B'MIDBAR*

"E te lembrarás de todo o caminho pelo qual o

Senhor, teu Deus, te guiou no deserto… para

saber o que estava no teu coração…"

Deuteronomio 8;2

Em busca de uma nova vida, várias famílias subsaarianas decidiram enfrentar a sombra da morte na travessia pelo deserto para chegar à Europa. O trajeto iniciou-se desde Gao, em Mali; porém ao passar por Tamanrasset, na Argélia, foram expulsos do país, conduzidos pelos soldados até certa região do Saara e abandonados a pé para, caso sobrevivessem, caminharem dias a fio ao vilarejo de Assamaka, no Níger, onde poderiam encontrar alguns alojamentos contendo água e continuar a migração sob inexprimível calor e noites gélidas, só parando quando alcançassem a fronteira libanesa em Gadama.

Eles entregavam quase todo o dinheiro que tinham na mão dos "coiotes", homens responsáveis por controlar a migração. Os tais, entretanto, transformaram a única rota de escape daquele povo num meio de exploração, onde não poucas vezes cobravam além do valor que os migrantes podiam pagar e para "ninguém sair devendo", confiscavam bens como aparelhos e produtos de higiene pessoal, deixando-os apenas com alguma comida e poucas garrafas d'água.

Para fugir da miséria e à procura por condições de trabalho, milhares são impulsionados à tentarem a rota clandestina anualmente. Todavia, a chance de sobrevivência sempre fora pequena. Os grupos de resgate da ONU confirmam que após a medida da União Européia, muitas são as expulsões que o governo da Argélia tem feito para impedir a migração ilegal e que o numero de mortos por desidratação e inanição durante o percurso já ultrapassa a casa dos cinco mil e duzentos.

Em meio ao calor esmagador, sob o sol de mais de cinquenta graus centígrados, dois caminhões balouçavam as pessoas que vinham capturadas de Tamanrasset. Escoltados por homens armados, oitenta e sete almas, sendo a maioria mulheres e crianças, iam por horas espremidos no mal cheiro tetânico das caçambas que chacoalhavam a cada duna de areia que subiam e desciam.

Entre eles estava Kafara Abdul Rudo, moço com o rosto de uma pantera negra e olhos quase amarelos, convertido ao cristianismo, nativo de Mali. Depois da morte dos seus pais acometidos de uma grave doença, vendera tudo o que tinha para pagar a travessia. Antes de partir recebeu do missionário que o evangelizara quando ainda estava em Gao, uma porção de páginas do novo testamento e um colar que era somente um barbante amarrado à uma pedra com uma cruz escrito:

"Sob esta cruz vencerás" **

Sua maior motivação: dar a Quezia, sua irmã caçula e Jamai, seu irmão pré-adolescente, um novo lar onde cuidaria deles na ausência dos pais. Todavia seu maior medo era tratar da doença que os irmãos tinham. Mirando no horizonte, uma linha laranja infinita, lembrava das palavras do missionário:

"Eu sou como o deserto: duro, seco e finito. Cristo é Oásis e descanso da alma."

Os caminhões pararam bruscamente. Um grito em francês do soldado argeliano estremeceu o coração de todos:

"Chegamos, seus inúteis! Aqui vocês descem! Andem logo! Não temos todo o tempo do mundo!"

Muitos não sentiam mais as pernas por causa das horas em péssima acomodação. Um e outro, temendo enfrentar o gigante Saara, se agarrava nas pontas do caminhão, evitando descer. O brado continuava:

"Vocês tem duas opções: ou sigam até Assamaka, ou subam novamente. Porém, ficarão presos até segunda ordem e serão deportados para os seus países!"

Um dos motoristas ligou a partida. A fumaça subia…

Diante do desafio, alguns, em lágrimas, subiram novamente, deixando para trás sua chance de um novo começo. O restante, resignado com seu destino, optaram por lutar pelo seu paraíso europeu e começaram a andar. Enquanto os caminhões se perdiam no horizonte, um vento áspero despertou as consciências:

"Não há mais volta!"

O Saara ardia assim na terra como nos céus. O bando marchava a passos lentos. As articulações pesavam e os batimentos cardíacos diminuíam. Os olhos doíam sob à mira da luz abrasadora. O sol dava-lhes chibatadas na pele, cada vez mais ressecada. Pescoços irritadiços esfoleados pela areia da roupa. Seguiam sem rumo ao destino que não viam, mas criam. Somente o silêncio em meio a poeira e o resfolegar das bocas de lábios rachados.

