Passageiros Insólitos

Jaqueline não possuía carro, mas com o seu cartão escolar viajava para vários lugares. Era um divertido passatempo aventurar-se por outras cidades, ver pessoas novas, andar pelas lojas, fazer compras e encontrar alguns conhecidos pelo caminho. Ela estava com 18 anos de idade e cursava o terceiro ano do ensino médio.

Numa quarta-feira, pelo fim da manhã, Jaque aproveitava um passeio por Rio Bonito, onde acabara de encontrar Rebeca na Praça Cruzeiro, uma antiga amiga de classe, a qual não via desde a oitava série. Alguns assuntos decorreram neste encontro; entre os mais dissertados estava qual faculdade pretendiam fazer. Jaqueline contava sobre sua paixão por turismo, enquanto Rebeca preferia psicologia. Após uma troca de números de telefone, elas despediram-se, pois Jaque pretendia ainda fazer uma viagem para Silva Jardim e até a rodoviária foi caminhando.

De lá, saíram com ela o motorista e mais nove passageiros, que vestiam trajes comuns para um dia de calor como aquele. Porém, alguns pontos depois, um homem com um visual diferente entrou no ônibus. Ele vestia um sobretudo preto e usava um chapéu da mesma cor. Ele passou pelo corredor com a cabeça abaixada, não possibilitando Jaqueline de enxergar seu rosto. Ela olhou com certo espanto para as outras pessoas ali sentadas, mas estas se mostraram indiferentes. Aparentavam nem terem visto o tal homem.

Logo após a entrada deste último passageiro, o céu começou a ficar nebuloso. Pela janela observava-se um escurecer súbito e intenso. Sem delação, o ônibus entrou bruscamente em um túnel ainda mais sombrio, com apenas umas fracas e distorcidas luzes o circundando. Incomodada, Jaqueline veio a perguntar:

-Ué, que lugar é este que estamos indo? Não conheço nenhum túnel no trajeto para Silva Jardim!

Ao mencionar tal coisa, ela viu o ônibus frear lentamente e começar a piscar suas luzes internas. Os nove passageiros iniciais balançavam suas cabeças para os lados, sentados em seus respectivos bancos, enquanto das bocas e olhos deles escorria um líquido negro e pastoso. Estarrecida, Jaque gritou e correu até ao motorista, mas notou que o mesmo estava sem face, pálido e imóvel.

Os nove viajantes levantaram-se e vieram em sua direção, balbuciando palavras incompreensíveis. Ela mexia no painel do motorista, em estado de desespero, mas não conseguia abrir a porta. Até que, por fim, quando os passageiros quase a tocavam, o êxito foi obtido.

Jaqueline acelerava seus passos pelo túnel, tentando fugir por onde o ônibus entrou, mas os seus perseguidores a alcançaram e derrubaram-na, a segurando pelas pernas. Com os olhos vermelhos e encharcados, ela viu, ao levantar a cabeça, o homem do sobretudo preto na entrada do túnel. Ele emitiu uma forte luz pelas mãos e jogou os nove obsidentes para longe, até as profundezas daquele denso lugar.

O misterioso homem resgatou Jaqueline e a levou de volta à rodoviária, em um deslocamento instantâneo. Ali ela permaneceu perplexa por vários minutos, enquanto as pessoas em sua volta iam e vinham normalmente, sem terem visto nada de anormal. Dentro de um dos ônibus que ali paravam, estava o mesmo motorista que Jaque tivera visto a conduzir naquela insólita viagem. Ela se levantou tremendo e foi questioná-lo:

-Você também viu? O que foi aquilo que passamos naquele túnel? Que pessoas esquisitas eram aquelas? Qual a explicação para isso?

-O que você fumou garota? Eu nem te conheço. - disse o homem com as mãos no volante, pensando estar diante de uma louca.

- Lá no caminho... Aquele cara com o sobretudo... Os passageiros me perseguindo... Você estava sem rosto e...

O motorista saiu com o ônibus e nem quis dar ideia àquela conversa, enquanto Jaqueline o gritava para esperar. Ouvindo os gritos da amiga, Rebeca, que por ali chegava, foi ter com a garota desesperada:

-Calma, amore! Por que estás tão aflita assim?

Jaque contou-lhe sobre o que tivera passado, mas Rebeca apenas deu um sorrisinho e disse:

-Fica tranquila, menina! Você está ficando muito alucinada com esses passeios todos que tem feito. Venha, eu vou lhe acompanhar até em casa. Quem sabe, quando me formar, eu possa lhe ajudar ainda mais com estas paranoias. Hehe!

Jaqueline calou-se, mas por sua mente continuavam passando muitos questionamentos sobre o que viste. Talvez aqueles nove passageiros fossem demônios tentando a levar para outra dimensão. Quem sabe, tudo fora apenas um delírio. Ou mesmo, o homem do sobretudo, que demonstrou ser o seu resgatador, pudera ter projetado essas coisas na mente dela, com o intuito de iludi-la. Bem, Jaqueline não conseguia chegar a uma conclusão e preferiu tentar não pensar mais naquela viagem macabra, a fim de não enlouquecer. Entretanto, ela jamais teve coragem de viajar para Silva Jardim outra vez.

Filipe Sonne
Enviado por Filipe Sonne em 06/07/2016
Código do texto: T5689357
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