Os Mestres da Mortalha

Manoel, um jovem estudante de 15 anos de idade, de 1,72m de altura, cabelo loiro, olhos verdes, pesando 65Kg, trajando uma camiseta de malha azul escuro, calças jeans e tênis preto, entrou na Biblioteca Municipal da cidade onde morava.

A princípio, o rapaz estava procurando por um bom livro da qual ele pudesse tirar uma base para escrever uma redação na próxima prova de História da escola onde estudava. Quase sempre, naquele período do ano, o pedido de uma redação vindo do seu Professor de História pegava os novatos de surpresa. E alunos como Manoel, que já estavam acostumados com “a redação surpresa pedida pelo Professor Fernandes”, se preparavam com antecedência para tal acontecimento. O jovem entrou na sala errada, onde estavam os livros de religiões diversas. Mas antes de sair e procurar a sala correta, um livro lhe chamou a atenção: Um livro grande, com capa de couro preta, sem dizeres na lombada e cuja capa continha o título: (O Livro Secreto dos Mestres da Mortalha). Prontamente, ele pensou: “Se é secreto, por que está em uma biblioteca pública?”. Quando ele pensou em abrir do livro só pra dar uma rápida olhada, um homem aparentemente muito idoso, magrelo, bem alto (devia ter quase 2 metros de altura) careca, com estranhos olhos cinzentos, semblante sério, trajando um terno preto, camisa azul-marinho, uma gravata cinza e sapatos de couro pretos, lhe tocou o ombro e disse:

- Cuidado! Tudo o que tem o título de “secreto” é por algum motivo muito forte. Acredite em mim. Não mexa no que você não conhece.

Um pouco intimidado por aquele que poderia ser um funcionário da biblioteca, ou um simples louco assustando os visitantes, Manoel disfarçou e foi ao banheiro. Ficou um tempo ali dentro e voltou no local onde ele viu o livro. Mas onde estava o livro, estranhamente estava outro livro diferente sobre umbanda. Ele pensou: “Alguém pegou o livro.” Prontamente, o rapaz foi até o balcão e pediu:

- Moça, alguém levou pra casa o livro secreto dos mestres da....

- Da?

- Mortaria, ou Mortilia, uma coisa assim, não consigo me lembrar.

- Ha! Ha! Ha! Ha! Ha! Como é que é?

- É aquele que estava há minutos atrás na prateleira 4B da sala 2.

- Deixa eu ver o cadastro aqui no computador. De acordo com o cadastro, os livros da prateleira 4B da sala 2 são 4 sobre umbanda, 5 sobre espiritismo, 3 sobre budismo, e 6 sobre candomblé.

- Só tem essa prateleira 4B na sala 2?

- Sim, só temos uma sala 2 e ela só tem uma prateleira 4B.

- Será que eu errei de prateleira. Eu sei que eu estava na sala 2.

- Analise a posição em que você estava na sala. As letras das prateleiras são de acordo com a posição delas, Parede A, Parede B e Parede C. No meio estão as prateleiras D e E. Os números são relacionados à altura da prateleira, A primeira de baixo pra cima e a 1 a segunda de baixo pra cima é a 2 e assim sucessivamente até chegar na 6 que é a mais alta. As salas são numeradas por temas, Ficção Científica: Sala 1, Religiões e Seitas: Sala 2, Matemática, Física e Química: Sala 3, Português e literatura em geral: Sala 4, Assuntos Jurídicos: Sala 5, Geografia e Geologia: Sala 6 e por último, História em Geral: Sala 7

- Eu posso até ter errado então a letra da prateleira, mas pela altura se não era 4, era 5. A sala eu tenho certeza que era a 2.

- Não entrou na 1 por engano? E se o livro que você procura for de ficção científica?

- Pode ser... Mudando de assunto, havia um senhor bem alto, magro, careca e com olhos estranhos de terno preto na sala onde eu estava. Ele costuma frequentar a Biblioteca?

A balconista prontamente fechou o semblante, demonstrando medo e ódio no olhar. Trêmula, ela deu um soco no balcão e gritou:

- Some daqui, seu pivete!

- Espera... eu só...

Ela apertou um botão debaixo do balcão e um segurança veio torcendo o braço do menino e o jogando pra fora da Biblioteca Municipal. Ao ser jogado no chão, ele perguntou ao segurança:

- Mas o que aconteceu?

O segurança bateu o pé no chão e disse:

- Some daqui, moleque safado!

Sem entender nada, Manoel voltou para casa sem o material que precisava para a sua redação.

Ao chegar em casa, todos pareciam meio estranhos. Seus pais, seu irmão mais novo (Marcos de 9 anos de idade) e até Marieta, a faxineira o tratavam com rispidez. Na hora do almoço, Manoel estava uniformizado e pronto para ir à escola, como todos os dias da semana o fazia. Porém, diferente dos outros dias, a TV estava desligada, ninguém conversava com ninguém. Todos davam curtas olhadas para Manoel com o olhar semicerrado e depois rapidamente voltavam a olhar apara os respectivos pratos. Incomodado com aquele clima estranho, o adolescente perguntou:

- Mãe! O que aconteceu que está todo mundo me olhando assim? Eu fiz ou disse alguma coisa errada?