Kafara escondia uma garrafa de água em seu corpo, enrolada por vários panos, para matar a sede de seus irmãozinhos. Ele também levava um tubo contendo páginas do novo testamento, introduzido no ânus, como os missionários faziam, uma vez que a perseguição religiosa nas regiões subsaarianas era mais intensa; e caso os touaregues do deserto ou os "coiotes" da fronteira libanesa encontrassem alguém contrário a fé islâmica, não teriam o culpado por inocente e a execução do mesmo seria imediata.

- Grande irmão - disse Jamai - É verdade que o missionário falou que existe um Deus que mora num céu todo bonito?

- Sim, Jamai. Existe um Deus que preparou um lugar para todos aqueles que receberem seu Filho como Salvador.

- E do que Ele salva? - perguntava a pequena Quezia.

- De nós mesmos e de outros males...

- Ele pode nos salvar de morrer como a mamãe e o papai? - com inocência questionou Jamai.

Kafara engoliu a pouca saliva que restava com dificuldade:

- Claro que pode. Ele nos fará chegar até a Europa.

- Minhas pernas 'tão doendo, irmão. - alegou Quezia - Me leva no colo um pouco.

- Eu também quero ir no colo! E tô com sede. - disse Jamai.

- Ai… está bem. Mas será um de cada vez. E não fiquem se mexendo muito.

Kafara colocou Quezia em seus ombros e contou cem passos. Em seguida a desceu e carregou Jamai. Afastou-se um pouco do bando e deu a eles alguns poucos goles de água. Ele evitou beber, embora a sede lhe ardesse a laringe.

- Ei! - sugeriu Kafara - Vocês lembram do hino que o missionário nos ensinou?

- Eu lembro, irmão! Eu lembro! - animou-se Jamai.

- Então vamos cantando, crianças. Só que baixinho, viu. Ninguém pode nos ouvir.

E murmuravam entre si:

"Die pad hemel toe.

Dit is Jesus, die manier.

Sing al die kinders." ***

A noite caiu como um manto, envolvendo a todos. Os migrantes pararam e fizeram um ajuntamento com longos tecidos e estacas para se protegerem dos ventos cortantes que jogavam areia nos olhos. Nada se via ao longe. A multidão se reuniu em volta de uma fogueira. As chamas tremeluziam ante o negrume daquela imensidão vazia. Após lamentos e palavras de consolo uns aos outros, todos dormiram. Kafara ouviu um choro que ia aumentando:

- Jamai, Quezia, o que foi? Por que estão chorando tão alto? Vão acordar os demais.

- Ela está com fome, irmão. - disse Jamai de semblante caído.

- Eu quero a mamãe! - chorava a pequenina Quezia.

No meio daquele nada, Kafara não sabia o que dizer. Seu olhar evidenciava sua impotência. Envolveu-os num abraço forte:

- Vai ficar tudo bem, crianças. - sua voz embargara um pouco - Vai ficar tudo bem.

- Podemos beber mais um pouco de água? - pediu Jamai.

- Infelizmente não posso mais dar água pra vocês hoje. Tem que sobrar. Não sei quanto falta ainda pra chegarmos. Venham, vamos dormir.

E junto à eles, deitados sobre muitos panos, Kafara desmaiou de cansaço. Algumas gotas salgadas ainda rolaram pelas maçãs negras do seu rosto.

De madrugada Kafara abriu os olhos. Quezia e Jamai estavam agarrados um ao outro se arrastando agitadamente pela terra como uma cobra. Cada um gritando uma frase:

- SEM FORMA!

- VAZIO!

- SEM FORMA!

- VAZIO!

Kafara levantou-se num susto. Os pequenos espumavam pela boca com olhos brancos tentando cavar um buraco com a cabeça e berrando cada vez mais alto:

- SEM FORMA!

- VAZIO!

- SEM FORMA!

- VAZIO!

Muitos migrantes acordaram com os gritos. Kafara os envolveu com panos querendo abafar o barulho. Segurou-os fortemente e voltou a cantar a canção com a boca colada ao tecido. Eles se acalmaram, e adormeceram envoltos nos braços de Kafara.

Na manhã seguinte, ao acordar, ele percebeu que alguns ainda estavam deitados, mas o bando desfez os abrigos e já seguia caminho. Rapidamente se levantou e acordou seus irmãos. Aproximou-se de um dos dormentes e descobriu que aqueles que permaneceram deitados jaziam mortos com as órbitas vítreas e secas.

