocorrem e não consigo me concentrar na estrada. Então paro no acostamento, olho pelo retrovisor e o que vejo é um homem assustado e perdido. Sim perdido, pois agora tudo esta começando a fazer sentido, naquela noite, naquela estranha noite chuvosa, eu sai para procurar algo para comer, mas... Na volta não conseguia ver direito, pois o nevoeiro voltou repentinamente. Então aconteceu, tudo que sei é que vi bem de perto as luzes fortes de um veiculo grande, então, então, aqui estou eu vivendo uma realidade inexistente, vitima de meus pensamentos e sentimentos, aqui estou eu.
Perdido nas sombras de uma falsa realidade vitima do acaso ou seria do destino. Agora sei que tudo que vi e fiz, as pessoas com quem falei, não passaram de sombras de minha mente equivocada. Olho para fora da janela do carro e noto com muita sensibilidade o quão linda esta a tarde, tão iluminada e serena, uma tarde de novembro.
Fim.