De repente, a mãe do rapaz, bateu com a mão direita fechada sobre a mesa, segurando o garfo com a ponta para cima e olhando com olhos arregalados para o filho, disse em tom autoritário:

- Slovê ir Gália Saulot!

Em seguida o seu pai fez o mesmo, batendo com a mão direita fechada sobre a mesa, segurando o garfo com a ponta para cima e olhando com olhos arregalados para o filho, disse em tom autoritário:

- Slovê ir Gália Saulot!

Em seguida, o seu irmão mais novo repetiu o gesto, olhou com olhos arregalados para o irmão e igualmente disse:

- Slovê ir Gália Saulot!

A faxineira, que almoçava com a família, repetiu o gesto logo em seguida, olhando também com olhos arregalados para Manoel, disse:

- Slovê ir Gália Saulot!

Assustado, o menino disse:

- O que está acontecendo?

Então a expressão facial de todos à mesa exceto a de Manoel se tornou de fúria, enquanto eles encaravam o adolescente e diziam em côro:

- Slovê ir Gália Saulot! Slovê ir Gália SAULOT! SLOVE IR GÁLIA SAULOT!

Aterrorizado, Manoel gritou:

- Parem! O que estão fazendo!?

De repente ele acordou e viu que estava ainda na madrugada do dia 15. Ou seja, tudo o que aconteceu desde a ida até a Biblioteca Municipal até o almoço foi só um pesadelo muito realista. Ele não conseguiu dormir até o amanhecer.

Na manhã seguinte, ele resolveu ligar o notebook pra pesquisar a frase que ele viu no sonho:

[ Slovê ir Gália Saulot ]

Ele não encontrou nada que fosse coerente ou consistente. Até que resolveu pesquisar palavra por palavra:

[ Slovê ] > [ Do idioma Lituano = Glória ou Glorificado ]

[ Gália ] > [ Do idioma Lituano = Poder ]

Quando ele pesquisou:

[ Saulot ]

Levou o maior susto ao dar de cara com a descrição de uma divindade satânica!

[ Nascido como um mero mortal, sua primeira alcunha foi a de filho da lua rubra, um título dado pelos bárbaros de dentes serrilhados, para aquele que nasce sob uma noite crepuscular e que, portanto, traria maldição e morte aos seus inimigos. Mostrou, desde cedo, a sua incapacidade no treino com armas e uma mente aguçada para estudos sobre o oculto. Um destino conflitante para os bárbaros sanguinários do lugar onde ele nasceu.

Desprezado e humilhado pelos grandes guerreiros da tribo, Saulot descobriu sua extrema capacidade no uso de magias. Tão cedo tornou-se um tutor na Ordem Arcana de Mordae, onde iniciou sua jornada na escola de especialização que seria a responsável pela transformação completa de tendência e atitudes do mesmo. Sob a alegação de ser o primeiro disciplinado nas artes arcanas que regiam sobre a vida e a morte, Saulot tornou-se um necromante.

A necromancia é a suposta arte de se comunicar com o mundo espiritual para obter informações do passado, do futuro ou do pós-vida por meio da evocação dos mortos ou dos espíritos destes, utilizando-se ou não dos restos mortais que pertenceram a outras pessoas.

Buscando um jeito de burlar a própria morte, Saulot chegou aos indícios da localização do Necronomicon, o livro que carrega o melhor conhecimento sobre a necromancia. No plano do Abismo ele encontrou o livro dos mortos e tornou-se então imortal.

Afetado pela insanidade provocada pela leitura do Necronomicon e pela jornada no Abismo, não demorou até que Saulot recebesse o título de Senhor das Hordas Trôpegas, logo após profanar o cemitério dos heróis de outrora. O necromante, então, provocou a hecatombe na Quarta Era e foi aprisionado no próprio Abismo, na Garganta de Astaroth, através do sacrifício de Santo Fectos, atual representação da essência de Lorde Splendor.

Saulot é eterno perseguidor da essência de Zeiram. Seu culto, A Mortalha, prega que o senhor das hordas trôpegas, enfim, a encontrou e espera o momento certo para agir. Se os adoradores de Saulot têm razão, ele tomaria, então, o posto de divindade primordial. ]

Ao acabar de ler a matéria escrita na tela do computador, o rapaz exclamou:

- Jesus Cristo!

Uma voz tenebrosa vinda por trás dele disse em tom autoritário:

- Eu avisei!

Manoel olhou pra trás e só viu os objetos do quarto. Nenhuma pessoa além dele estava ali. Pelo menos, nenhuma pessoa que ele pudesse ver. A frase que seus parentes e a faxineira da casa disseram em seu realístico sonho, agora fazia sentido! Eles estavam glorificando uma divindade satânica! Manoel passou o dia todo perturbado com aquilo, pensando: “Foi só um sonho! Foi só um sonho! Mas peraí! Se foi só um sonho, como é que a divindade existe de verdade? Foi coincidência! Mera coincidência!”

O já esperado pedido surpresa de uma redação sobre História Mundial veio do professor, tão certeiro quanto um ovo vem de uma galinha. Sem conseguir pensar em outra coisa, o menino escreveu sobre o que viu na internet de manhã. Ele pensou: “O que uma divindade satânica tem a ver com História Mundial? Vou levar uma bomba, quer ver?” Mas para a surpresa dele, veio uma nota 10. O professor ao ler a redação do menino, disse:

- Parabéns, Manoel! Nunca vi um texto tão bem detalhado. Merece um dez com louvor!