Fez com que Quezia e Jamai bebessem um pouco d'água e apressou-se para alcançar os demais. O recipiente que ele levava estava perto de se esgotar, mas decidiu apenas lamber a tampa da garrafa e seguir.

- Kafara, o que é que tem de bom nesse lugar que estamos indo? - questionou Jamai.

- Aaahh gente - disse ainda tentando esquecer o ocorrido - É um lugar onde não passaremos mais tanta fome. Lá não tem tantas doenças, guerras… sua irmãzinha não correrá o risco de ser abusada quando fizer dez anos, nem será circuncidada. Vocês poderão estudar, vestir novas roupas, e ninguém perseguirá a fé de ninguém.

Os pequenos agiam como se nada tivesse acontecido. O coração de Kafara temia, pois seus pais morreram da mesma doença que acometera Quezia e Jamai. Ele só não sabia quando começariam os acessos de loucura.

- Conta pra gente aquela história do povo no deserto lá. Eu gostava quando o missionário falava dela. - Quezia pedia.

Então esboçando um sorriso, Kafara foi contando a história do povo hebreu desde o Egito até Canaã. E enquanto contava sentia que o vigor retornava.

"Fará nele uma fonte…" pensou consigo.

Enquanto andavam, alguém na multidão gritou: ÁGUA! EU ENCONTREI ÁGUA!

Todos correram após um homem barbudo que se lançava atrás de uma enorme duna de areia. Todavia ao chegar, o mesmo estava com um riso espasmódico ingerindo areia.

"Uma miragem." Diziam alguns frustrados. A família daquele homem tentava o tirar dali aos berros. Mas ele insistia em ficar. O mesmo morrera uma hora depois rindo até perder as forças.

O calor era intenso. A água de muitos se acabara e o pouco que tinham misturavam com suas urina.

Os migrantes avistaram ao longe pequenos pontos deitados, parecendo rochas. Porém, descobriram com tristeza se tratar de sete corpos; dois homens, duas mulheres e três crianças, que morreram no deserto, ajoelhados. Kafara chorou ao reconhecer que aquelas crianças faziam parte dos evangelizados pelo missionário e que na mão de um dos homens, havia uma pedra semelhante a dele.

- Jamai, olha ali! - apontava Quezia com seu dedinho para os corpos.

- Credo, Quezia. - Jamai dizia - A areia tá engolindo eles!

Kafara olhou para os irmãos. Nada enxergava do que eles diziam. Resolveu dar mais um pouco de água para ambos, que após beberem nada mais viram. Bebeu alguns goles também e secou a garrafa.

A noite, Kafara ficou a noite acordado vendo os irmãos dormirem. O vento sibilava solidão. Afastou-se da turba, ajoelhou-se num canto, tirou algumas páginas da bíblia de dentro do tubo, e ficou lendo. Saltou ao seus olhos o texto:

"O justo viverá da fé"

E adormeceu sobre as páginas. Seus irmãos não tiveram nenhum ataque noturno.

Na manhã seguinte o ânimo de todos era ainda menor. A cena dos sete corpos ajoelhados desvanecera a esperança de salvação daquele povo. O sol começava a martelar. E nesse terceiro dia de caminhada muitos tombaram sobre a areia quente.

Algumas pessoas caíam tremendo dizendo que sentiam muito frio, outros rasgavam-se em gritos roucos de dor por água. Uma grávida entrou em trabalho de parto enquanto andava. As mulheres foram ajudar, mas pela excessiva perda de líquidos, mãe e filho morreram na hora do parto. Ninguém era enterrado.

Kafara segurava Quezia e Jamai em cada mão. Em silêncio. Sua visão começava a turbar. A sede lhe sufocava, porém não havia mais água. Quis gritar, mas não podia. Foi então que soltou as mãos de seus irmãos, deu-lhes as costas, pegou a garrafa, tirou seu membro para fora e com dor soltou um jato laranja-avermelhado e quente dentro do recipiente. Em seguida, com as mãos ainda molhadas e tremendo, sorveu o purgante líquido. Após quase vomitar, apertou os olhos, abriu a boca respirando fundo, sentindo o cheiro azedo do seu bafo e o amargor impregnado na língua, e sussurrou:

"Eu sou como o deserto: duro, seco e finito. Cristo é Oásis e descanso da alma. Ajuda-me, Senhor a salvar meus irmãos!"

E deu de beber daquele líquido aos seus irmãos, tapando-lhes o nariz.

