História para dormir com medo

Personagens:

• Idelfonso Velho: um idoso que exerce algum tipo de liderança no povoado.

• Gito: caboclo que trabalha no roçado e que gosta de beber uma cachacinha.

• Dona Pedrinha: benzedeira da comunidade e mãe de Pedro Urutubal.

• Pedro Urutubal: rapaz nervosinho do povoado e que sonha em ser valente.

• Maria de lourdes: casada com Gito e que se encontra as escondidas com Pedro Urutubal.

• Mané Galça: dono da venda da vila. Idelfonso Velho não gosta muito dele.

• Dijé (Maria de Jesus): casada com Mané Galça e que gosta de um comentário fora de hora.

• Fabiano: criador de duas cabeças de gado e filho de Idelfonso Velho.

• Guida: casada com Fabiano. Não gosta do lugar onde vive

• Carlinhos (18 anos), Socorro (16) anos), Lucio (13 anos), Detinha (Bernadete, de 7 anos) filhos de Fabiano e Guida.

I

Os eventos que serão descritos para vocês ocorreram há muito tempo. Foi por volta do ano de 19.., em algum lugar do norte do pais. Acredito que essa história, se é que foi verdade, é lembrada apenas pelos muito velhos e isto porque eles escutaram de alguém. Com o passar dos anos tudo terminará sendo esquecido.

Havia uma vila muito pequena, pobre e distante de grandes cidades. Nesse lugar as pessoas viviam de plantar feijão, milho e outras coisas, algumas criavam umas poucas cabeças de gado, pescavam e faziam aquelas coisas que as pessoas fazem quando moram em um lugar que é mais um aglomerado de casas do que propriamente uma cidade. Todos se conheciam e levavam uma vida simples sem grandes acontecimentos que não fossem as conversas sobre quem engravidou, quem colocou mal olhado na criação de patos e galinhas, sobre a doença do filho do fulano de tal ou o tempo que estava muito chuvoso.

Quem já conheceu comunidades muito pequenas, perdidas em lugares ermos e distantes dos grandes centros, já deve ter percebido que as pessoas todas terminam por desenvolver algum tipo de proximidade, afinal todas se conhecem, de maneira que de alguma forma compartilham o mesmo cotidiano.

O inverno tinha chegado. As vezes chovia o dia inteiro ou então chovia constantemente. O mato parecia mais verde e o tempo a noite costumava ser mais frio. As vezes amanhecia chovendo e a vontade sempre era de estender um pouco mais o sono. Foi em uma época assim que os acontecimentos estranhos tomaram de assalto a pequena vila.

Certa noite quando a chuva já tinha expulsado o último caboclo da venda de Mané Galça, ele era chamado assim por causa das pernas compridas e finas que lembravam as de uma garça, e as ruas do pequeno povoado já tinham virado uma poça de lama começaram os eventos. Noite alta já ia, as lamparinas e lampiões forneciam a única iluminação para enfrentar a escuridão, quando uma série de gritos vindos sabe lá de onde passaram a ser ouvidos na pequena vila. Gritos que eram ora agudos, ora graves. Gritos altos. Gritos que pareciam querer rasgar alguém por dentro. Em sua rede Dona Pedrinha se assusta e faz duas vezes um sinal-da-cruz. Gito não escuta nada porque tinha dormido pesado após umas doses a mais de cachaça. Guida fala baixinho para o marido que só em um lugar como aquele gritavam daquele jeito tão horrendo. Os gritos prosseguem por vários minutos. Todos escutaram. Todos de alguma maneira na vila se perguntaram quem gritava daquele jeito tão desesperador ou o que gritava daquele jeito.

II

O dia seguinte e o sol da manhã encontraram os moradores perguntando-se sobre o ocorrido da noite anterior. Alguns, talvez encorajados pela luz da manhã, achando que tinha sido algum animal ou brincadeira de alguém que agora estava rindo escondido. Outros com medo, mas também com receio de falar alguma coisa que pudesse não ser bem compreendido pelos outros. Ildefonso Velho foi o primeiro a falar:

- Foi bicho ou foi gente aquilo de ontem à noite? Eu já estava dormindo quando começaram a gritar.

