A MORTE

Quando o piano toca e você se vê numa daquelas cenas onde apenas o mistério toma conta dos seus arrepios, pode ter certeza, não é porque a morte estar próxima, afinal, não posso estar em todo lugar. O meu preferido é o concerto de Verdi, nada como degustar um pouco de sofrimento enquanto o coro emana de lado a lado nas paredes do meu quarto, e enquanto isso, fiscalizo em meu caderno quantas pessoas morreram naquele instante. Pode ser interessante ou não, mas eu sou a Morte! Sabe aquele que nunca deve ser falado nas reuniões em famílias? Sou eu. Aquele câncer que você esconde de seus amigos ou uma doença letal qualquer, também sou eu. Aquele carro que pegou um parente seu, era eu novamente. Sou a Morte de diferentes modos, mas sempre ali presente na vida de cada pessoa. Algumas pessoas até conseguem me ver, aquelas crianças chatas que possuem uma mediunidade, mas estás eu cuido o quanto antes para que não viva muito. Você entende, né? Não podemos deixar ninguém atrapalhar um trabalho que você estar a anos no ramo!

Eu amo também escutar Rossini enquanto observo os nomes se inscreverem sozinhos em meu caderno, cada nome uma morte e enfim eu tenho que decidir de que maneira ocorrerá; é claro, eu sempre sei de tudo e sempre saberei a vida de todos, inclusive a sua, mas isso não importa agora, se você estar lendo isso provavelmente ainda não esteja no meu caderno. A minha casa não é o inferno, na verdade essa questão de inferno e céu meramente lorota; o que temos aqui é duas espécies de luz: ou você morre e desaparece desse mundo, ou morre e fica preso no meu porão se lembrando de todas as pessoas que sofreram por você. Meio clichê, mas é exatamente isso que acontece e ponto. Um outro ponto a qual tenho que mencionar é que diferente dos pensamentos humanos, eu não sou um esqueleto, na verdade sou mais humano que muita gente. Já tive muitas e muitas namoradas, e talvez eu seja o amante de sua esposa atualmente, ou a amante de seu esposo, virar qualquer pessoa é uma especialidade única minha, então a sua mãe pode não ser sua mãe, nem mesmo seu filho. Pense nisto!

Meu trabalho não tem comissão, na verdade nem Deus eu conheço. Então posso me divertir da maneira que devo com as pessoas que estão a beira da morte; por exemplo, os adolescentes depressivos. Houve um tempo em que fiz um jovem russo a beira de seu suicídio publicar no Facebook uma forma farjuta de curar a depressão, um jogo que mais matava do que salvava. Sim, fui eu o criador da Baleia Azul. Em apenas um gatilho garanti muitas mortes; o grande ataque às Torres Gêmeas também foi obra minha, e digamos que teve um dedo meu na tragédia do Titanic. Como Morte eu devo estabelecer um tipo de morte comum para que facilite minha vida, e com isso eu estabeleço regiões. Por exemplo; Brasil, feminicídio; Estado Unidos, massacre; Síria, tortura; Continentes Africanos, clima e assim vai por diante. Aquela ladainha de "Deus quis assim", na verdade Deus não quis nada. Eu que quis, sou eu que retiro quem precisa ser retirado.

Mas parando de falar de meu trabalho nada tediante, irei esclarecer um fato; quando eu disse que há pessoas que vão para o meu porão, eu quis dizer que essas são destinadas a reviver. Não é encarnação mas sim uma maldição; aqueles cujos julgados por mim devem reviver em outro corpo como uma nova pessoa, porém, terá tudo tirado de si durante sua vida. Família, emprego, qualquer coisa irá ser tirada dessa pessoa até que ela não consiga mas viver e cometa um suicídio. Depois do suicídio aí sim ela morre totalmente sem regresso. Ou seja, todas as pessoas que se suicidaram até hoje na verdade foi uma pessoa cujo estava pagando sua penitência. Não é que eu seja cruel, mas apenas justos. Sofra ao ponto de morrer e só assim saberá o que é ser humano, certo? Eu estou anos nesse ramo, e sempre coloco Bach para que eu possa presenciar as mortes diárias. É como um canal de televisão, sabe? Mas um canal sempre ao vivo, só possui mortes, não é diferente dos noticiários ridículos que vocês assistem. Toda tarde ao cair do sol eu coloco o concerto de Lá menor para dois violoncelos e vejo o sofrimento alheio pelas mortes se concretizando. Geralmente faço uma pipoca antes com um pouquinho de suco de maçã, a melhor invenção do homem foi sem dúvida o suco de maçã.

Ao chegar no final da noite eu saio para algum lugar aleatório. Não, eu não saio de capuz preto nem de foice, saio da maneira que eu achar melhor. Como eu disse, eu posso ser qualquer um. A vida sobre ser a Morte não parece tão tentadora assim, acredite. Mas uma de minhas dádivas e alimentar a ambientação daqueles escritores que com certeza possuem algum problema mental; de vez em quando, apareço para eles, ou em seus sonhos, e simplesmente sou o fator número um de best-sellers! Ou até mesmo com artistas e pintores, Salvador Dalí não seria nada sem mim, acredite! Hoje talvez ponho um plano novo em ação, talvez um texto em alguma rede social, talvez a manipulação de alguma pobre alma. Ou até mesmo, uma maneira de adentrar em certas casas e famílias.