A palavra “louvor” bagunçou a cabeça do rapaz. Ele pensou: “Será que o Professor Fernandes é devoto de Saulot?” Trêmulo e suando frio, o rapaz perguntou com um sorriso amarelo:

- Ér... como assim? “Com louvor” ?

Sorridente, o Professor respondeu:

- Significa que eu adorei a tua dedicação em pesquisar detalhadamente sobre um Deus Ancião.

- Ah! Que bom, Professor!

A frase “eu adorei” misto ao sorriso sincero e simpático daquele idoso professor o aterrorizou e o fez pensar no assunto durante o resto do dia.

Voltando do horário o recreio, antes de entrar na sala de aula, Manoel viu o estranho homem da Biblioteca Municipal no corredor da escola conversando com o Professor Fernandes! Desta vez, o idoso sinistro estava trajando uma bermuda bege, tênis azul escuro, camiseta de malha amarela e usava um par de óculos de aro fino sobre seus olhos que desta vez eram azul-claro. Inerte ao ver o idoso, Manoel andou vagarosamente até eles. De repente, o idoso sinistro sorriu ao ver o adolescente e disse:

- Ah! Esse menino é filho do meu ex-aluno, Ronaldo! Vem cá, menino!

Quando o rapaz chegou perto, o idoso o abraçou e disse:

- Lembra de mim?

Assustado, o jovem respondeu:

- Sinceramente não, Senhor.

- Também, faz 7 anos que a gente não se vê. Meu nome é Sandro. Eu fui na tua casa em 2011 no aniversário do teu pai. Eu até levei o meu neto, Joãozinho, lembra dele?

- Lembro! Então o Senhor é o avô do Joãozinho que eu conheci há 7 anos!

- Isso mesmo!

Aliviado ao lembrar-se que aquele que até então era um sinistro e misterioso ser, nada mais era do que o avô do seu amigo de infância, Manoel pensou: “Então é isso! A minha imaginação fértil pegou a imagem de um sujeito que eu não via há sete anos e montou aquele pesadelo!”

Com parte do grande mistério desvendado, ele entrou todo sorridente e feliz na sala de aula.

Naquela noite, outro sonho sinistro o perturbou: Seu amigo de infância, Joãozinho e o avô dele, estavam indo com ele a um passeio pelo Parque Nacional. Os três foram até a infame Caverna dos Ursos, de onde surgiram vários relatos de pessoas desaparecidas, provavelmente devoradas pelos ursos do Parque. Como ele nunca entrou na tal caverna, um misto de medo e curiosidade invadiu a mente dele. Quando entraram na enorme caverna, os três acenderam suas lanternas e foram descobrindo aos poucos, que depois da entrada da caverna havia um enorme labirinto, o que explicava tantos desaparecimentos. Os caminhos da caverna foram se tornando um pouco mais estreitos e direcionados, como se tivessem sido escavados por alguém. Manoel sentiu uma forte vontade de sair correndo dali, mas por medo de se perder foi acompanhando o seu amigo de infância e o avô dele. O trio chegou a uma porta feita de ferro com detalhes em madeira e alguns rubis enfeitando a porta em posições estratégicas. O idoso pegou uma chave no bolso, abriu a porta e revelou um templo satânico! Velas vermelhas de 40cm de comprimento por meia polegada de espessura colocadas em castiçais de um metro de altura ornavam e iluminavam o lugar. Uma estátua de Saulot de 3 metros de altura estava a exatos 3 metros de distância do caldeirão.

Um homem estava nu, gritando por sua vida enquanto estava sendo “cozido” em um enorme caldeirão, sendo oferecido como sacrifício ao deus Saulot. Manoel tentou fugir dali, mas a porta simplesmente desapareceu. Joãozinho, o avô dele e todos os outros homens presentes em volta do caldeirão, exceto Manoel começaram a abafar os gritos de dor do sacrificado ao gritarem em côro:

- Slovê ir Gália Saulot! Slovê ir Gália Saulot! Slovê ir Gália Saulot! Slovê ir Gália Saulot! Slovê ir Gália Saulot!

Manoel ficou paralisado de medo e percebeu que a fumaça do caldeirão começou a entrar em suas narinas, sufocando-o. Ele acabou desmaiando sufocado pela fumaça.

O adolescente acordou em pânico! Sufocado, sentiu falta de ar, levantou-se da cama e foi logo abrindo a janela. O rapaz respirou fundo e aos poucos a respiração dele foi voltando ao normal. O céu escuro denunciava o fato de que ainda era madrugada. Do galho e uma árvore, uma coruja olhava para ele nos olhos com um olhar tão intenso e perturbador, que ele instintivamente fechou a janela. A coruja começou a piar. Ele ligou um abajur que há muito tempo não usava. Dormiu com a tímida e suave luz do abajur acesa. Estranhamente, na manhã seguinte, o abajur estava apagado. Ao verificar o que aconteceu, o menino percebeu que a lâmpada estava queimada. Perturbado com o sonho, Manoel foi à Biblioteca Municipal. Ao contrário do primeiro sonho, o balconista era um homem quarentão. Com medo de ser escorraçado com ele foi no sonho, o menino perguntou de forma tímida e gentil:

- Ér... O Senhor... Por um acaso teria.... Alguma coisa aí sobre... Um demônio.... Chamado... Saulot?

