Juízes Vermelhos

Fora outorgada a sentença. Em seu próprio retraimento, o inepto se subjugou e encontrou a paz. Não há paz no sôfrego da fome. No chão frio há paz, somente, quando adormece-te. Hoje adormeceu no chão, o inepto. Era o chão da justiça, justiça áspera. Justiça vermelha.

A mesma proeminência para empunhar o machado não é a mesma para perdoar o latrocínio, Juízes? Grita, em seu âmago, a condenação. Grita no âmago de todos os espectadores: “Sangue do pecador”. A alma quer ser lavada. Quer respingos de dor e prazer.

O vosso homicídio deve verter-se em compaixão, não em vingança. Deves talhar-lhe o pescoço com tristeza. O inepto já se perdoou. Poderias tu, juiz vermelho, perdoar a si mesmo por seus atos?

O machado sangra o pecado de muitos pecados. O sacrificador sangra o próprio pecado dos mesmos pecados.

O inepto estocara o punhal no bom e justo homem. Roubou-lhe duas vezes. Uma a pecúnia e outra a vida. Inerte, ficou em pensamento após consumar o ato. O fascínio de sua obra matara suas virtudes. Queria o sangue, não o roubo. Havia fome, não a paz.

Oh, Juízes! Tens fome? Roubaram, por vezes, vidas. Uma alma de sangue apraz as demais. A Divina condenação se faz em morte rápida para o que sofre. Então não se demore em ceifar.

Olha-me com louvor, juiz vermelho? Estas saciado? Alimentaste a própria alma e de seus espectadores gados? Vosso olhar prostrado não ameniza seu pecado. Deseja dirigir-me a palavra amarga, Oh, Juiz vermelho?

– Alguma objeção, nobre cidadão? – Disse com amargor.

– Não sou da nobreza, nem vossa déspota santidade é, senhor e sim, tenho objeção! Questiona seu pecado e condenação? – pergunto.

– A condenação é necessária e justificada. Paga-se vida com vida.

– E o seu pecado?

– Há redenção para o pecador que faz justiça a homens bons e justos.

– Os bons e justos não se fazem presentes. Não há redenção para você.

– Se defendes o delinquente sem cabeça és tirano. Podes subir para sua execução se desejar.

– Há mais de tirano em sua plateia do que no delinquente, juiz.

– Minha plateia não roubou nem tirou vidas.

– Foram condescendes com seu machado e com sua justiça.

– Basta! Queres me fazer perecer com seus devaneios. És louco! Estas tomado pelo maligno. Zombas do povo, chama-os de assassino. Nobres – Grita o juiz – estou a mando de suas ordens. Desejam mais uma justiça?

Triunfo! É vitorioso aquele que partilha do comum. Em uníssono a plateia louva por sangue redentor. Um louco em devaneios é colocado no tablado.

– Tens mais loucuras a dizer homem iníquo e vil? – Pergunta meu executor.

– Não deste o benefício da palavra ao delinquente.

– Um assassino tens a obrigação de perecer calado, já o louco pode perecer como asno.

– Bem dito! Pereças vivendo como um assassino enquanto me silencio.

Justiça vermelha para um povo vermelho.