TROCADILHO

A jornalista alemã se espreme em meio a seus colegas de profissão até conseguir que seu microfone chegue à boca de Bagbá, o famoso jogador de basquete de origem Senegalesa que fizera 50 pontos no jogo de hoje.

- Bagbá, bagbá... - ela chama.

Simpaticamente, Bagbá direciona a ela um olhar e um sorriso branco.

- Pode dizer como você chegou até aqui?

O jogador olha pra cima, lembrando de sua história....

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TEMPOS ATRÁS..

Seu primeiro filho, uma criança sem nome, havia acabado de nascer. A mãe da criança, uma refugiada pobre do Sudão do Sul, fora paga com 20 mil dólares e sumiu como prometido.

Seu handler achou melhor Bagbá ter o mínimo contato possível com a criança.

Poucos dias depois, o Momento chegou, marcado por uma conjunção do Sol com Vênus na casa 2 do trânsito do Mapa astral de Bagbá, o que significava muito dinheiro. Júpiter passando pela casa 10 significaria fama.

- É ótimo que seja um menino. - Disse repentinamente seu handler, sob a luz das estrelas numa noite sem lua enquanto caminhavam por uma praia deserta. - O Mestre Crowley dizia que o melhor sacrifício é o de um menino puro e inteligente.

Bagbá o olhou de soslaio.

- Pela cara da mãe, o menino é tudo menos inteligente. De qualquer forma, nunca vou saber mesmo...

Estavam numa ilha particular em meio ao Oceano Pacífico.

A distância, podiam ver luzes aumentando à medida que caminhavam.

Em poucos minutos chegaram ao local do ritual. Vinte pessoas usando robes pretos e mascáras os esperavam. As máscaras eram parecidas com as usadas por um personagem do filme "Pânico": nas cores preto e branco e com a boca arreganhada numa expressão de susto.

Um dos presentes se aproximou de Bagbá com a criança sem nome nos braços. Era um bebê negro enrolado numa toalha simples branca. Não chorava e seus olhos estavam abertos e fixos no rosto de Bagbá. Piscava incessantemente.

Ele começou a caminhada.

À sua frente, uma estátua gigante de uma chimera o esperava: um ser híbrido com cabeça de Touro e corpo de Homem. No meio da estátua, uma abertura na barriga de pedra marcava o local de onde saíam as chamas. A estátua tinha braços de pedra dobrados para a frente, em posição de Recebimento.

A mente de Bagbá mentalizou o pedido: fama e dinheiro, fama e dinheiro, fama e dinheiro...

Quando o bebê foi jogado, as chamas subiram para o engolir.

Os sons seguintes foram os de um choro entrecortado por gritos.

Um som horrível que ninguém jamais deveria ouvir.

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- Bagbá? Está tudo bem? - pergunta a jornalista, demonstrando impaciência com a demora da resposta do jogador.

- Sim, sim, tudo ótimo. - E sorri novamente, enquanto ajeita o novo Rolex no pulso esquerdo. - Ah, vamos a sua pergunta...

- Isso. Pode, porventura, nos dizer como você conseguiu tudo isso? Estádio lotado, todo mundo gritando seu nome, contrato renovado com o clube... Como foi?

- Ah, sabe como é, né? Tive que fazer muito sacrifício pra chegar aqui.