O balconista sorriu e disse:

- Claro! O Vampiro Saulot! Tem uma prateleira cheia de livros sobre ele. Vários jogadores de RPG perguntam por este personagem. Os livros estão todos na seção de ficção científica, na prateleira 3C. Vai lá.

- O Senhor não tem medo dessas coisas?

O homem riu e disse:

- Rapaz! Se eu fosse acreditar em magia negra, demônios, vampiros, duendes, satanismo, essas coisas, eu sairia daqui correndo. No fim do dia, sou eu quem tem que reorganizar todos os livros para o dia seguinte. E você tem que ver a algazarra que certos jogadores de RPG fazem, principalmente nas prateleiras dos livros de satanismo. Nada contra. Se você quiser, vai lá. Pode ler todos eles à vontade. Mas por favor, não desorganiza muito, ok garotão?

Contagiado com a simpatia o balconista, o menino respondeu:

- Ta legal, muito obrigado.

E foi procurar na sala de ficção científica. No exato momento em que ele entrou na sala 1, um detalhe veio-lhe à cabeça como um raio! A Biblioteca Municipal estava organizada exatamente como no seu sonho: As prateleiras com letras de acordo com a posição na sala e números de acordo com a altura. As salas numeradas e nomeadas de acordo com o tema. A posição das salas dos livros era exatamente igual ao sonho, até mesmo o salão de leitura ficava exatamente no mesmo lugar. Assustado com a coincidência, o menino foi logo entrando na sala 1. Mas o que ele viu foram livros sobre um vampiro chamado Saulot, um personagem fictício que nada tinha a ver com a divindade que ele procurava. Então, ele entrou na sala 2 e exatamente igual ao sonho, o livro estava ali, esperando por ele. Com muito medo, o menino aproximou-se, pegou o livro e levou para o salão de leitura. Ao colocar o livro na mesa, ele deu de cara com Sr. Sandro, que distraidamente lia uma enorme bíblia com letras grandes com a ajuda de um par de óculos de aro grosso. Ao ver o idoso, o rapaz cumprimentou:

- Oi Sr. Sandro.

O idoso olhou, sorriu e respondeu:

- Oi Manoel. Que coincidência vê-lo aqui.

- Pois é, que eu estava atrás de um livro.

- Qual livro?

- Um que eu vi num sonho.

E mostrando a capa do livro, o adolescente complementou:

- Esse aqui, ó.

Sr. Sandro ao ver a capa do livro, arregalou os olhos, colocou as mãos sobre a boca e disse baixinho:

- Menino! Isso é coisa do demo! Pelo amor de Deus! Coloca isso de volta na prateleira!

Amedrontado ao ver a reação do idoso, o adolescente colocou o livro de volta na prateleira de origem. Assim que ele voltou ao salão de leitura, Sr. Sandro o chamou:

- Agora vem aqui, vamos conversar um pouquinho.

Manoel sentou-se de frente para o idoso e este disse com as mãos trêmulas de medo:

- Quem te indicou aquele livro?

- Eu vi num sonho.

- Meu Deus! Jesus Cristo tenha misericórdia! Pelo Sagrado Coração de Nossa Senhora! Pela Santíssima Trindade! Olha, meu filho! Com certeza foi um ser do mal que entrou nesse teu sonho e te mostrou esse livro. Vamos fazer o seguinte, eu vou conversar com o teu pai e nós vamos à igreja pra te benzer, ta legal? Com a bênção do Padre Eusébio, você não vai mais ter esses pesadelos. Agora, vamos rezar um pai nosso só pra garantir a bênção de Deus na tua volta pra casa?

- Mas aqui na frente de todo mundo?

- Sim! Não temos que ter vergonha da nossa fé!

Nesse momento, o Padre Eusébio entrou no salão de leitura da Biblioteca Municipal. Sr. Sandro o avistou e chamou:

- Padre Eusébio! Vem aqui, por favor, um minutinho! É um caso de emergência!

Rapidamente, o padre sentou-se à mesa do lado de Manoel e perguntou:

- O que aconteceu, Sr. Sandro?

- Um demônio invadiu o sonho desse menino!

O padre olhou para Manoel e perguntou:

- Mas como isso aconteceu?

- Eu sonhei com essa biblioteca, exatamente como ela é na vida real. E no sonho, eu tentei pegar um livro escrito na capa: “Os Mestres da Mortalha”. Hoje eu vi o livro e cheguei a pegar, mas não abri, pois Sr. Sandro ficou tão assustado ao ver a capa do livro, que eu coloquei de volta sem ler.

O Padre então, deu uma levantada curta de sobrancelha e disse:

- Escutem com bastante atenção. A Mortalha é uma religião satânica da época medieval, onde os praticantes adoram a um demônio chamado Saulot.

Ao ouvir o nome do demônio, Manoel estremeceu de cima a baixo enquanto Sr. Sandro fazia o sinal da cruz em seu peito. O padre continuou:

- Os adoradores desse demônio estão sempre procurando novas vítimas para executar em seus rituais onde eles acreditam que cozinhando pessoas vivas em caldeirões gigantes, eles ganharão a vida eterna. É claro, que eles não ganham vida eterna nenhuma, pois o Diabo veio pra roubar, matar e destruir. E Saulot nada mais é do que um demônio e assim como todos os outros demônios, é servo do Diabo. Portanto, se esse menino sonhou com o livro, temos que rezar e benzer a casa dele toda. Será que eu poderia visitar atua casa agora, rapazinho?