- Não escutei nada, tinha tomado uns negócios...Responde Gito.

- Foi coisa feia. Juro que me benzi todinha. Parece até que estavam gritando na porta da casa. Credo em cruz!! - Disse Dona Pedrinha tornando a se benzer.

- Sabe lá se não eram os pecados de alguém. - Fala dona Dijé dando um olhar bem furtivo em direção da mulher de Gito, Maria de lourdes, e lembrando do dia em que escondida viu esta ir atrás de Pedro Urutubal no Riacho da Pedras.

- Acho que foi molecagem de alguém. Tem gente que não presta. Fizeram só para assustar a gente. Molecagem bem-feita, mas não vão fazer de novo. Só funciona uma vez. - Falou Fabiano tentando demonstrar segurança.

- Hum hum. -É o só que diz Pedro Urutubal com cara de impaciência.

Essa reunião acontecia bem na frente da venda de Mané Galça. Logo os afazeres de todo mundo começaram a pedir urgência e aos poucos o assunto mudou e terminou que todos foram cuidar das suas vidas.

A noite caiu sobre o pequeno aglomerado de casas e outra coisa aconteceu. Dessa vez não foram gritos.

III

A madrugada já corria alta e a chuva que tinha caído, logo que anoiteceu, há muito já tinha parado. Todos na pequena vila dormiam a sono solto quando foram acordados com o barulho de coisas que se chocavam nas paredes de suas casas ou que pareciam bater nos jiraus ou em o que estivesse lá fora na hora. A maioria das casas eram de madeira, algumas casas eram de barro com partes de madeira. A melhor casa da pequena vila era a de Idelfonso Velho, que vivia nela com o filho, a nora e os netos. A mais humilde era a de Gito feita toda de barro. Idelfonso Velho acordou com a barulho, arregalou os olhos e se perguntou sobre o que era aquilo. Marias de Lourdes, com medo pulou para a rede do seu marido, lamentando não ser a rede de Pedro Urutubal. Mané Galça com os ouvidos atentos começou a achar que aquelas coisas não iam parar por ali. Alguns como Pedro Urutubal pensaram em ir lá fora averiguar o que era aquilo mas desistiram porque, afinal de contas, ir sozinho podia não ser muito seguro...principalmente quando não se sabe o que está lá fora ...

A manhã chegou e com ela mais conversas e especulações sobre o que teria acontecido. Alguns mostravam pedras grandes que teriam sido encontradas nas portas das casas ou nas paredes, um se queixava de que uma pedrada teria quebrado um pote novinho que estava em cima de um jirau. Percebia-se uma inquietude muito grande e um desencontro de teorias e informações sobre o que poderia ter causado aquilo

- Quero saber quem foi o filho d’uma égua fedorenta que está jogando pedra nas casas. Passo o facão no safado que fez isso. – A raiva era grande em Fabiano.

- Isso não foi coisa de Deus. Porque apedrejar a gente? Só pecadores é que eram antigamente apedrejados. A gente deveria era fazer uma missa ... mas o Padre Justo só vem um vez no mês – falou pesarosa, Dona Pedrinha.

- Passo-lhe o facão ...e não sou pecador para ser apedrejado – Tornou a falar Fabiano olhando com desdém para dona Pedrinha.

- Isso não me cheira coisa boa ... dá vontade de pegar as crianças e ir embora daqui. Eu hoje à noite vou dormir fechando bem tudo quanto é janela. – Disse a mulher de Fabiano.

- E isso vai bem adiantar de alguma coisa. – Falou Dona Dijé baixinho e com ironia.

Nesse momento chega Gito e se mete na conversa. Caboclo rude de mão grossas, rosto queimado de sol e que muita gente não prestava atenção quando ele falava. Talvez por beber além da conta.

- Reparei que não tem uma pegada diferente perto de casa. Só tem as minhas e as da Lourdes. Tá tudo que é só lama ao redor de casa.

- E tu sabes bem reconhecer as pisadas de todo mundo aqui? – Falou Dijé, com ironia na voz.

- Sei sim reconhecer... e só tinha as nossas.

