CIDADE AMALDIÇOADA ( a saga de Luke )

Eles vinham durante a noite. Começaram dominando a pensão. Depois, tomaram cidade. Agora só nos resta aguardar o derradeiro ataque.

Tudo começou há duas semanas, quando recém havia chegado de viagem, esperando achar tranqüilidade. Que grande engano meu não observar a enrascada em que me metia! Na pensão onde me instalei, a sr. Morgan era gentil e cordata com seus inquilinos. Tinha uma única filha solteira, que aliás foi quem deu início a tudo isso. A peste foi forte e veio rápido, deixou a moça de cama. Mesmo com o auxílio do doutor, não houve o que a salvasse daquele mal. Em 2 dias estava morta. Antes de falecer ela agonizou muito chamando por um certo Henry o qual ninguém sabia quem ou "o que" exatamente era. Todos lamentaram sua perda, mas não tanto quanto a própria mãe que não deixava ninguém em paz com os lamentos incessantes. Mas esse tal de Henry foi o que havia me deixado mais intrigado naquele momento. O doutor fez a autópsia, constatando o que já sabia. Não era nada conhecido por ele, mesmo depois de anos trabalhando na área da medicina.

Na noite seguinte após a morte da jovem, fui surpreendido em meu quarto por alguém que tentava arrombar a porta. Como não respondia aos meus chamados quando questionei quem era, me neguei a abri-la ( óbviamente). Percebi então que sussurros começaram a adentrar minha mente, e lentamente me induziam a abrir a porta para o que estava do lado de fora. Fui libertado do transe graças aos gritos do doutor, que estava lá embaixo e me implorava que pulasse pela janela. Antes que a criatura conseguisse seus intentos, saltei rapidamente de onde estava e acompanhei-o até a praça. De longe notei que algo urgia de dentro de meus aposentos, bem onde eu há pouco me encontrava. Os gritos eram desesperadores e procuravam meus rastros, com certeza. As sombras que vi de longe pareciam extremamente semelhantes á silhueta da sra. Morgan, mas o aspecto asqueroso da coisa desmentiam minhas conjecturas.

Mais tarde fui alertado por meu salvador que o cadáver da pobre jovem não era mais um simples cadáver. Algumas horas depois de deixar o corpo no necrotério, ele já não estava mais lá. Tudo o que havia restado era um aroma doce que se espalhava pelos restos putrefatos remexidos em toda a sala. Como se algo houvesse violado os mortos em busca de alimento, mas tudo o que encontrara foram os pedaços de carne podre e um bocado de sangue coagulado. Talvez tenha sido isso que deixou o monstro insatisfeito. Antes que ele pudesse analisar corretamente o que havia acontecido, do lado de fora ouviu um ruído suave, chamando ao longe uma outra figura que se aproximava rápidamente. Observando melhor o que era, não pôde acreditar! A recém falecida senhorita estava de pé na rua deserta, cantando uma melodia hipnotisante para a outra pessoa que vinha ao seu encontro. Mas o estado da jovem era aterrador. Um rosto demoníaco todo manchado de sangue, não mais com o olhar angelical que a moça um dia possuiu. Olhos fundos, sem vida, e uma bocarra escancarada com pontiagudos caninos que se moviam de acordo com as palavras pronunciadas naquela canção de morte. A outra figura era a própria mãe da jovem, que vinha descalça e com lágrimas nos olhos ao encontro da filha, julgando Deus ter ouvido suas preces. O doutor tentara avisar a sra. Morgan para que não se aproximasse da besta, mas tudo em vão. A velha só parou quando,diante da criatura,esta a tomou nos braços e cravou-lhe com desejo as presas sedenta de sangue. Ele correu para fora armado com sua winchester 46, mas isso só serviu para que a atenção do demônio se voltasse para ele. Depois de muito fugir, aconteceu dele me salvar minutos antes da sra. Morgan transformada e sua filha no quarto da pensão.

No primeiro momento não acreditei nas palavras do doutor, tentando encontrar algo racional em que firmar minhas verdades. Não acreditei até ver os seres que se esgueiravam ao nosso redor. Comecei a ouvir novamente vozes estranhas dentro de minha mente. Era como se algo infernal e ao mesmo tempo sedutor tentasse me ludibrar, enquanto se aproximava gentilmente de onde estávamos na praça. “Venha até mim e ganharás vida eterna.” Mais uma vez o doutor conseguiu me desvencilhar do encanto. ao voltar á realidade, vi que as vozes magníficas não passavam de um chamado dos cadáveres humanos ambulantes querendo que eu alimentasse sua fome e fortalecesse seu exército que dominava a cidade.