- Claro, Sr. Padre.

Aliviado e sentindo-se protegido pela bênção do Padre Eusébio, o menino voltou para casa, acompanhado do Padre. Ao chegar em casa, o menino foi logo dizendo à sua mãe:

- Mãe! O Padre Eusébio ta aqui!

Madalena, a mãe do menino, uma mulher de 1,65m de altura, olhos castanhos, cabelos lisos e pretos, pesando 52Kg, trajando um vestido simples azul claro e chinelos, veio à porta e disse:

- Ué!? O Padre? Por quê?

- É que aconteceram algumas coisas.

- Você não andou aprontando não, né menino?

- Não mãe, eu só tive um pesadelo muito realista e contei pro Padre.

A mãe do menino sorriu e disse:

- Seja bem vindo, Padre. Entre.

Quando o Padre entrou, a dona da casa foi convidando-o a sentar-se à mesa junto com o seu filho. Ela perguntou:

- Primeiro eu quero saber do meu filho, que sonho maluco foi esse e por que você não contou pra mim primeiro?

- Eu não contei pra você, porque eu pensei que fosse só um pesadelo como outro qualquer. Hoje na Biblioteca Municipal é que eu descobri através do Sr. Sandro, que o livro que eu vi no sonho, e que eu acabei encontrando na Biblioteca é satânico. A Senhora lembra-se dele, não é mãe?

- Claro, meu filho! Ele foi professor na escola onde eu e o teu pai fomos alunos. Agora ele está aposentado. E como o Sr. Sandro sabia que o livro que você viu no sonho e depois viu na biblioteca era satânico?

- O Padre Eusébio quem explicou. Aí o Padre quis vir aqui pra benzer a nossa casa pra eu não sonhar mais com o livro.

Madalena deu uma olhada para cima e pensou: “Que criancice, meu Deus!” e disse olhando com a sobrancelha direita levantada para o Padre:

- E quanto o Senhor Padre vai cobrar por este serviço?

- Nada, Senhora. Só quero livrar o teu filho desta maldição.

Olhando para a mesa com um sorriso maroto, Madalena disse:

- Muito bem, pode começar então.

- Primeiríssimo de tudo, todos os moradores desta casa devem a partir de hoje tomar por regra, rezar todas as manhãs, antes do café da manhã a oração da manhã.

Ao dizer isso, o sacerdote entregou um papel, onde estava escrito:

”Senhor, no início deste dia, venho pedir-Te saúde, força, paz e sabedoria.

Quero olhar hoje o mundo com olhos cheios de amor, ser paciente, compreensivo, manso e prudente.

Quero ver, além das aparências, teus filhos como Tu mesmo os vês, e assim não ver senão o bem em cada um.

Fecha os meus ouvidos a toda a calúnia.

Guarda a minha língua de toda a maldade.

Que só de bênçãos se encha o meu espírito.

Que eu seja tão bondoso e alegre, que todos quantos se aproximarem de mim, sintam a tua presença.

Senhor, reveste-me da tua beleza, e que, no decurso deste dia, eu Te revele a todos.

Amem.”

O Padre começou convidando a todos a rezar um Pai Nosso e uma Ave Maria na sala. Depois, ele pegou uma candeia, colocou incensos, acendeu e foi de cômodo em cômodo, rezando um Pai Nosso e uma Ave Maria em todos eles, deixando o quarto do Manoel por último. Quando chegou ao quarto do menino, o Padre sentiu um clima pesado, uma forte tontura e uma dor de cabeça fraquinha, porém, irritante. Aquele Sacerdote era muito saudável, porém, quando começou a rezar no quarto do menino...

- Pai Nosso, que estás.....AAAIiiiiiiighh!

Diante do menino e da mãe dele, que assistiu a cena pensando que fosse uma mera encenação, pra ele dizer que o quarto estaria endemoniado, o Padre infartou e caiu duro ali mesmo. Madalena, que era ateu, disse incrédula:

- Ta legal, ô Seu Padre. Agora levanta daí, que está assustando o meu filho.

Como o sacerdote não levantava, a dona da casa insistiu:

- Levanta, senão eu vou chamar a polícia!

A mãe do menino ao ver que o Padre não exprimia reação alguma e ao crer que aquilo não passava de uma encenação, pegou o celular e ligou para a polícia:

- Alô! Tem um padreco aqui na minha casa que está se fingindo de desmaiado pra assustar o meu filho.

- Estamos indo nesse momento, Senhora.

Em 15 minutos os policiais chegaram e ao examinarem o padre, constataram que ele estava morto. Os homens da lei então chamaram o IML e levaram o corpo do recém falecido sacerdote. Manoel ficou aterrorizado ao ver o padre morrer diante dele. Depois que todos os visitantes foram embora, o menino disse à sua genitora:

- Mãe, a partir de hoje eu vou dormir na sala, ta legal?

- Ah! Manoel! Deixa de bobeira! Você realmente acreditou na ceninha do Padre, é?

