A BUSCA

Em meados de 1500, Lord Bruce Byron sabia que a busca estava quase no fim, pois a cabala indicava o lugar, assim como a numerologia que dizia ser aquele o escolhido. A criança teria que ter seis anos e o sacrifício dela o tornaria o homem mais poderoso da Europa e talvez, do mundo.

Há cinco anos ele era um simples médico da corte inglesa, quando remexendo em baús antigos da família, descobriu os diários de seu bisavô morto a décadas, dito ter sido um grande alquimista e nestes diários, seu antepassado descrevia um medalhão produzido em diversos rituais sangrentos com seis metais diferentes. Chumbo, cobre, ferro, prata, eléctron e obviamente o mais nobre dos metais, o ouro.

Seis metais de seis pontos diferente do planeta, cada uma criada com a morte de um ser vivo místico raro no universo.

A porção mais periférica do medalhão que representava os dejetos, fora feito com o Chumbo derretido misturado a carcaça de um Blemmyae, que James Mandeville jurou existir no sul da Ásia com as seguintes palavras: "Em outra parte, há gente feia sem cabeça, que tem um olho em cada ombro, suas bocas são redondas como uma ferradura, no meio de seu peito”. Seu antepassado o abateu com uma espada longa com certa facilidade.

O cobre foi retirado da sujeira encravada no pé enorme de um Skiapodes que morreu após ser mutilado pelo seu bisavô e a enorme unha do dedão do monstro, transformada em escudo que ele conservou como prova.

O ferro foi coletado no sangue de um dos últimos Cinecéfalos cuja pele estava em um baú e o Lord sempre pensou ser de lobo. Segundo o diário, o homem animal apenas se encolheu enquanto era trespassado pela espada.

— Interessante... – pensou o homem.

Byron ficou eufórico quando encontrou o medalhão pois pensou que poderia usá-lo imediatamente, mas para sua frustração descobriu que apenas um bruxo muito bem treinado como fora seu bisavô, poderia utiliza-lo sem o perigo de ser consumido por suas forças malévolas.

Se quisesse seu poder teria que aprender muito.

Deixou tudo o que tinha para a sua mulher e seu pequeno bebê de colo. Sabia que sua jornada seria mais fácil sem ter que se preocupar com eles e saiu pelo mundo como um andarilho, correndo todo o Velho Mundo, depois a África e o Novo Mundo sempre absorvendo o máximo de informações sobre a magia nesses lugares e incorporando aos seus crescentes conhecimentos por mais de cinco anos ininterruptamente.

Usando as descrições do diário, produziu um punhal com o osso de um clérigo e pele de um dragão de Komodo na empunhadura, pois segundo o caderno poderia obter qualquer coisa que desejasse com ele. Sacrificando uma criança virgem, um portal se abriria de algum inferno remoto de onde um demônio ancestral lhe traria poder.

Quem visse Bruce nessa época o tomaria por um mendigo comum, carregando seu alforje, mas dentro dele, encontrava-se poções e objetos de necromancia com as quais praticava sua feitiçaria e através de seus cálculos lunares, feitos exatamente as três horas e trinta e três minutos da madrugada descobriu que o escolhido se encontrava na cidade Londres.

Nessa época ele evitava andar durante o dia, pois sua aparência andrajosa incomodava as pessoas e o que Bruce menos queria era chamar atenção. Chegando ao local indicado, forçou uma das janelas e entrou na casa onde sob a luz de uma vela trêmula, um garoto brincava.

O menino vestia uma túnica branca e em um momento de piedade, o bruxo lembrou que seu filho devia ter aproximadamente a idade dessa criança. Ainda assim, sua ganância pelo poder falou mais alto e ele avançou devagar tirando o punhal da cinta de couro, sussurrando palavras místicas invocando um antigo demônio enquanto o quarto parecia ficar mais quente e as trevas se intensificaram, o menino se voltou para ele.

— Entre, pai. Você é esperado... – disse o menino sorrindo, parecendo hipnotizado.

Byron entendeu nesse instante que o escolhido era seu próprio filho. Arrancou o medalhão do pescoço que pulsava vivo, como um coração sombrio e com o punhal do sacrifício acertou repetidamente a peça amaldiçoada que após várias estocadas se partiu, soltando um jato de vapor fétido.

— NÃO! Meu filho não! – Gritou Byron largando o medalhão.

O necromante se afastou de um salto e o quarto parecia cada vez mais quente.

— Não adianta lutar pai! O meu destino está selado, assim como o seu! – Avisou a voz que controlava o menino.

— NÃO! Eu não posso aceitar sua morte! – Gritou o bruxo, renunciando ao seu poder maldito.

Nesse momento ele sentiu uma enorme mão encarnada, que envolveu seu ombro e cujos dedos chegavam até deu cotovelo, e alguém atrás de si com um cheiro de algo morto a milênios com uma voz indescritivelmente horrível se faz presente.

O Bruxo olhou lentamente para atrás, aterrorizado.

O ser que o havia tocado não parecia um demônio, ao menos não como os descritos nos antigos pergaminhos ocultistas que ele teve em mãos nos últimos anos. Ainda assim a aura que acompanhava a criatura não podia ser descrita de outra maneira que não demoníaca.

— O sacrifício já foi aceito. – Sibilou a entidade.

Desesperado, o bruxo se ajoelhou diante da sinistra criatura do mal absoluto implorando uma clemência que ele não conhecia. O demônio baixou os olhos de um vermelho sem pálpebras em direção a Byron enquanto o filho dele passava pelo pai ajoelhado e parou ao lado do ser das trevas.

— Que o sacrifício tenha início... – A língua negra do demônio se moveu entre os dentes afiados.

O bruxo deixou o punhal cair no chão e pôs as mãos entre os sujos cabelos desgrenhados, gritando em desespero:

— Eu não posso! Meu filho não!

O garoto sorriu e abaixou-se, recolhendo o afiado punhal de osso e sob o olhar atento do demônio, avisou ao próprio pai:

— Não se preocupe, eu sou sim o escolhido. O escolhido para reinar sobre os homens dessa esfera patética!

Byron levantou a cabeça, espantado e a primeira punhalada furou seu pescoço. Tentou se defender, mas o pequeno estava possuído por uma fúria infernal e poucos minutos depois, o bruxo estava morto, sua alma sendo transportada rumo ao inferno para a danação eterna.

Na Terra, seu filho furou a palma de sua mão esquerda, misturando o seu sangue jovem com o do pai morto e oferecendo a lâmina manchada de vermelho para o demônio. A língua do ser milenar se encheu do sangue dos dois e ele sorriu em um esgar, saboreando a oferenda.

— Tudo o que quiser, Será. – avisou o ser maligno.

Implodiu em chamas, voltando para os reinos infernais, deixando só o menino que sorriu. Por mil anos será o senhor de um reino oculto, adorado por milhares de súditos nos quatro cantos do planeta onde pretende preparar o retorno de Lúcifer a nossa Orbe e para isso precisa degradar o ambiente do planeta, torna-lo agradável ao seu Senhor dos reinos inferiores.

Com uma toalha o garoto limpou o sangue de seu próprio rosto, limpou também o corpo do pai, assim como havia limpado o sangue da mãe, morta alguns dias antes.

O pequeno sorriu. Mal esperava para começar sua tarefa.

Humberto Lima
Enviado por Humberto Lima em 14/01/2016
Reeditado em 30/08/2020
Código do texto: T5510915
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