Enquanto essa conversa acontecia em outro canto do vilarejo Pedro Urutubal e Mané Galça também falavam do acontecido. Pedro Urutubal ao contrário de sua mãe achava que era gente de carne e osso quem fazia isso ...mas sempre era mais fácil falar isso quando o sol está brilhando lá fora. Mané Galça dizia que mais coisa ia acontecer e tinha medo do que poderia ser. Nesse momento chega Idelfonso Velho e se mete na conversa:

- Acho que a gente tem que saber o que diabos está causando isso. Olha, eu fiquei com medo, juro...

- Tem coisa por trás disso. – Falou Mané Galça.

- Sim, sim mas temos que fazer algo – Falou com certa impaciência Idelfonso Velho.

- Eu acho que a gente fique de tocaia para ver o que é que está causando essa merda toda. – Propôs Idelfonso.

- Isso isso. Vamos pegar esse filho d’uma égua. – falou um empolgado e subitamente corajoso Pedro Urutubal.

- Vamos fazer isso. E vamos fazer essa noite mesmo. – Com genuína coragem falou Mané Galça.

O dia terminou ... a luz do dia foi embora e com ela a noite chegou. As sombras da noite submergem o vilarejo em incertezas, medo e coisas que ainda não foram nomeadas.

IV

Nessa noite Mané Galça, Fabiano e Pedro Urutubal, após algumas discussões, decidiram que ficariam de tocaia no campanário da igrejinha, que era o lugar mais alto do vilarejo. Dali poderiam ver boa parte das casas, ou melhor falando, tentariam, já que o máximo que conseguiam ver das casas era a fraca iluminação das lamparinas que escorria por baixo das frestas de portas e janelas. Não daria para ver o campo de futebol e nem o caminho que levava ao Riacho das Pedras.

Dijé decidiu que não ia ficar sozinha e foi para a casa de Dona Pedrinha, achava que com ela por perto o medo poderia ser menor. Em sua casa Idelfonso Velho ficava matutando o que iria acontecer essa noite. Os filhos de Fabiano dormiram todos amontoados em duas camas junto com a mãe, menos Carlinhos que dormiu em sua rede chateado porque seu pai não deixou ele ir para a tocaia, argumentando que isso era trabalho de homem e não para moleque. Gito foi deitar pensando porque não convidaram ele para ir para a tocaia. Os moradores do pequeno vilarejo foram dormir. Todos com a expectativa de que algo iria ocorrer.

No campanário da igrejinha os três vigilantes falavam baixo e tentavam espantar o frio fumando e bebendo alguns goles de cachaça.

- Não dá para ver quase nada daqui. A gente tem é que descer. La embaixo da para gente ver melhor. –Falou Fabiano com determinação.

- Humm... acho melhor a gente ficar aqui. Seja lá o que diabo for aparecer lá embaixo acho mais seguro aqui. – Ponderou Mané Galça sendo prontamente apoiado por Pedro Urutubal.

A noite avançava e nem gritos e nem pedradas aconteceram. Os três no alto da igrejinha já estavam cansados de tanto espremer os olhos e os ouvidos. Choveu de madrugada e o frio aumentou. Foi uma chuva passageira, mas colaborou para deixar o vilarejo com uma aparência mais assustadora. Pedro Urutubal torcia para o dia amanhecer logo. Na casa de Dona Pedrinha, Dijé acordava ela para perguntar onde tinha um urinol porque não se aguentava mais. Gito dormia a sono solto. Guida acalentava Detinha toda espremida com os irmãos na mesma cama.

O sol nasceu e com ele a possibilidade de uma volta à normalidade. Não foi isso que aconteceu.

Bem cedo todos perceberam que suas casas tinham uma mancha vermelha nas portas ou janelas.

- Como fizeram isso? – Falou um morador

- Passaram uma tinta vermelha na porta de casa. Uma merda de tinta estranha – reclamou um outro.

- Ficamos no alto da igreja a noite toda vigiando e não vimos nada. – Disse Fabiano meio que se justificando.

- Não vimos nenhum vulto e nenhuma barulho estranho, a não ser os que a gente já conhecia. – Completou Pedro Urutubal

Essa conversa estava ocorrendo bem na frente da igrejinha. Era nítido que o medo ganhou novas proporções.

