O VENTO

O vento fustigava o corpo de Lucimar, a saída intempestiva, não se atendo aos alertas de tempestade, cobrava seu preço, mas, encontrar Eustáquio aos beijos com sua amiga Marta foi demais para ela. Tantos anos de um relacionamento tranquilo, sem brigas, sem lume, confortável pra alma poderia assim se dizer. Talvez faltasse 'vida', 'chama' e sobrava rotina, então, segredos foram sendo escondidos, até aquela tarde fatídica.

Lucimar saíra deixando o carro para trás, a decepção e um sentimento de ódio que não conhecia, levaram seus pés numa corrida desabalada pela estrada, sem rumo com as lágrimas se misturando à tempestade, o corpo esguio duelava com a  ferocidade do vento frio, os cabelos castanhos alvoroçados colavam-se sobre o crânio, o peito estava rasgado de dor. Galhos e pequenos objetos se batiam sobre ela arrastados pelo vento e feriam seu corpo, mas, nada a fazia parar, era como se o mundo desabasse por dentro e sobre ela, os sinais do caos não foram suficientes para que Lucimar e Eustáquio percebessem que o fim do relacionamento já era um fato, estagnação, plantio sem cultivo e o devido cuidado, mataram o amor que existira entre eles. Se conversas tivessem acontecido, quem sabe as coisas se encaminhassem de forma diferente, traíção dói fundo...

Eustáquio e Marta se desesperam, pois independente da situação desvendada, se preocuparam com ela naquela tempestade, não era remorso pois eles estavam realmente apaixonados, mas, não desejaram este desfecho. A tempestade exigia recolhimento e proteção e principalmente sensatez, ir atrás dela era impensável, saber onde e como ela estava debaixo daquele tempo, era o único pensamento deles não havia clima para mais nada.

Lucimar molhada, ferida,  seguia agora sem rumo, com a visão da traíção à sua frente sem enxergar mais nada, às vezes gritava e a chuva torrencial entrava por sua garganta, sufocava, tropeçava, caía, se levantava e seguia trôpega. Num momento onde o vento se torna mais agressivo, uma cerca de arame farpado se choca contra seu corpo pequenino e a fere com gravidade, sangra no pescoço e na coxa e suas forças vão sendo minadas, Lucimar já não consegue enfrentar a violência do vento e ele a joga contra um carro que fora arrastado pela tempestade. As últimas palavras não proferidas por ela foram, MORRAM DESGRAÇADOS!! 

O dia seguinte trouxe calmaria no clima, a observação da devastação e para Eustáquio e Marta a triste constatação da morte trágica de Lucimar, se a culpa tem dor, ela foi dentro deles lancinante e devastadora, não havia lenitivo, placebo ou oração que libertasse suas almas, o fim da relação pária 'foi para o ralo' sem uma borbulha sequer, não conseguiram seguir com suas vidas, pareciam zumbis, opacos, com lascas de gelo no peito, feridas de dor que em pouco tempo finaram suas vidas. N'um espaço entre céu e inferno, u'malma descolorida e cansada, enfim ganhou luz e repousou.
Cristina Gaspar
Enviado por Cristina Gaspar em 14/02/2021
Código do texto: T7184176
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