- Mas mãe! Se foi cena, então porque o IML o levou? E, além disso, a lâmpada do meu abajur queimou no meio da madrugada de ontem pra hoje. E ainda apareceu uma coruja que começou a piar estranho pra caramba.

- Meu filho! Presta bastante atenção! Lâmpadas são feitas pra durar até certo tempo e queimar! Eles fazem lâmpadas assim de propósito, porque se não queimar, eles não vendem outra. Coruja é uma ave noturna e o pio dela é esquisito mesmo! Se você tiver imaginação fértil, vai imaginar que ela ta falando coisas estranhas através do pio dela, mas é tudo fruto daqui, ó (apontando o dedo indicador da mão direita na cabeça do menino) da tua imaginação. E além do mais, se você fosse um pouquinho mais maduro, assim como eu, não ficaria com medinho da encenação daquele padreco e dos amiguinhos que ele tem na polícia e no IML, ta legal? Não me convenceram nem um pouquinho com aquele teatrinho! E vê se fica longe daquela Biblioteca Municipal, porque você tem um computador joia com internet funcionando direitinho pra pesquisar o que quiser. Pelo que eu soube através do Sr. Sandro, você anda bisbilhotando livros sobre demônios e coisas assim. Isso é o que está mexendo com a tua imaginação te fazendo ver demônios onde não existem.

- Ta bom, mãe. Mas a Senhora me dá dinheiro pra comprar outra lâmpada pro meu abajur.

- Madalena olhou o filho nos olhos e disse:

- Eu não ACREDITO que um homem maior do que eu está com medinho de escuro!

- Mas mãe... eu...

- Olha aqui! Eu não criei você pra virar uma mariquinha! Agora esquece o que você viu naquela maldita Biblioteca Municipal e você vai aprender a dormir no escuro igual ao teu irmão, que é 6 anos mais novo do que você! Aja como o homem de 15 anos de idade e com barba na cara que você é!

Manoel passou a mão no rosto e disse:

- Mas eu faço a barba todo dia, mãe.

Olhando para o filho com olhos semicerrados, Madalena respondeu:

- Você entendeu o que eu disse. Deixa de ser palhaço.

Naquela noite, Manoel olhou para as luzes da rua e pensou: “Vou dormir com a janela aberta. Assim não durmo na escuridão total.” Mas começou a chover e com isso, o adolescente foi obrigado a fechar a janela, para não chover dentro do quarto. No meio de uma forte chuva de verão, batidas na janela o acordaram. Batidas cada vez mais fortes, pareciam ser de alguém que estava desesperado. Com muito medo, Manoel gritou:

- Quem é?

A resposta foram as batidas cada vez mais fortes. O menino gritou mais alto:

- QUEM É?

As batidas continuaram. Ao se lembrar do fato de que o seu quarto ficava no segundo piso da casa, Manoel saiu do quarto e foi até a cozinha. Madalena estava sentada à mesa da cozinha tomando um chá. Ao ver a mãe, o jovem exclamou:

- Mãe! Tem alguém ou alguma coisa batendo na janela do meu quarto.

A mulher deu uma olhada rápida pra cima, depois olhou para o menino e disse:

- Certamente é algum engraçadinho pra quem você contou alguma historinha de demônio, querendo tirar sarro com a tua cara batendo na janela com um bambu ou coisa assim.

- Mas mãe, parecia uma mão batendo na janela.

Ela olhou para ele nos olhos com olhos semicerrados, esticou a mão direita aberta e disse:

- Se você me disser que acredita que tem um demônio batendo na tua janela, eu te dou uma “bifa” que tu nunca mais vai esquecer! Agora, vai lá e dá um fora no moleque safado que ta tirando onda com a tua cara!

Contrariado, o menino subiu as escadas, entrou no quarto e viu que as batidas silenciaram. Como a chuva continuava forte, ele preferiu não abrir a janela pra não molhar o quarto. O rapaz deitou-se na cama e dormiu.

Na manhã seguinte, estranhamente a mãe dele não foi acordá-lo. Como fazia em todas as manhãs, ele foi a banheiro tomar banho, escovar os dentes e logo em seguida, fazer a barba. Quando o jovem saiu do banheiro, trajando uma bermuda cinza e uma camiseta de malha azul claro, sentiu um forte cheiro de sangue, misturado a um forte cheiro de carne cozida e temperos de carne. Quando entrou na cozinha, o chão estava todo sujo de sangue. O seu irmão mais novo estava morto e com o tórax aberto em cima da pia. Madalena com os olhos vermelhos, estava cortando pedaços do peito do filho menor, enquanto o coração do menino estava cozinhando em uma panela, o fígado em outra e os rins em outra. No forno, os braços do menino assavam temperados com sódio, alho e pimenta. A cabeça estava jogada na lixeira e as pernas cortadas estavam penduradas no teto da cozinha e ainda sangrando. Ao ver aquilo, Manoel saiu correndo e foi até a delegacia denunciar a sua mãe. Quando os policiais chegaram acompanhados do jovem, encontraram aquela cena grotesca. O coração do irmão de Manoel desta vez estava em um prato, cozido e temperado e Madalena estava com um garfo e uma faca começando a devorar o órgão. Um policial apontou sua pistola para a mulher e disse:

- Levanta daí e joga os talheres no chão!

