A Chave Para o Abismo Infinito.

O vento soprava intenso naquela noite, sobretudo no alto daquele famigerado morro que se avultava no horizonte como uma massa negra e sinistra. Há séculos as populações que viviam naquela região temiam aquele lugar, o único relevo que se destacava em meio a uma vasta planície. E todos se pudessem evitariam chegar perto de tal monumento geológico de formato inexplicavelmente soturno. Contudo nessa exata noite duas figuras desafiavam as conversões e encontravam-se exatamente em seu cume.

Uma das figuras ali presentes era um homem de grandes proporções alto, rosto redondo e olhar inflexível. Sobre os lábios um grosso bigode, antiquado na verdade aos tempos modernos, ele trajava uma estranha túnica de cor amarela como a loucura. Este era o conceituado Professor Sérgio Pacca, Jornalista, Filósofo, Historiador e admirado pelo circuito acadêmico paulista. Mas também um profundo conhecedor de artes sombrias a muito esquecidas, bem como conhecimentos ocultos e blasfemos dos quais poucos homens se quer ousam sonhar.

Sérgio por exemplo sabia o que aquele morro de fato era, e sabia que o temor popular era justificável embora ninguém soubesse a origem desses sentimentos arrepiantes. Apesar da expansão urbana poucos moravam próximo dali, histórias populares permeiam há décadas o lugar de assombrações, visões estranhas, aparecimentos de luzes misteriosas entre outros causos, que retrocedem no tempo... Os bandeirantes antes de fundarem a cidade que floresce a poucos quilômetros do monte, tinham originalmente erguido seu principio de povoamento nesse morro por volta de 1589, mas abandonaram o local pouco tempo depois, carregando na alma um pavor terror profundo pelos pavorosos sonhos que insidiosamente os assediavam. Nunca foi determinada ao certo a natureza desse pânico capaz de fazer os homens mais bravos da história brasileira ter medo das matas as quis eles é que costumavam impor terror. Algumas lendas fazem referência a fantasmas ou demônios. O certo é que mesmo as tribos indígenas da região temiam passar pela elevação geológica, em seus mitos tinham o lugar como amaldiçoado, apenas os famigerados e antropófagos tupinambás frequentavam a região. E mesmo durante o século XIX e inicio do século XX, quando uma rica mineração de ferro se deu no lugar, histórias estranhas sobre encontro dos mineiros com demônios e estranhas criaturas se proliferaram, assim como casos de pessoas que misteriosamente desapareciam em suas matas só aumentaram a má fama dessa região.

Contudo, o professor Pacca, conhece a verdade por traz de todos os mitos. Ele sabia o que de fato era aquele morro... Um segredo guardado por gerações, través do tempo, por incontáveis séculos através da História e por continentes distantes. Desde tempos remotos, da aurora da civilização, desde a queda de Carcosa. E Pacca era um dos últimos dessa linhagem, portador de verdades insondáveis e profanas. Aquele monte não era natural como supunham os geólogos, era na verdade um de muitos Zigurates que em segredo jaziam ocultos pelo continente americano, soterrados por eras de erosão natural e por ação de mentes inteligentes... Mas apesar de utilizar a mesma arquitetura sumeriana e de conter em suas paredes a mesma escrita cuneiforme, esta construção era feita de blocos de ferro e era tão antiga quanto a própria terra, esculpida por mãos que não eram humanas, mas sim pertencentes a grotescas criaturas que caíram dos abismos estelares, e que a muito tempo servem como vassalos de antigas deidades a muito esquecidas.

Mas agora, nesta hora em que as estrelas se alinhavam em sua conjunção mais profana, o herdeiro de Carcosa se posicionava no cume daquele hediondo monte, de frente para uma antiga rocha, depositada a eras por uma tribo de tupinambás, que dava continuidade as crenças de adorações mais nefandas possíveis... E que mesmo separado por milénios incontáveis, sentiam a malignidade presente naquela singular edificação. Sobre a rocha cerimonial, se encontrava uma bela jovem, que em transe deitava-se totalmente despida, ignorando o frio da noite de inverno, e revelando as perfeitas e voluptuosas formas de seu porco alvo. Seu rosto delicado como uma flor encontrava-se relaxado, seus olhos penetrantes miravam as estrelas no céu límpido e seus cabelos negros e curtos espalhavam-se sobre a pedra. Ela cruzou toda a extensão do país para este momento... Afinal era ela a escolhida, era ela a chave essencial.

O professor Pacca, sem nutrir piedade alguma pela bela jovem que ali se encontrava, posicionou sobre o seu corpo um aguçado punhal e entoou frases de um encantamento blasfemo retirado do Al-Azif, as mesmas entoadas por Hastur e por incontáveis eras de cultistas...

- Oré anaití Anhangá... iu abaçaí na... I reco até obá... Abaúna... Abajubá... Anhangá... Anhangá...

Aquela aguçada lamina abriria ao corpo virginal daquela jovem e mancharia aquela terra macabra de sangue mais uma vez, e assim o portal poderia ser aberto para o abismo infinito e com sorte o despertar de mais um Anunaki seria testemunhado pelos olhos maléficos de Pacca.