Depois de muito caminhar, avistaram um lugar que na frente pareceu ter duas caminhonetes:

"Chegamos! Chegamos! É Assamaka!"

Os sobreviventes corriam jubilosos para encontrar possíveis mantimentos e água. Se dessem sorte encontrariam os grupos de resgate que de vez em quando faziam buscas e os aguardavam com medicamentos.

Porém não havia ninguém nos alojamentos. Ao contrário, encontraram dez pessoas mortas a espada, alimentos caídos na areia, alguns odres de água e um dos carros estava completamente destruído e sem rodas. Os migrantes se lançaram em terra comendo com grande avidez os alimentos ainda sujos de areia e bebiam a água a ponto de brigarem entre si.

Kafara se jogou na areia e tateando encontrou um pedaço de carne crua. Também achou atrás de uma rocha um odre que estava aberto. Rasgou a carne nos dentes e dividiu com seus irmãos. Depois beberam toda a água que havia no odre.

- Quem fez isso com eles, irmão? - Jamai perguntou.

- Touaregues, Jamai. Nem todos são amigáveis. Alguns se acham os donos do deserto. Provavelmente eles saqueram boa parte da nossa provisão.

Ainda havia uma caminhonete cheio de amassados e com pneus carecas. Mas após muito esforço ninguém encontrou a chave. Sem opção, os migrantes optaram por permanecer a noite nos alojamentos e continuar no dia seguinte. Muitos passaram boa parte do dia até anoitecer procurando por alimento ou moradores naquela região do vilarejo, mas nada nem ninguém encontraram.

Enquanto dormiam, Kafara sonhou com a cena das pessoas que morreram no deserto. A grávida e o bebê, o homem ingerindo areia, as pessoas que caíram tremendo e gritando, os sete corpos prostrados. Então sentiu que a terra se abria numa enorme boca e gritava:

- SEM FORMA! VAZIO!

Acordou num pulo. Procurou por Quezia e Jamai e não os achou. Foi lá fora e os achou brincando fazendo montinhos de areia próximo à caminhonete.

- JAMAI! QUEZIA! Voltem aqui! Isso não é hora de brincar.

Os dois vieram correndo com o corpo todo arranhado e com hematomas trazendo algo que tinia nas mãos. Era a chave da caminhonete:

- Meu Deus! Como vocês encontraram?

- Tava por aí. - disse Jamai.

Kafara estava ansioso para ver se a caminhonete iria ligar, mas angustiava-se pelo estado dos irmãos que dessa vez tiveram um acesso longe dele.

- Huumm. Tô com sono. - bocejava Quezia.

- Venham. Vamos dormir, meus pequenos. Amanhã cedo testaremos a caminhonete.

Kafara estancou o sangue que já secava dos irmãos e com um odre que encontrou, colocou um pouco de água nos ferimentos. Após isso, Quezia e Jamai começaram a sentir muita febre. Ele os enrolou com um longo tecido e os aproximou do seu corpo.

Ao se deitarem perto dele, o abraçaram dizendo:

- Obrigado, grande irmão. - falou Jamai.

- Você nos ama, grande irmão? - perguntou Quezia.

- Claro que amo! Amo mais do que tudo! - dizia enquanto os apertava em seu peito. - Agora vão dormir.

- Canta aquela canção de novo? - sua irmãzinha pedia.

- Tá bom. Eu canto.

E Kafara sussurou boa parte da noite aos ouvidos de seus irmãozinhos:

"Die pad hemel toe.

Dit is Jesus, die manier.

Sing al die kinders." ***

E cantou… até os corações dos dois irmãos pararem de bater.

Levantou ainda de madrugada, e com um pano na boca para conter seu pranto cavou uma pequena cova, tirou do pescoço o barbante e a pedra com a cruz, pôs junto com os irmãos e os cobriu de terra e areia.

Na manhã seguinte Kafara girou a ignição do carro algumas vezes até funcionar. Convocou a todos os migrantes para subirem na caminhonete e disse que só iria parar quando chegasse à Líbia. Os sobreviventes aceitaram obedecê-lo e fizeram peso ao veículo que abarrotara-se de gente.

O veículo partiu com velocidade reduzida, tendo em vista o excessivo número de pessoas que comportava, desde crianças, mulheres, homens e idosos. Sem água, sem comida, apenas olhando para o sonho europeu, que reacendeu quando o carro funcionou.

