O DUENDE DA AGONIA
 
 
─ Tome cuidado. ─ Avisou Helena, minutos antes de desaparecer na enchente.
Cesar observou com muito cuidado a água subir até inundar todo o primeiro andar da casa.
─ Ninguém vai vir filho, vamos morrer afogados.
─ Mãe. Estou com medo.
─ Eu também filho.
Enquanto subiam a escada, a parede ao lado deles cedeu, Marcela escorregou no piso molhado e caiu no buraco que se abriu, sendo esmagada pelas pedras que vieram sobre ela. Cesar observou o corpo da mãe desaparecer entre o barro e as pedras.
─ Oi Cesar... ─ Ouviu uma voz sussurrar de dentro da água.
─ Quem é? ─ Perguntou assustado olhando para água barrenta.
Dois olhos verdes submergiram na sua direção, maiores do que qualquer olho que já tinha visto, eram ovalados e muito parecidos com olhos de gato. Cesar deu um paço para trás e se agarrou a uma pilastra.
─ Sua mãe morreu não é mesmo... não é mesmo. ─ Uma voz distorcida divagou.
Cesar fez que sim começando a chorar.
─ Não chore criança. Não-chore-agora... ─ Gargalhou, fazendo subir um monte de bolhas para a superfície.
─ Eu vou morrer? ─ Engasgou o menino, subindo mais um degrau.
A coisa dentro d´água não respondeu, piscando os olhos.
─ Não-não-não-não... não... ─ Respondeu num tom agudo abafado pela água.
Cesar franziu a testa ao ver que a coisa era maior do que pensara.
─ Pode se aproximar garoto, não quero que fique com medo de mim.
­─ Mamãe. ─ Berrou Cesar, paralisado e em desespero.
Ele subiu mais um degrau quando água começou a bater na sola do seu pé. A chuva desabava com força, sem piedade, era possível ver pelo buraco na parede que muitas casas haviam sido destruídas pela chuva, entre a tempestade, várias vozes pedindo socorro.
─ Saí daqui! ─ Gritou, ameaçando a coisa com o pé.
Uma dúzia de dentes surgiram debaixo d´água, vindo na direção da sua perna e quando se aproximaram o suficiente, Cesar subiu mais um degrau. ─ Não quer sua mãe. Entre dentro d´água. Entre aqui comigo. Será divertido moleque.
─ Não! ─ Respondeu Cesar.
Cesar viu a mão de sua mãe submergir próximo da coisa, em seguida ouviu a voz dela, num tom calmo, como se estivesse tudo bem.
─ Desça filho, desça e entre na água. Entre na água.
Havia algo de errado com aquela voz, parecia um pouco rouca, e artificial, como se estivesse falando por um telefone.
─ Mamãe, está ai dentro.
─ Estou sim filho. O duende me salvou. Estou bem. Venha comigo... venha para dentro da água.
Uma luz ascendeu-se embaixo d´água, uma luz fosca como chumbo. A luz começou a brilhar em tons escarlate-acinzentado e depois clareou a um verde hipnotizante.
─ Meu querido... ─ Falou uma voz diferente, mais grave e distorcida, próxima da voz de sua mãe, mas diferente.
Cesar ameaçou colocar o pé na água, mas subiu, correndo para o andar superior. Enquanto corria, notou os olhos desapareceram dentro d´água. Horas depois, Cesar ficara preso no quarto com a água entrando pelo vão debaixo da porta. Algo bateu na porta de seu quarto com força, e em seguida uma mancha de sangue escorreu misturando-se a água suja. Havia uma única janela no quarto, mas estava lacrada por diversas madeiras. ─ Está ouvindo. ─ Disse uma voz do outro lado da porta.
─ Está ouvindo Cesar. Estou chegando.
A água começou a correr com mais força, lixo, barro e sujeira escorriam para dentro do quarto, até que uma garra surgiu pelo vão da porta. A garra apertou a madeira podre fazendo um estalo seco, em seguida começou a aranhar a madeira com força. ─ Está ouvindo isso garoto. Ouvindo-vindo-vindo. ─ Ecoou uma voz, latejando em sua mente.
Cesar se afastou da porta, olhando para a janela lacrada e tentou colocar alguns panos debaixo da porta, mas a correnteza o impedia que conseguisse tampar o vão.
Quando o quarto já tinha água suficiente para tocar a altura do seu tornozelo, viu os mesmos olhos de antes surgiram próximos da porta. ─ Cesar... ─ Sussurrou debaixo d´água.
Um vórtice d´água se abriu próximo da coisa e então pode ver uma cabeça deformada surgindo, cheia de sulcos e buracos avermelhados e os mesmos olhos grandes. Cesar puxou uma das madeiras da janela até que conseguisse arranca-la, em seguida colocou a mão para o lado de fora. Seus olhos espelharam o céu nublado até que perdesse toda a esperança, minutos depois, a casa ruiu.
Vinícius N Neto
Enviado por Vinícius N Neto em 25/08/2018
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