O pacto
 

Dizem que nada é por acaso e que nem tudo é coincidência, mas eu nunca liguei pra esses ditados populares, bem não ligava porque há 20 anos esse vem sendo o guia da minha vida.
Eu era uma garota de 15 anos comum, ia à escola, passeava com as amigas, paquerava os garotos, falava mal de outras meninas da escola, morava com a família, tinha sonhos de ser uma grande jornalista e de encontrar meu príncipe encantado.
Eu, como toda garota da minha idade na época, tinha uma melhor amiga, aquela companheira, confidente, por quem se brigava se alguém falasse mal. Éramos inseparáveis, saiamos juntas dormíamos na casa uma da outra, dividíamos nossos segredos.

A mãe dessa minha amiga era meio exotérica, tinha um quarto na casa que a entrada era proibida a não ser que ela estivesse presente. Um dia eu estava muito curiosa pra saber o que havia ali dentro e em uma das noites que passei na casa dela resolvi matar minha curiosidade.
Durante a noite deixei minha amiga dormindo, sai do quarto e segui para o fim do corredor onde ficava uma porta toda trabalhada na madeira, diferente de todas as outras portas da casa que eram lisas. Espiei pela fechadura e não conseguindo ver nada tentei abri la, mas quando estava tentando minha amiga chegou por trás de mim, o que me assustou muito, e me perguntou o que eu fazia ali.
Na hora pensei em inventar uma desculpa, mas ela me conhecia muito bem e iria saber que eu mentia então resolvi falar a verdade. Ela disse que também era curiosa pra saber o que a mãe dela tanto fazia nesse quarto.
Ainda me lembro como se fosse hoje.
Entramos e logo de cara vimos dezenas de velas de mais de cinco cores diferentes entre elas vermelha, amarela e lilás, dou destaque a essas por ter sido as que mais gostamos. Havia também muitos livros, incenso, flores secas, aromas, cuias, algumas fotos de pessoas desconhecidas e um enorme armário que não sabemos o que havia dentro este estava trancado.
Mexendo naquele monte  de coisas resolvemos brincar de bruxas e fizemos um pacto, encontramos mínimas lanças coloridas em uma gaveta, pegamos uma cuia acendemos uma vela vermelha, uma amarela e uma lilás, furamos a ponta do dedo indicador, deixamos pingar três gotas de sangue misturamos com a lança e juramos nunca nos separar. Na hora do juramento um vento frio entrou pela porta que bateu, pois a deixamos semiaberta para ouvir se a caso a mãe dela acordasse, depois de feito limpamos tudo e voltamos para o quarto rindo com o pacto que acabávamos de fazer com nossa singela cerimonia.
Assim que voltamos para o quarto logo adormecemos e na primeira noite após o feito eu tive vários sonhos estranhos, confusos uns ate assustadores que ao acordar me deixavam perturbada o dia todo, tanto que eu às vezes temia adormecer e assim seguiram por noites e noites sonhava com vozes, pessoas voando como se fossem almas, lodo, flores secas, o sol que era vermelho e sangrava, tudo muito esquisito.
Assim foi por um período e com o passar do tempo parei de te los, perguntei a minha amiga se ela sonhava com aquelas coisas e ela disse que sim que era estranho, e que contara para sua mãe que fez uma pulseirinha e ela nunca mais teve sonhos daquele tipo.
Enfim estávamos no fim do ano letivo e tínhamos nossa formatura para nos preocupar, era vestido, sapato, maquiagem, cabelo, unha, tudo pra nos deixar belas na festa.
Eu fui com minha família e ela com a dela, mas no meio do caminho o enfeite do cabelo da minha amiga se soltou com o vento que vinha da janela, que estava aberta, levou o enfeite para longe e para não ficar com o visual desfalcado pediu pra parar o carro pra ela pegar, mas assim que desceu na pressa de agarra lo não viu e vinha vindo uma caminhonete a toda velocidade e não conseguiu para atingindo em cheio o corpo dela que foi lançado para o canteiro.
Na festa eu esperava sua chegada ansiosa queria ver como ela havia ficado, sem contar que havíamos planejado dançar muito, tirar muitas fotos e quem sabe beijar uns "gatinhos". Mas ela não chegava nunca, ate que vieram me avisar do acidente.