- Alguma maldição está acontecendo aqui. Não eram só vocês que estavam vigiando. Eu fiquei em casa sentado com um facão na mão a noite toda e até arrisquei dar uma olhada lá fora. E eu não vi e nem escutei nada. – Falou um sujeito que morava depois do campinho de futebol.

- Gente, vamos dormir todo mundo na igreja essa noite. – Falou um morador cuja casa era a mais afastada do povoado.

- Não não não! Vamos é dar uma batida em tudo quanto é lugar hoje à noite. Vinte de nós todos juntos –Era Pedro Urutubal quem falava.

- Não! Assim a gente termina é deixando de dar batida em alguma casa. –Falou o morador que morava perto do campinho.

- Porque não ficam dois homens na frente de cada casa? Assim quase todas as casas poderão ser vigiadas e o resto de nós vai tudo para a igreja passar a noite. Propôs Gito que chegou nesse instante.

Conversa vai e conversa vem terminaram decidindo que quinze homens ficariam andando pelo povoado a noite toda. E assim fizeram.

V

Idelfonso Velho deu uma espingarda para Fabiano, era a única arma de fogo que existia no lugar, e era bem velha já. Pedro Urutubal, Mané Galça e mais doze homens se armaram com facões e paus. E assim iniciou-se uma noite de vigilância pelo povoado. Não chovia o que já era de grande ajuda. O pequeno grupo ficava andando pelas ruas do povoado, conversam baixo, de vez em quando bebiam uns goles de cachaça. Usavam lampiões para iluminar sua jornada. Passaram pela igreja, pelo campinho e foram até as casas mais distantes. Andando em grupo o receio de encontrar alguma coisa desconhecida pela frente terminava sendo um pouco diluído. Fabiano achava que dar uma batida em grupo pelo povoado até que era uma boa ideia, Gito gostou de ter sido convidado para fazer parte do grupo que ia ficar vigiando. Pedro Urutubal sentia-se corajoso. Em sua casa Dona Pedrinha rezava, sentia-se fortalecida pelo fato de haver vários homens andando pelo vilarejo a noite toda. Maria de Lourdes pensava em sua paixão escondida por Pedro Urutubal e torcia para que nada acontecesse nessa noite. Dona Dijé se perguntava que mistério era esse que se abateu sobre eles.

As horas escoavam e nada parecia acontecer. O clima de camaradagem entre os vigilantes ajudava a diminuir a tensão inicial das primeiras horas da noite. O vilarejo estava em silêncio. Mais uma hora e o dia amanheceria.

Perto do amanhecer os galos do vilarejo não cantaram. Não cantariam mais. Foi o morador que tinha a casa mais longe do vilarejo que percebeu a ausência do canto dos galos. Rápido os vigilantes se espalharam em três grupos e constataram, com horror, que todas as criações de patos e galinhas tinham morrido, alguns porcos também, curiós em gaiolas, cães e gatos. Apenas as vacas de Fabiano tinham sido poupadas.

Choque, raiva, medo e desespero se espalharam como rastilho de pólvora entre os moradores. Incrédulos e sem conseguir entender constataram que os animais simplesmente morreram. Anoiteceram saudáveis e amanheceram mortos. Nenhuma gota de sangue derramada, nem um pio, cacarejo, latido ou miado foi ouvido.

- Isso é obra do tinhoso. Tem uma maldição aqui nesse lugar. Meu Deus, não fico aqui nem mais um dia. – Desesperada falou a nora de Idelfonso Velho.

- O que vai acontecer agora? Todas as plantações vão amanhecer queimadas? – Gito falava e gesticulava muito. Seu nervosismo era o nervosismo de todos.

O vilarejo se encontrava em polvorosa. Não se falou em outra coisa que não fosse a morte de todas as criações sem que ninguém ouvisse um único barulho. Para Dona Pedrinha as vacas de Fabiano foram poupadas porque eram animais que estavam ao lado da manjedoura de Nosso Senhor. O medo se espalhou entre as pessoas do povoado. Ninguém mais ia sozinho a lugar nenhum. Todas as casas tinham os seus banheiros do lado de fora e Guida, assim como muitos, só ia ao banheiro se aliviar se fosse com um dos filhos. Os moleques do povoado, acostumados a ir ao Riacho das Pedras para tomar banho e brincar nem saiam de perto de suas casas. Ninguém sabia o que fazer. E logo mais iria anoitecer de novo ...

