Desespero

Em uma noite qualquer, Josué de Castro, 20 anos, dormira normalmente em sua casa. Estava cansado – fruto de noites mal dormidas anteriores – e precisava “apagar” naquela noite, dormindo pelo menos vinte horas, como que tivesse desmaiado ou morrido. Só não iria imaginar que realmente seus pais acreditariam que Josué havia falecido.

Ao acordar, Josué percebeu um desconforto imenso nas suas costas. Acreditava que era fruto da quantidade de horas dormidas. Abriu os olhos. Percebeu estar em um local completamente tomado pela escuridão. Estranhou os braços cruzados sobre seu peito. Tentou mexê-los a fim de ligar o interruptor, mas estavam completamente dormentes, não obedecendo às ordens cerebrais.

Respirou fundo e deixou a dormência intensa passar. Ao terminar, estava levemente ofegante – de tão forte que fora. “Por que meus braços estavam assim, Deus?”, se perguntou.

Passada a dormência, voltou a esticar o braço para ligar o interruptor do lado de sua cama. Porém, esbarrou em algo duro no caminho, estando logo ao lado do seu corpo. Estranhou, porque a distância entre sua cama e a parede era maior. Bateu três vezes. Fez “Toc. Toc. Toc”. Era madeira.

“Madeira...?”, se perguntou. Em seguida, arregalou os olhos. Seu corpo foi tomado por um desespero. Virou-se rapidamente para o outro lado. Outro obstáculo. Bateu. Novamente madeira. Jogou os dois braços para cima. Logo acima do seu rosto, outro obstáculo. Bateu. Novamente madeira. Passou a ficar desesperado. Seu corpo tremia, seu corpo palpitava e sua respiração estava ofegante. Ele foi enterrado vivo!

“Não, não, não, não, não, não”, dizia para si mesmo, completamente desesperado. Veio um impulso desenfreado, tomado pela ira, de atacar, com força, a parte da madeira sobre sua cabeça. Em um débil ataque infantil, começou a dar piçarra e a socar a madeira, enquanto gritava “Não, não, não”. Enquanto isso, lágrimas escorriam de seu rosto, inundando a almofada sob sua cabeça.

Cansado e ofegante, parou. Seu peito levantava de tão ofegante estava. Lembrou-se que era preciso economizar ar caso quisesse sobreviver àquilo. Levou a mão à cabeça.

“O que eu faço? O que eu faço? O que eu faço?”. Ainda estava desesperado e seus pensamentos giravam dentro de sua cabeça.

De repente, uma ideia. “Isso”, chegou a soltar, para si mesmo. Aliviou-se. Dobrou o joelho e subiu o próprio corpo até encostar com a cabeça na parte mais alta do caixão. Em seguida, impulsionou os seus pés para frente. Tentou chutar o outro lado do caixão. Os pés bateram com força no local, entretanto, nada aconteceu além de fazer um imenso estrondo.

Josué voltou a dobrar o joelho e a chutar a lateral do caixão, entretanto, novamente não conseguiu êxito. Suspirou fundo, por um momento. Em seguida, veio à sua mente uma segunda ideia.

Contorceu-se no caixão, mudando sua posição. Dobrou-se todo e desferiu um poderoso chute na tampa do caixão. Sentiu-a mexer lentamente, mas capaz suficiente de mexer a terra acima do caixão.

“Isso”, comemorou. Desferiu outro poderoso chute na tampa do caixão. Mexeu bem pouco a tampa e a terra. Deu dois novos chutes, mas dessas vezes fizeram sobre um imenso barulho.

Começou a sentir fisgadas nas têmporas e a cabeça ficar pesada. Começou a ficar tonto. Levou a mão à cabeça na tentativa de diminuir as dores. Seu peito doía e a respiração estava ofegante. Não era fruto do esforço dos chutes. Era falta de ar. O ar estava acabando!

Josué voltou a ser tomado por um desespero angustiante e começou a chutar repetidas vezes a tampa do caixão. Contudo, como nas vezes anteriores, acontecia apenas estrondo. Para piorar sua situação, em um dos chutes, acabou acertando de mau jeito o pé esquerdo na tampa de madeira, fazendo o mesmo virar e estralar. Josué sentiu uma dor imensurável. Urrou de dor, enquanto se contorcia.

“SOCORRO! SOCORRO! SOCORRO!”, gritava. O desespero era tamanho, que lágrimas escorriam de seu rosto. Sentiu a cabeça pesar forte. Iria perder logo a consciência. Tentou segurar o quanto pôde, enquanto continuava gritando, mas logo perdeu por completo a consciência.

Cinco anos se passaram desde o fatídico acontecimento de Josué. Sua família, aos poucos, começou a acostumar com a “morte” do rapaz e, agora, iriam retirar seus restos mortais da cova para transferi-lo ao ossuário.

O caixão foi retirado do interior da sepultura e colocado ao seu lado. O coveiro o abriu. Em seguida, assustou-se. Os pais de Josué, presentes na sua exumação, igualmente se assustaram. O esqueleto do que outrora foi Josué não estava na posição na qual fora enterrado. Estava contorcido dentro do caixão, em posição diferente da tradicional. Sua mão esquerda segurava seu pé esquerdo, posicionado de forma diferente, torcido, com uma nítida fratura próximo ao tornozelo. A tampa do caixão estava curvada para cima e com lascas na parte de dentro. O pai ficou boquiaberto. A mãe quase desmaiou e passou a se debulhar em lágrimas. Josué foi enterrado vivo!