Depois de muitas horas tiveram que parar no meio do caminho, em razão de muitos começarem a passar mal durante o trajeto, pois tinham ingerido muita urina e ao misturarem com água potável e alimentos cheios de areia, sofreram de intoxicação. Kafara foi um dos que tiveram fortes disenterias ao ponto de defecar e vomitar sangue. Logo o tubo não pode mais ser escondido em seu ânus, então escondeu as páginas da bíblia embaixo do banco rasgado do carro.

Quando a multidão viu aquelas páginas, ninguém ousou questionar. Ele ligou a caminhonete e começou a cantar em voz alta a música que entoara aos seus irmãos. Dentro de poucos minutos todos aprenderam aquela canção e seguiram louvando pelo percurso.

O ânimo morto do povo deu lugar a fé, e mesmo aglomerados numa caminhonete velha e muito amassada, ninguém mais estava desanimado. Cantavam em plenos pulmões batendo palmas. O eco de suas vozes rasgavam o vento desértico do Saara, dando nova vida ao olhar de todos.

Todavia a fome, a sede e agora a febre lacerava a todos do grupo, onde ainda sim tiveram perdas na viagem. Duas crianças, um idoso, um homem e uma mulher morreram na caminhonete. O cântico não parava, agora revestido de lágrimas e esperança.

Entretanto viram ao longe uma grande tempestade de areia em sua frente. O canto deu lugar ao desespero e todos ficaram apavorados. Porém Kafara, tendo a imagem de seus irmãos pequenos em sua mente, continuou cantando cada vez mais alto, fazendo todos continuarem as palmas e as vozes.

Entraram na enorme nuvem marrom espessa de areia e pó. Por minutos seguiu-se as trevas, mas aos trancos e com todos cobrindo o rosto conseguiram ultrapassar a tempestade. O bando urrava de alegria. Kafara tossia sangue.

Pararam por mais uma noite para descansar, e na manhã seguinte viajaram por dez horas ininterruptas. Antes de partir, Kafara se ajoelhou e orou novamente:

"Obrigado, Senhor. Meus irmãos chegaram à Nova Europa. No lugar onde não haverá pestes, guerra, desertos, lágrimas nem morte. Aí eles terão água... pão... O Senhor... pra sempre."

Depois de todo esse longo trajeto, os sobreviventes viram uma paisagem verdejante e algumas pessoas saindo de barracas. Era a fronteira libanesa de Gadama. Todo o povo gritou de alegria:

"Gadama! Gadama! Conseguimos! Conseguimos!"

Todo o povo desceu animosamente para encontrar com os demais sobreviventes que estavam ali em suas barracas, que os receberam com júbilo. Todos, exceto Kafara, que quando a caminhonete parou, ele não resistiu e sua alma desprendeu-se do corpo como um pássaro liberto.

O bando removeu o corpo que mantinha um sorriso nos lábios. Cavaram uma cova e entoavam o hino que ele os ensinou.

Porém grande foi o espanto de todos quando tentaram ligar a caminhonete e ela não funcionava. Ao levantarem o capô, perceberam que ela não tinha motor, mas apenas um barbante amarrado as ferragens do carro contendo uma pedra com uma cruz esculpida escrito:

"SOB ESTA CRUZ VENCERÁS".

FIM

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* B'MIDBAR significa NO DESERTO em hebraico

** Frase que o imperador Constantino viu num sinal do céu quando venceu uma guerra, porém a frase original é: SOB ESTE SINAL VENCERÁS

*** "Die pad hemel toe.

Dit is Jesus, die manier.

Sing al die kinders."

Em africâner (do google tradutor):

"O caminho para o céu.

Este é Jesus, O Caminho.

Cantem todas as crianças"

(Este seria o conto participante do CLTS 10)

A história é baseada numa série de fatores:

Uma notícia sobre 87 corpos encontrados no Saara.

A dura perseguição religiosa aos cristãos (vide MISSÃO PORTAS ABERTAS)

No sofrimento da travessia dos povos da África subsaariana

Na realidade de que a verdadeira terra perfeita é com Cristo na eternidade.

CONHEÇA TAMBÉM A SERVA DE DEUS, POETISA E ESCRITORA MARIA TEREZA BODEMER, AUTORA DO CONTO *O ANJO QUE SERVIA NO DESERTO* E SE EMOCIONE.

https://www.recantodasletras.com.br/contosinsolitos/6866350

Leandro Severo da Silva
Enviado por Leandro Severo da Silva em 14/02/2020
Reeditado em 29/02/2020
Código do texto: T6865727
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