Madalena levantou-se devagar e olhando nos olhos do policial com o olhar vazio, jogou a faca nele, acertando o pescoço e matando-o na hora! O outro policial atirou nela, mas ela parecia não sentir os tiros. Ela pegou a faca do pescoço do primeiro policial e partiu pra cima do segundo. O terceiro policial atirou nela na cabeça e mesmo com um furo de bala na cabeça, ela deu uma risada sinistra e enfiou a faca no pescoço do segundo policial, matando-o. O terceiro policial deu vários tiros na cabeça dela, destruindo parte da caixa encefálica. Ainda assim, ela degolou o terceiro policial e sangrando muito pelo que restou de sua cabeça, olhou nos olhos de Manoel e disse:

- Agora vamos almoçar, meu filho. Manoeeeelllll Vamos almoçaaaaaaarr!

O jovem acordou com sua mãe na porta do quarto gritando:

- Manoeeeell! Vamos almoçaaarr!

Ao ver a sua mãe inteirinha e sem nenhuma cicatriz ou vestígio de sangue, o menino levou um susto.

- Ai! Cacete mãe!

- Ih! Que susto é esse? Ta vendo no que dá você ficar lendo essas coisas? Já que você dormiu até agora, vamos almoçar pra se arrumar pra ir pra escola.

Manoel foi ao banheiro fazer a sua higiene matinal, depois foi à cozinha e estava tudo limpinho. Como em todos os dias, a comida estava nas panelas, uma com arroz, outra com feijão, outra com batatas, outra com farofa de ovos e uma frigideira com pedaços de frango. O adolescente fez seu prato e como de costume, sentou-se ao lado de Marcos, seu irmão e de frente para os pais. O irmão dele disse:

- E aí dorminhoco? O vampiro bateu na tua janela ontem?

Ao ver a cara de deboche do irmão, o jovem respondeu:

- Vai te lascar, vai!

A mãe repreendeu:

- Manoel! É assim que você trata o teu irmão?

- Ele estava debochando da minha cara.

- Então para de acreditar em historinha de criança que ninguém mais debocha da tua cara. Agora come de uma vez que eu ainda tenho que levar os dois na escola!

Ronaldo, o pai do menino, perguntou:

- Meu filho, que estória é essa que um padre veio aqui rezar a casa ontem a acabou infartando quando entrou no teu quarto?

Madalena se interpôs e disse:

- Ih! Amor! Aquele Padreco daquela igrejola veio aqui e fez uma ceninha fingindo que infartou, aí vieram uns policiais de araque e levaram ele pro IML. Tudo teatrinho. Aí essa besta que já estava com medinho porque viu um livro satânico na Biblioteca Municipal, traumatizou de vez. Já falei pra ele que essas coisas não existem. Ah! E ontem um babaquinha que eu não vi quem é, se eu pego eu meto a mão na cara sem medo de ser presa por agressão de menor, ficou batendo na janela do quarto dele com um bambu e o bebezão pensou que fosse um demônio querendo pegar ele.

Ronaldo deu uma risadinha e disse:

- Meu filho. Se você for acreditar em demônios, duendes, bruxas, vampiros, lobisomens, satanismo, essas coisas, você está lascado! Isso tudo é fantasia, que as pessoas inventaram pra ganhar dinheiro com livros, revistas e religiões. Nada disso é real.

- Mas Saulot existem sim, pai!

- Quem?

- Saulot! Um demônio da antiguidade, que é o Senhor das hordas trôpegas! Ele está me perseguindo! Foi ele quem matou o Padre Eusébio! Foi ele quem bateu na minha janela ontem!

Todos caíram na gargalhada. Assim que acabou de rir, Madalena disse em tom debochado e irônico:

- Então pede para o Senhor da ordem do tropeço, pra te ajudar nas provas de hoje. Tem uma de matemática e uma de geografia. Agora os dois no carro e bora pra escola.

Enquanto Madalena levava os filhos na escola, Ronaldo pegava a sua moto e voltava para o seu local de trabalho, onde ele tinha duas horas de almoço e com a permissão dos seus superiores, vinha com a moto da empresa pra casa almoçar.

Na escola, Manoel não conseguia tirar da cabeça o fato de que a sua família, principalmente a sua mãe, não acreditava no que estava acontecendo. Estranhamente, as respostas das duas provas que ele fez naquele dia, apareceram em sua mente no momento de responder às perguntas, como se ele sempre soubesse as respostas de todas elas. O menino tirou nota 10 nas duas provas. No horário do recreio, um bêbado entrou na escola, pegou Marcos à força, levou para o banheiro e o estuprou. Estranhamente, ninguém ouviu os gritos do menino. Ele foi encontrado no banheiro no final do dia caído no chão, com o ânus sangrando e se contorcendo de dor. Estranhamente, ninguém viu o bêbado entrar na escola ou sair. O menino foi levado ao pronto-socorro pela diretoria da escola e a família foi avisada. Chegando ao hospital, Madalena começou a chorar ao ver o filho deitado na maca em coma induzido. Manoel ao ver o irmão, estava prestes a dizer que Saulot ouviu o que ela disse e que aquilo seria uma espécie de punição. Porém, Madalena, com os olhos banhados em lágrimas, colocou a mão direita no ombro do filho mais velho e disse baixinho:

- Se você me disser alguma coisa sobre demônio aqui, eu juro que te arrebento de pancada!

