A maldição de João Batista - DTRL 33

João Batista fedia como nunca ninguém jamais fedeu naquelas terras esquecidas por Deus. Seu odor fétido, remontava a sua juventude quando sofreu um golpe de peixeira. Tal feito, obrigou-o viver, permanentemente, com uma bolsa de colostomia. O fedor, contudo, não derivava de tal bolsa – apenas quando a mesma rasgava por acidente. Adivinha de uma maldição.

Diana viúva de Malaquias, autor da facada, quem rogou a praga:

- A cada maldade cometida, irás feder como as vísceras de Malaquias que atirastes ao solo. Imundo! Cão dos infernos!

- Tenho o corpo fechado sua vaca. Respondeu João Batista enquanto tapava o sangramento na barriga.

Valdomiro, dono do bar, tocava os cães famintos que disputavam as entranhas do morto. “Praga de viúva pega”. Comentavam alguns presentes enquanto ambos os brigões eram transportados ao hospital.

Desde então, João Batista, que não possuía afinidade com a bondade, começou a feder. Cada maldade cometida e o fedor aumentava. No início parecia um mal hálito. Evoluiu para algo similar ao odor de uma fossa, às vezes flertando com o chorume. Nesta fase, um bom perfume, produzido nas montanhas que circundavam a cidade, mascarava o odor. Até enganava boa parte das moçoilas incautas.

O pior aconteceu quando ele resolveu entrar para a vida política. Cada dia sentado na cadeira de prefeito, significava mais fedor. Cada decreto assinado e o mal cheiro aumentava ainda mais.

Acreditou por um tempo ser portador de uma doença rara. Todos os diagnósticos, contudo, provaram o contrário. Teve, enfim, que aceitar sua maldição, abraçando-a de frente. Nesta ocasião estava tão fedido que ninguém mais suportava estar ao seu lado. O fedor havia lhe roubado a capacidade de discernimento. Supôs ser parte de algo maior. “Levar o fedor ao mundo, eis a minha missão”.

A cidade, rodeada de montanhas floridas, iniciou o seu declínio. Primeiro ordenou o não recolhimento do lixo. Depois abriu as covas fúnebres para que os defuntos exalassem a decomposição de seus corpos. O fedor de seu corpo, no entanto, ainda era maior. Então determinou a morte daqueles que divergiram, expondo-os em cada rua da cidade. “Servirão de exemplo, espalhando ainda mais fedor”. Pensou.

Então inclinou sua missão de espalhar o fedor sobre as montanhas. Sangrou-as com máquinas agrícolas, transformando seus solos em um grande deserto árido. Aquelas que, na primavera, lançavam perfumes sobre a cidade, era agora morros de terra seca. As velhinhas montanhesas produtoras de perfumes, foram acusadas de bruxaria. Após serem queimadas na fogueira, serviram de churrasco para a população. Aqueles que recusaram o banquete, também foram considerados hereges, tendo destino semelhante.

Depois que tudo na cidade fedia tal qual o seu administrador, choveu. Caiu água como nunca antes houvera caído naquela cidade. Ao desabar sobre a montanha seca, ia formando-se uma grande enxurrada avermelhada. Aquela torrente formava grandes sulcos e marchava rumo à cidade. Conforme descia, convertia-se numa enorme avalanche vermelha que abraçava a cidade pelos quatro cantos.

Não sobrou ninguém! Apenas flores que emergiram das terras purificadoras, transformando o local numa imensa colina florida.

Tema: mal cheiro

bily anov
Enviado por bily anov em 13/03/2019
Reeditado em 04/01/2020
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