MISERÁVEL
 
Ele vomitou sobre a calça os restos de comida podre que tinha comido a alguns minutos. Sabia que não deveria ter feito aquilo, mas estava com fome, suficiente para não se importar com o gosto. Enquanto percorria as ruas de São Paulo, vestido apenas com uma blusa rasgada e uma calça de moletom velha, ele conheceu Mefistófeles, que se apresentou como sendo o filho de um renomado musico de Jazz dos anos oitenta, do qual não revelou o nome.
Mefistófeles ofereceu-lhe um teto, fartura, dinheiro e todo prazer que conseguisse imaginar. O mendigo miserável observou a conivência de Mefistófeles e mesmo desconfiando aceitou, sem saber o que poderia querer em troca. O homem de terno vermelho escuro, deu-lhe um contrato e o fez assassinar com sangue. No dia seguinte, o mendigo chamava-se Humberto Riviera do Carmo, patrono de um grande museu do qual quando era mendigo nunca tivera a oportunidade de entrar. Humberto, não sabia como, nem quando, mas de repente estava repleto de homens e mulheres da alta sociedade, isso de uma noite para a outra, logo após Mefistófeles desaparecer na escuridão derradeira.
Vinte anos se passaram daquele dia, e Mefistófeles retornou a Humberto que havia se tornado presidente de uma grande empresa de marketing. Mefistófeles encontrou-o em casa, com sua mulher e filhos, desta vez, apresentou-se como sendo um rapaz jovem, um moreno alto de olhos claros usando uma cartola medonha e uma bengala. Humberto quase não deixou entrar em casa, mas permitiu após se lembrar de seu nome. Com horas de conversa em seu escritório, Mefistófeles ordenou a Humberto que se desfizesse de tudo aquilo que ganhou, seu título no governo, seu dinheiro, sua família e voltasse ao lixo de onde veio. Humberto retrucou falando ser impossível, então Mefistófeles lhe deu três dias para se despedir de tudo aquilo que tinha. Em seguida, foi até a porta e desapareceu na tempestade.
Três dias se passaram, tão rápido como um piscar de olhos, Humberto preparou-se fortemente para vinda de Mefistófeles, contratou uma armaria que o guardasse vinte quatro horas por dia. Antes da meia noite daquele dia, Humberto lembrou-se do gosto da comida podre que havia comido a muito tempo e que o fizera vomitar, lembrou do sofrimento e da dor que passava diariamente, todos os dias, e durante aquele desespero Humberto percebeu que tudo que tinha não significava nada, pois havia perdido o sentido da vida, ele podia ter conseguido tudo o que mais desejava, mas eram todas coisas artificiais, Humberto havia vivido uma mentira, moldada por Mefistófeles. Ainda em casa Humberto pediu que todos saíssem, até sua família, então foi se deitar. Dormindo, sonhou com Mefistófeles, desta vez apresentava-se como um mendigo sujo. Humberto aproximou-se de Mefistófeles, entregando-lhe todas as suas riquezas, Mefistófeles sorriu, e aceitou de bom grado tudo que tinha dado para ele de volta.
Na manhã seguinte, o mendigo acordou deitado ao lado de uma lata de lixo, fedendo, com fome, com sede e com frio, mas feliz, e maravilhado, pois sua vida voltara a ser como deveria. Mefistófeles continuou observando por muitos anos até morrer enterrado como indigente. Então visitou o seu tumulo, entregando-lhe o contrato que havia assinado, nele o mendigo abdicaria de apenas uma coisa no final da vida, sua alma...
Vinícius N Neto
Enviado por Vinícius N Neto em 27/08/2018
Reeditado em 28/08/2018
Código do texto: T6432041
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