Sai correndo da festa, fui para o hospital, fui vê la e mal deu tempo de nos olhar ela pegou em minha mão e disse "juntas para sempre" em um ar de interrogação e eu lhe respondi que sim, para sempre e segurando na minha mãe ela se foi e eu fiquei ali ao lado chorando ate que seus dedos foram ficando rígidos e gélidos. No dia seguinte foi o enterro.
Alguns dias se passaram e comecei a ter sonhos com ela, mais uns dias passei a sentir sua presença e não demorou muito passei a ouvi la. Mesmo depois de morta estávamos ligadas de alguma forma e continuávamos a estar sempre juntas
No começo era divertido era como ter uma "amiga imaginaria", mas os anos foram passando e eu tinha que seguir minha vida, conheci um rapaz, namoramos, noivamos e por fim casamos. Ela, minha amiga, sempre esteve comigo e não gostava muito de eu dividir minha atenção com ele, mas se mantinha afastada quando estávamos juntos, mas com o casamento não havia mais como porque estávamos todos os dias juntos e isso começou a irrita la.
Tentei conversar explicar que eu a amava, mas que eu estava viva e precisava e queria seguir minha vida e amava meu marido e pedi pra que ela se afastasse um pouco. Isso foi minha ruina, ela não compreendeu e decidiu acabar com a minha vida com ele.
Passou a assombra lo derrubando coisas dentro de casa, fazendo rabiscos no espelho enquanto ele tomava banho, desligando a tv e as lâmpadas e por mais que eu pedisse ela não parava, um dia quase pôs fogo na minha casa deixando o gás aberto para que ele se queimasse ao acender o fogão.
Neste dia tivemos uma  discussão terrível que  pedi pra que ela me deixasse que sumisse da minha vida, que fosse viver sua morte e me deixasse em paz, disse que queria ter filhos e não queria que ela estivesse por perto por temer o que ela faria com eles, ela disse que jamais assustaria ou machucaria um filho meu e no auge da raiva disse que me arrependia do dia em que fizemos aquele pacto.
Depois disso ela sumiu por um tempo, fiquei grávida, estava de seis meses quando meu marido voltava de viagem e sofreu um acidente na pista que o matou na hora, a perícia não soube explicar o que fez o seu carro capotar tantas vezes já que a pista nã0 era mão única  e sim dupla e não era em um trecho com curvas.
Eles não sabiam, mas era ela, pra mim só podia ser ela, quem mais faria isso, quem desejaria me ver só, era ela nada me tira isso da cabeça.
Comecei a chama la, pedi, implorei pra que viesse e ela veio com um ar surpreso e feliz e foi dizendo que estava com saudade eu fui logo cortando, xingando acusando a de assassinato e por mais que ela negasse eu a acusava, nessa "altura do campeonato" eu também a via e vi que chorava enquanto negava o crime.
Enfurecida disse que ela era um espírito do mal que desejava que ela queimasse no inferno e chorando ela pedia pra eu parasse que não era bom revoltar um espirito, porque ela estava ficando revoltada, dizia que havia partido pra me fazer feliz que havia feito minha vontade e que era inocente.
Minha vontade era bater nela, mandei que sumisse de vez, me esquecesse que voltasse pra onde estivesse e de lá jamais saísse. Me disse que era impossível que nossos destinos estavam ligados e com os olhos vermelhos de lagrimas foi sumindo no ar jurando que eu iria pagar por trata la daquela forma.
Chorei por meses seguidos quase todos os dias.
Estava já de nove meses, tive uma menina linda que hoje esta com cinco meses e é minha maior alegria, mas ha alguns dias percebi que ela tem mudado, ficado mais nervosa, inquieta no berço, logo me vieram pensamentos estranhos e por duas noites tive os mesmos sonhos estranhos que tive na noite daquele pacto, mas tentei me desviar dos pensamentos e fui dormir com minha bebezinha na cama.
Na manha seguinte acordei assustada, minha filha sentada na cama segurando um travesseiro me olhava fixamente cada vez mais profundo  e com um leve sorriso. Entrei em desespero, pois aqueles olhos...aqueles olhos eu já conhecia, e muito, eram os olhos dela.
 
Roberta Krev
Enviado por Roberta Krev em 21/08/2013
Reeditado em 16/03/2018
Código do texto: T4444892
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