Cruzeiro da morte

Depois de passar quatro anos enlouquecendo na faculdade, finalmente subi no palco com uma beca escura fazendo pose para as fotos nervosas e o canudo em mãos. Meus pais atenciosos me deram uma viagem de presente, um cruzeiro transatlântico, vesti minha melhor roupa, um óculos espelhado e fui para a viagem dos meus sonhos. Adentrar naquele navio foi espetacular, parece que passei para um mundo paralelo, tem um cheiro doce e suave, o clima agradável e estável, pessoas bem vestidas e simpáticas, visualmente encantador. Meu quarto não é grande, mas muito confortável, uma cama de casal no centro, uma grande janela de vidro me apresenta o mar, frigobar, climatização, perfeito. A primeira noite foi tranquila, jantei em um restaurante bonito, conversei com um casal de idosos, depois me sentei em um bar no centro do navio, grande, iluminado, cheio de estofados confortáveis, em baixo de um grande lustre de cristal, diante de dois elevadores panorâmicos, aos pés de duas escadas de diamantes. Os garçons passavam de um lado a outro com grandes bandejas redondas e escuras. Uma garçonete se aproximou, alta, loira, magra, olhos verdes e uma franja bem penteada sobre os olhos. Colocou delicadamente um porta copo com o emblema do navio sobre a mesa diante de mim, me lançou um sorriso amigável e me questionou se poderia me ajudar. Ela se referiu a um cardápio de bebidas diante de mim, que a pouco estava sobre minhas mãos. Apontei para uma bebida qualquer e entreguei meu cartão do quarto para efetuar o pagamento, ela se afastou me deixando assistir um homem careca, de cavanhaque, óculos preto e roupas sociais cantando sobre um pequeno microfone. Ele cantava e jogava um olhar conquistador para uma mulher loira, com um vestido preto curto, parecia ter 40 anos e agarrava desesperadamente um homem careca que delicadamente tentava se soltar. A dança desastrosa terminou e o homem correu para o lado oposto deixando a loira apenas com sua bebida, mas os olhares interessados do cantor não cederam. No primeiro intervalo, o cantor se aproximou da loira puxando uma conversa longa e sugestiva. Não fiquei para ver o fim da conversa, fui para o quarto, tomei um banho demorado e dormi satisfeita por estar livre e bem longe da faculdade. No dia seguinte fui para a piscina, não jantei no mesmo restaurante e não fui assistir o cantor. Ouvi sussurros de alguns passageiros dizendo que alguém sumiu, mas como estamos no meio do oceano, é muito difícil alguém simplesmente sumir. Assisti uma peça de teatro muito interessante, depois fui tomar um drink naquele bar, não havia cantor, tentei me convencer que ele estava em outro bar - já que tem bastante - mas os sussurros sobre a pessoa desaparecida gritava em minha cabeça, coincidência talvez. Os dias passaram e o homem não apareceu, os tripulantes começaram a ficar nervosos, disfarçavam com sorrisos forçados e olhares distantes, mas a todo momento se ouvia sussurros e olhares confusos. Comecei a perceber que alguns homens sumiram, o cantor, o careca que dançou com a loira, um garçom do mesmo bar, um outro cantor - cantor de ópera - para onde eles foram? Talvez eu estivesse paranoica, mas quando eu pensava nesses homens, me lembrava de uma pessoa específica que eu vi conversando com eles, a loira de 40 anos. Alguma coisa nela me incomodava, então passei a segui-la disfarçadamente. Ela passava o dia na piscina com uma senhora que nunca falava nada, depois jantava no restaurante do andar de cima do meu, bebia um drink, conversava com algum cara, tentava dançar com ele e ia dormir. No dia seguinte esse cara - que a loira tentava dançar - não voltava para aquele bar, cada dia a tripulação ficava mais apreensiva. Por que isso só fazia sentido para mim? Certa noite segui a loira até sua cabine, quando ela abriu a porta um forte odor de coisa podre surgiu, tentei olhar mas não consegui, dei as costas e de repente a senhora surgiu diante de mim e me empurrou para dentro da cabine, não sei de onde veio tanta força, cai sentada próxima a uma das camas, olhei para cima e tinha muitas teias gigante na parede. A cabine estava escura, apenas uma pequena luz do banheiro se sobressaia, apertei os olhos e acima de mim tinha quatro corpos enrolados nessas teias, um não tinha um braço, o outro estava sem cabeça, os outros dois estavam tão deformados que mal conseguia identificar, no chão pedaços de carne rasgados e jogados, o cheiro piorava e me deixava nauseada. De repente a loira apareceu.

