TERRA SECA
O pó da terra seca se levantava quando o carro passava. No céu, o sol impunha sofridão ao caboclo que persistia em arar a terra. Uma senhora sexagenária trazia um balde de água turva em cima da cabeça com um olhar distante como se visse além do horizonte algum lugar onde florescesse esperança.
A chuva é simples evento climático para a maioria das pessoas, nuvens que se juntam, formando uma de precipitação. O povoado daquela cidadezinha também pensara assim, há muito tempo. Hoje são apenas relatos passados aos jovens, mas muita história se perdeu.
- Este "C"? Estranho. - dissera o delegado ao assistente.
- Pobre menina, tinha quantos anos?
- Seis, tiraram as tripas para fora. Percebeu que não tem mais outro hematoma? - perguntou o assistente.
- Sim - respondeu saindo com o relatório. O preso não assumiu, embora o encontraram correndo pela mata com arma do crime. Alegava que não se recordava, mas encontraram a vítima na beira do rio nos fundos de sua propriedade.
- Vai ser executado amanhã - disse o delegado - de acordo com a vontade do povo.
- Não podem fazer isto - olhava pelas grades a paisagem.
- Não, mas faremos, é o que merece. - o delegado se afastou.
- Terei o prazer de te enforcar! - disse o assistente.
- Que tipo de prazer há nisto?
- Justiça! - uma jovem entrou.
- Posso falar com ele? - perguntou.
- O Conhecia, professora?
- Não o conheço, Gil, e ele ainda está vivo, não fale como se ele já estivesse morto! Pode nos deixar.
- Dez minutos, nada mais. - não olhara para a professora.
- Matou?
- Importa minha resposta? - a encarou, não havia julgamento - não, mas também não sei como aquela arma foi parar comigo.
- Enviei uma carta para a capital.
- Por quê?
- Porque é errado! não posso ser complacente!
- Não se preocupe professora, isso não vai acontecer. Deus mandará um sinal que provará minha inocência.
- O quê? É a tua vida! Não pode acreditar nesta ilusão.
- Deus não é ilusão.
- Eu sei, ... mas ficar tranquilo no meio do caos esperando um... milagre? Lute, homem! Não aceite passivamente! Se reagir, gritar, ameaçar, eles não farão isso, assim tão rápido.
- O sinal de Deus não falhará.
- De onde vem esta certeza?
- Sempre tive. Eu era padre numa paróquia distante e larguei para viver aqui, recluso.
- Abandonou a batina?
- Não, abandonei a paróquia, não há salvação para todos - Júlia duvidava se era loucura ou fé.
A forca fora montada, o cadafalso era de eucalipto. No palanque, o assistente já estava aguardando o condenado. Júlia olhou colocarem a corda no pescoço dele, todos olharam, apreensivos, silenciosos, até que o corpo desceu. Um bando de pássaros saiu da mata, o céu escureceu e, na praça, o povo escutou a chuva cair, mas, diferentemente, chovia sangue...
E esta foi a última chuva.