Manoel foi ao banheiro do hospital por sentir uma forte vontade de urinar. Quando começou a urinar no mictório, um bêbado entrou logo depois dele e entrando em uma cabine de vaso sanitário, o bêbado trancou a porta da cabine e disse com voz tenebrosa:

- O estupro foi em pagamento às notas das provas, a morte por hemorragia interna vai ser pelo jeito desrespeitoso da pessoa que fez o pedido.

Ao ouvir aquilo, o rapaz acabou de urinar e foi correndo ao corredor do hospital. Ao chegar novamente no quarto onde estava o pequeno Marcos, viu o seu pai com lágrimas nos olhos abraçado à sua mãe, que chorava copiosamente com o rosto encostado no peito do marido. Os médicos começaram a retirar os aparelhos ligados ao menino. Neste momento, Madalena entre prantos, dizia:

- Meu Deeeeeuuuuss..... Ele tinha só nove aninhoooooosss.... Que crueldade meu Deeeeuuuuussss... Meu Deeeuuuussss...... Só nove aninhooooosss....

Perplexo ao ver seus pais chorando, Manoel perguntou à uma enfermeira:

- O que aconteceu:

A enfermeira, uma idosa muito simpática, pegou no ombro do menino e disse:

- O teu irmãozinho acabou de dar o último suspiro e ir pro céu. Foi vítima de hemorragia interna.

Manoel pensou: “Foi ele! O Demônio Saulot! Só que eu não posso falar isso pra minha mãe, porque senão ela vai pirar dizendo que eu estou imaginando coisas. Mas eu tenho que me comunicar com alguém! Esse demônio matou o Padre Eusébio por ele ter tentado benzer o meu quarto e agora matou o meu irmão em troca da minha mãe ter debochado dele!”

O adolescente ficou uma semana pensando no que fazer. O enterro do seu irmão, as palavras do bêbado no banheiro do hospital e a facilidade com que ele tirou (nota10) em provas das quais ele nem havia estudado direito não saíam de sua cabeça.

Madalena não conseguia parar de chorar o dia inteiro e tirou Manoel daquela escola por considerar “muito perigosa” (Afinal que escola era aquela onde um bêbado entra, estupra uma criança, sai e ninguém vê? )

Roberto explicou a situação ao seu chefe e este lhe deu um mês de férias para ele poder esfriar a cabeça e poder reorganizar a mente para poder então voltar ao trabalho.

Na semana seguinte, Manoel tomou coragem, e escondido dos seus pais, foi à Biblioteca Municipal, onde encontrou O Livro Secreto dos Mestres da Mortalha. Ele olhou a sala de leitura: Ninguém conhecido estava ali. Então ele pegou o livro, colocou sobre a mesa e começou a ler na esperança de tentar fazer com que Saulot voltasse de onde veio, pra deixar a sua família em paz. O livro era grande e ele se apegou a leitura de tal maneira que não viu o tempo passar. O menino entrou na Biblioteca Municipal às 9 da manhã e quando deu por si, um funcionário do local o cutucou o ombro e disse:

- Ei, menino! Já vamos fechar. Amanhã você termina de ler este livro.

- Já estou na última página, não tem como esperar mais cinco minutinhos?

- Ta legal, cinco minutinhos.

O jovem terminou a leitura, guardou o livro, agradeceu o funcionário e foi para casa. Ao chegar em casa, a mãe dele o abraçou chorando e dizendo:

- Meu filho! Onde é que você esteve o dia todo! Eu fiquei igual uma maluca te procurando!

- Calma mãe. Eu fui num lugar maneiro, ler um livro maneiro, não se preocupe comigo.

Roberto interveio e disse:

- Meu filho! Nós temos que nos preocupar sim! O teu irmão acabou ter ser assassinado sabe-se-lá por quem! Eu só espero que o livro que você leu, não seja sobre esses demônios que mexem com a tua imaginação fértil!

- Olha, eu agradeço a preocupação de vocês, desculpe eu ter sumido assim, mas agora eu só quero tomar banho e dormir, ta legal.

Os pais do adolescente se espantaram com a frieza dele. Não parecia o mesmo Manoel que eles conheciam desde que nasceu. Parecia outra pessoa muito diferente.

Na manhã seguinte, os pais de Manoel estavam mortos. O adolescente então conferiu o prêmio da loteria na internet e confirmou que ganhou o Grande Prêmio. Então ele pegou um pouco do sangue de Madalena com uma faca de cozinha e desenhou a metade de uma hexagrama no chão do quarto. Com outra faca diferente, ele pegou um pouco do sangue do pai dele e desenhou a outra metade do hexagrama. Colocou a faca suja do sangue da mãe do lado do hexagrama que foi desenhado com o sangue dela, pegou a faca suja com o sangue do pai e colocou do lado do hexagrama desenhado com o sangue dele. Acendeu seis velas vermelhas, uma em cada ponta do hexagrama e repetiu seis vezes a frase:

- Slovê ir Gália Saulot!

Sim! Agora aquele menino havia se tornado, ao terminar de ler o livro no dia anterior, um dos Mestres da Mortalha.

FIM

Eduard de Bruyn
Enviado por Eduard de Bruyn em 08/02/2019
Reeditado em 08/02/2019
Código do texto: T6570046
Classificação de conteúdo: seguro
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