-Ora ora, o que temos aqui. Uma curiosa.

Seis patas peludas e pretas saíram de suas costas, seu rosto rasgou no meio surgindo uma sequência de olhos em sua testa, sua boca abriu nas laterais surgindo um par de garras peludas e pretas, mais duas garras saíram de sua boca.

-Que diabos você é?

-Eu sou a viúva negra, e você entrou na minha teia - ela cuspiu um olho em cima de mim - agora vai virar minha comida.

Lancei meu corpo para cima e corri para a porta, a senhora arrancou a pele do rosto espirrando sangue na parede, aquele rosto não é dela e sim de alguém que ela matou. Corri para o banheiro e tranquei a porta, dei um passo para trás e um homem caiu em cima de mim, me joguei para dentro do Box, era o cantor careca, ele estava sem um dos olhos, tinha marcas de mordidas pelo corpo, um de seus braços fora arrancado, ele tremia e engasgava com o sangue. Me sentei encostada à parede, como eu vou sair daqui? Não sei quanto tempo fiquei sentada assistindo a morte sangrenta do cantor, de repente ouvi a porta bater e tudo ficou em silêncio, abri a porta e corri para o quarto, acendi a luz e gritei com o que vi. Pedaços de corpos espalhados pelo chão, sangue por toda parte, em baixo da cama tinha muitos ovos, todos empilhados.

-Essa coisa está dando cria?

De repente a porta abriu, senti as patas baterem em minhas costas, fui jogada contra a parede, um líquido fedido caiu sobre mim, me inclinei e vomitei. A loira me puxou, arrancou minhas roupas e começou a me enrolar em uma teia grudenta, comecei a ficar zonza, ela colocou as garras em meu pescoço, senti cortar minha pele, o sangue escorreu sobre a teia, tive certeza que morreria, de repente tudo escureceu. Acordei sobre a cama suja de sangue da mulher aranha, sentia muita dor nas costas, no rosto e na cabeça. Me inclinei, caminhei sobre os pedaços de corpos, me vesti e caminhei pelo corredor. Não sei como eu sobrevivi, mas me sentia diferente, fui para o quarto, tomei um banho demorado, desci para jantar. Depois de jantar desci para tomar um drink, um garçom se aproximou lançando um porta copo diante de mim.

-Posso te ajudar?

-Claro - respondi com um olhar irônico. - pode me mostrar um banheiro próximo.

-Sim, você segue o corredor e vira a direita.

-Vai me deixar andando sozinha por aqui?

Ele me devolveu o sorriso, fez um gesto gentil e caminhou por entre os passageiros até um pequeno corredor. Me apontou o banheiro, estendi a mão para agradecer, de repente o puxei para dentro do banheiro, o lancei sobre o chão, meu rosto queimava e caia em pedaços, minhas costas rasgava e ardia. Senti as patas saírem das minhas costas e furarem o pescoço dele. Enquanto ele tentava gritar de dor chupei seus órgãos internos pelo pescoço, mastigada diante de seus olhos, cuspia sangue em seu rosto. Depois eu apenas assisti sua morte lenta, arrumei a pele do rosto com maquiagem, sai do banheiro deixando a sujeira para minhas colegas aranhas. Quando o Cruzeiro chegou ao seu destino não havia mais pessoas vivas, nos aranhas, saltamos antes de chegar, ninguém até hoje sabe explicar o que aconteceu naquele navio sangrento. Até fizeram um filme tentando explicar o que aconteceu, em que eles colocaram a culpa em uma doença que fez os passageiros se matarem, o filme ganhou um nome bem explicativo “o cruzeiro da morte”, o dia em que a morte tirou férias e fez um cruzeiro transatlântico.

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Blog de terror: https://theblackwidowskull.wordpress.com

Ashira
Enviado por Ashira em 16/07/2017
Reeditado em 17/07/2017
Código do texto: T6056232
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