Os homens ratos

Os Homens Ratos.

Jorge Linhaça

Ninguém sabe ao certo de onde surgiu o vírus que continua infectando partes da população mundial, o certo é que o seu efeito é cada vez mais visível e o contágio cresce exponencialmente.

Alguns falam de ratos contaminados por experiências farmacêuticas que haveriam escapado dos laboratórios. Outros dizem que foram afetados pela mistura de produtos químicos nos esgotos. O certo é que o vírus existe e se propaga.

Cada vez torna-se maior o número de homens , mulheres e crianças que vagam pelas ruas , qual bípedes roedores, alimentando-se das latas de lixo, sujos, maltrapilhos, fedorentos, as unhas longas como garras e os dentes acostumados a dilacerar carne e ossos.

Suas faces pouco lembram a humanidade que tiveram um dia. Seu olhar é como o de uma animal defendendo as presas, o ódio injetado nos olhos amarelos , a volúpia com que se entregam a esse banquete que causaria náuseas nos estômagos mais sensíveis.

Os homens ratos povoam as grandes cidades, já invadem as médias e, mesmo as pequenas comunidades não estão livres de sua presença asquerosa.

As autoridades sanitárias lutam em vão para combater o vírus e cada vez mais indivíduos (solitários ou em bandos) podem ser vistos revirando as lixeiras e alimentando-se com as próprias mãos.

Os homens ratos desenvolveram hábitos noturnos, mas, ainda assim, não é raro ver alguns deles em plena luz do dia.

Para alguns causam um asco tamanho que aceleram os passos por medo do contágio e para outros, tornam-se invisíveis, como se ali não existissem.

Alguns se preocupam com a evolução dos homens ratos para o canibalismo tão logo comece a haver uma escassez de alimentos, já que sua população só faz aumentar.

Há quem ateste com veemência que já viu batalhas sangrentas na disputa dos dejetos urbanos. Ainda assim, não se encontra alguém que tenha reunido a coragem para intervir em tais confrontos. Os homens ratos, assim como os animais, procuram locais ermos e escuros para repousar, mas na ausência destes, encolhem-se em quaisquer cantos onde a probabilidade de serem incomodados seja pequena.

Enquanto isso, outra casta de homens ratos frequenta ambientes luxuosos, onde aprenderam a maquiar sua aparência e sobrevivem de roer os sonhos de cura dessa doença, fomentando o aparecimento de novos grupos de famélicos seres e alimentando-se da desgraça alheia.

Quem tem olhos para ver que veja, quem tem ouvidos para ouvir que ouça.