Fomos obrigados a correr, desesperadamente. E percebi que não éramos os únicos naquela sina. Havia um terrível caos tomando conta de todos os lugares! Pessoas corriam tentando se salvar, enquanto outros tombavam pela força descomunal apresentada pelos seres semi-vivos. Seres que bebiam o sangue de suas vítimas e as tornava em pouco tempo semelhante a elas. De repente nos vimos cercados por todos os lados, prestes a ficar sem saída. O doutor já estava sem munições ante tantos alvos incessantemente persistentes, que permaneciam de pé mesmo depois de alvejados diversas vezes. A winchester era inútil. Era o fim!De repente, começaram as criaturas a recuar rápidamente como se temessem algo mais mortal que sua sede de sangue. não havíamos percebido,mas graças a Deus nascia o sol na cidadela!

Claro que ninguém ali imaginava o que poderia estar realmente ocorrendo. Sabendo apenas que eles temiam o sol e chamavam por algum tipo de líder maior denominado Henry. tínhamos que lutar, mas em vão.Chegada a noite éramos cruelmente massacrados, mesmo em meio aos maiores esforços. O doutor estava gravemente ferido e noite após noite enfrentávamos a agonia de aguardar a morte certa. As saídas foram bloqueadas por eles e ficamos isolados. Estávamos á mercê dos predadores que o destino nos impôs.

Agora só restava uma dúzia de pessoas sobreviventes. O sol se punha de novo e não nos entregaríamos facilmente! Já que íamos morrer, pelo menos morreríamos com dignidade. atacamos seu corações pois era o único lugar onde surtia realmente efeito. o problema era vencer a força que eles possuíam. Para mim o principal era esse Henry, mas nunca ele surgia durante as lutas. Novamente eles começaram a surgir!

A batalha foi fulminante para nós. Meu amigo, o doutor, já não estava do nosso lado. Sucumbimos completamente diante da força com que vinham, destruindo o velho galpão onde estávamos escondidos. Algo perfurou minha jugular vorazmente. Era minha vez de ir. Tudo inútil. O que pude fazer foi apenas dar um último suspiro e... Sorrir!

“HÁ,HÁ,HÁ. PODEM VIR SEUS TOLOS. JÁ CHEGA DE BRINCADEIRA.”-Agora era minha vez de me fazer ouvir.-“SEI QUE PODEM ME ENTENDER. ONDE ESTÁ HENRY?" Aquela que ousou me tocar agora gritava agonizando, percebendo que bebera sangue morto. Isso é veneno para um vampiro.

- Quem buscavam as respostas agora eram eles. Idiotas!Um a um fui os exterminando, arrancando seus corações fracos. Assim como fizeram uns aos outros. Não passavam de fantoches nas mãos de Henry mesmo. Era ele que eu caçava. era ele que eu queria, mas outra vez conseguiu me enganar. eu já imaginava!

Cheguei próximo ao doutor, que agora espumava sangue e saliva em meio a palavras sem sentido. Resolvi poupar-lhe a imortalidade e lhe dar consciência, como gratidão ás vezes que pensou me salvar. Mais distante um pouco estava a jovem que desencadeou a destruição de sua cidade. Ao sondar sua mente, vi que era imprestável também. Tinha sido apenas mais uma amante de Henry. Como castigo por sua imprudência, amarrei seu corpo ao poste na praça para que aguardasse o sol chegar e refletisse no sentido egoísta de seus desejos carnais, condenando todo seu povo a um fim tão deplorável.

Mais uma vez minha busca havia sido inútil. Mais uma vez meu disfarce havia sido descoberto. E eu continuo procurando Henry. Continuo buscando destruir quem começou minha triste história. E continuo relatando em meu diário essa maldição que me acompanha. Ah, o doutor ainda tem suas dúvidas sobre o que está acontecendo, sobre como tudo isso se iniciou. Mas eu só lhe contei que meu nome é Luke. E sobre o início disso tudo... Bem, isso já é uma outra história.