VI

A noite veio inexoravelmente...e encontrou as pessoas do povoado todas dentro da igrejinha. Foi sugestão de Dona Pedrinha e ninguém contestou porque não se tinha mais nenhuma ideia, e além do mais ali debaixo da proteção de Nosso Senhor todos se sentiam melhor. Mais de oitenta pessoas espremidas na pequena igreja. Muitos rezavam. As horas se passavam. Conversas fluíam baixinho, cigarros de palha espalhavam sua fumaça dentro da igreja, crianças estavam mais quietas do que o normal.

VII

As horas se passaram. A madrugada avançou. Amanheceu o dia e nada aconteceu. Aos poucos os moradores foram constatando que nada de anormal havia acontecido. Muitos continuavam na igreja durante boa parte do dia. Mas mesmos estes terminaram indo para as suas casas.

Uma outra noite chegou e nada de estranho aconteceu. Passaram-se dias e nada de estranho ocorreu. Mesmo assim poucos eram os que iam dormir que não reforçavam suas orações. Aos poucos a inquietação e o medo foram dando lugar a dúvidas e especulações.

-Tenho certeza que isso era obra do Sem-nome. As vacas do Fabiano foram poupadas porque ...

- Para, Dona Pedrinha! Todos os bichos são de Deus. Porco, galinha, até minhoca do chão. – Com nítida impaciência falou Maria de Lourdes.

- Mas não era coisa boa. Tenho é medo que isso que isso volte um dia para terminar o serviço.

- Que serviço? Tu estais doida! Não diga isso. Isso foi embora e não volta mais, tenho fé em Deus. – Ao falar isso Pedro Urutubal lembrou do terror que foi passar aquela noite no campanário da igreja.

- Isso foi feitiço. Pode reparar que ninguém nunca viu nada – Fabiano expunha sua teoria –Alguém que mora aqui colocou um feitiço.

- Alguém que não gosta daqui, que não gosta de nós. Gente com inveja.

- Inveja do que? De gente pobre? Besteira isso. – Tentou ponderar Dona Dijé.

- Nessa mata tem muita coisa. Já tinha essas coisas aqui antes da primeira casa ser levantada. Tomara que nunca mais volte. – Idelfonso falava sem muita convicção.

VIII

O tempo passou. Os dias foram sucedidos por meses que deram lugar a anos. Guida teve mais um filho e Fabiano passou a criar porcos. Carlinhos foi servir o exército na cidade grande e terminou indo lutar na Itália. Gito passou a beber menos. Maria de Lourdes engravidou e alguns diziam que o filho não era de Gito. Pedro Urutubal casou com uma moça de um outro vilarejo. Idelfonso Velho passou a ter longas conversas com Mané Galça. Dona Dijé aceitou ser madrinha do filho de Maria de Lourdes. Dona Pedrinha conseguiu que o Padre Justo passasse a realizar duas missas ao mês.

Os anos passaram. O povoado cresceu e virou uma cidade. Os poucos mais de 80 moradores transformaram-se em mais de 100 mil habitantes. O campinho de futebol deu lugar a um conjunto residencial. A igrejinha não existe mais, muitas igrejas agora existem. O caminho para o Riacho das Pedras se transformou em uma rua de comércio. O pequeno vilarejo não é mais um lugar distante de tudo. Uma rodovia integra ele a outras cidades. Os moradores agora não se conhecem todos, existindo toda uma complexidade social impensável para os antigos moradores.

Nunca mais os eventos que assombraram o pequeno vilarejo se repetiram. Os fatos que ocorreram foram contados pelos pais aos seus filhos, mas com o passar dos anos foram caindo no esquecimento e terminaram por se transformar em uma história contada para crianças na hora de dormir.

Foi assim que eu ouvi essa história de minha bisavó Detinha quando ela colocava a gente para dormir.

Jota Alves
Enviado por Jota Alves em 25/02/2018
Reeditado em 02/11/2018
Código do texto: T6263522
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