O Padre

Perdoe-me padre, pois pequei. – Ouve-se uma doce voz pelas fresta do confessionário – Envolvi-me em um manto de alegria e ternura. Desejei o indesejável. Feri minhas orações. Voei aos céus. Toquei os dedos de Deus e o vi sorrir para mim. Era esplendoroso, ainda assim era pecado.

Acalma-te, filha. – Diz, com serena voz, o padre. – Somos pecadores aos olhos do Senhor. Meu dever é ouvir-te e intervir em tua dor e infortúnio. És belo o reconhecer de teu pecado. O caminho para acolher-se aos afagos de Deus é reconhecer que erraras.

Não padre. Não há redenção para mim, não mais. – Ouve-se falhar a voz da doce jovem – Apaixonei-me, experimentei da mais lascívia paixão. Não sou digna dos afagos de Deus.

Não digas tal coisa, menina. Cometeste o adultério, então? Tu não foste a primeira qu...

Não padre. – Interrompe, subitamente, a jovem – Não cometi tal pecado. Sequer sou casada. O que há em mim é apenas desejo. Ferve o amor tortuoso em mim. Um desvirtuado amor ao próximo. Amor desaprovado e desregrado.

Não compreendo, filha. – Diz, incerto, o padre. – Apaixonar-se não é pecado. O amor é a maior criação de Deus. Glorifica o coração, expande a alma e deleita o corpo. Sentes culpada por amar?

Tu jamais compreenderás minha dor, padre. Sei bem que amar não é pecado. O infortúnio reside em quem se ama. E quem eu amo, não me amarás. Não me quererás.

Agora compreendo-te, minha jovem. Amas um homem compromissado à outra mulher. Doloroso é este amor. Um amor que não colherás frutos. Digo, porém, Deus tudo planeja. Confias, haverás aquele que a amarás.

Não padre, o plano feito para mim não foi justo. O compromisso deste homem não é para com outra mulher, mas sim para com Deus. – Escuta-se o suspiro de pranto da jovem. – Amo a ti padre. – Há um momento de silêncio no confessionário.

Eu...sou padre. – Vacila a voz – Não posso corresponder a este amor. Alegro-me de sua afeição por mim, jovem. Perdoa-me, sabes que não...

Eu sei padre – Diz a jovem em alta voz – Não me quererás, mas quero à ti mesmo assim. Desejo-te, amo-te. Quero apenas ser tua mul...

Silencie-te neste minuto – Enche-se de cólera, o padre – Estás fora de si. É um amor proibido. É pecado dos mais trevosos. Abdique estes pensamentos, por favor, filha. Não se obscureça.

Perdoe-me padre, pois pequei. – Diz em prantos, a jovem.

Sim, filha. Estás perdoada, reze um pai...

Perdoe-me, – Interrompe a jovem. – pois matarei um homem.

Uma moça, de olhos lavados em lágrimas, se levanta do confessionário. Abruptamente, segue para a cabine do padre. Entreolham-se por um breve momento. Um padre suspira e tremula ao ver o punhal nas mãos da jovem. Uma estocada rápida, rente ao coração e o frio consome o padre.

“Meu doce padre. Amaremo-nos no reino dos céus.” – Finda-se a jovem moça.